
A Pol�cia Federal em Curitiba indiciou o ex-presidente Luiz In�cio Lula da Silva, o ex-ministro Ant�nio Palocci (Casa Civil e Fazenda), Paulo Okamotto (presidente da entidade) e Marcelo Odebrecht pelo pagamento de R$ 4 milh�es da empreiteira ao Instituto Lula entre dezembro de 2013 e mar�o de 2014. Ao empres�rio foi imputado o crime de corrup��o ativa, e aos demais, corrup��o passiva. Todos foram indiciados por lavagem de dinheiro no inqu�rito da Opera��o Lava Jato.
A PF se debru�ou sobre os pagamentos de empresas investigadas no �mbito da Opera��o Lava Jato para a empresa LILS Palestras, Eventos e Publica��es Ltda, respons�vel pelas palestras do ex-presidente. Os valores passam de R$ 9 milh�es. A investiga��o apontou que a Construtora Norberto Odebrecht transferiu, diretamente, aproximadamente 10,15% dos recursos da empresa.
O indiciamento � ato privativo do delegado de pol�cia. Ele ocorre quando a autoridade policial v� ind�cios do envolvimento do investigado em il�citos. Agora, o inqu�rito da PF segue para o Minist�rio P�blico Federal que pode ou n�o oferecer den�ncia criminal contra Lula, Palocci, Okamotto e Odebrecht.
A Procuradoria pode, ainda, devolver os autos � PF para novas dilig�ncias. Se houver den�ncia, caber� � Justi�a Federal decidir se abre ou n�o uma nova a��o penal contra o ex-presidente e os outros citados.
O relat�rio conclusivo da PF tem 130 p�ginas e � subscrito pelo delegado Dante Pegoraro Lemos, da Superintend�ncia Regional da PF em Curitiba. Ele aponta para a exist�ncia de uma "conta corrente informal de propinas".
"As meras doa��es pelo grupo Odebrecht ao Instituto Lula, consideradas isoladamente, seriam penalmente irrelevantes, tal como j� possa ter ocorrido no passado com outros ex-presidentes", anotou o delegado. "Nessa premissa, tamb�m seria irrelevante, em princ�pio, a destina��o de recursos do instituto na contrata��o de empresas de familiares e amigos do ex-presidente."
"Ocorre que as evid�ncias mostraram que os recursos transferidos pela Odebrecht sob a rubrica de 'doa��es' foram abatidos de uma esp�cie de conta corrente informal de propinas mantida junto � construtora, da mesma forma ocorrida com aqueles destinados � aquisi��o do im�vel para o Instituto Lula", segue o relat�rio.
Na avalia��o do delegado, "surgem, ent�o, robustos ind�cios da origem il�cita dos recursos e, via de consequ�ncia, da pr�tica dos crimes de corrup��o ativa e passiva, considerando o pagamento de vantagem indevida a agente p�blico em raz�o do cargo por ele anteriormente ocupado".
Para a PF, "nesse passo, houve direcionamento das verbas a terceiro, no caso, o Instituto Lula, constituindo elemento do tipo previsto no artigo 317 do C�digo Penal (solicitar ou receber, para si ou para outrem, direta ou indiretamente, ainda que fora da fun��o ou antes de assumi-la, mas em raz�o dela, vantagem indevida)".
Amigo
Em um cap�tulo do relat�rio, a PF destaca a origem dos recursos para o Instituto Lula e as revela��es do ex-executivo da Odebrecht Alexandrino de Salles Ramos de Alencar, um dos 77 delatores da empreiteira na Opera��o Lava Jato.
"Disse que teve conhecimento da contabilidade paralela do grupo para pagamentos ao PT e ao ex-Presidente, controlada por Marcelo Odebrecht e negociada diretamente com Antonio Palocci."
Segundo Alexandrino, o ex-presidente da empreiteira lhe teria dito que todas as doa��es ao Instituto Lula seriam "baixadas" dessa "conta corrente" que ele teria com Palocci. Ele n�o soube explicar a origem dos recursos que abasteciam a "conta" paralela do grupo. "Era uma conta em nome de Marcelo Odebrecht."
A rubrica "amigo" seria referente a Lula, disse.
Segundo Alexandrino, foram baixados R$ 12 milh�es dessa conta que ele entende que foram destinados � compra do im�vel para a constru��o do Instituto Lula, em S�o Paulo.
Alexandrino afirmou que tamb�m foram "baixados" dessa conta "amigo" R$ 4 milh�es destinados �s doa��es ao Instituto Lula.
O relat�rio da PF diz que Marcelo Odebrecht, em sua dela��o, "confirmou que as doa��es de R$ 4 milh�es ao Instituto Lula foram abatidas da conta 'amigo', bem como a ci�ncia de Lula acerca de provisionamentos para o instituto, a exemplo dos valores destinados � aquisi��o do terreno para a sede do Instituto".
Ainda de acordo com a PF, Alexandrino declarou, em sua dela��o na Procuradoria-Geral da Rep�blica, homologada pelo Supremo Tribunal Federal, que "o Instituto Lula foi 'trabalhado' pela Odebrecht para as quest�es da Am�rica Latina e �frica, regi�es de interesses espec�ficos e claros de atua��o do grupo".
"O grupo fez alguns aportes financeiros ao Instituto Lula, por solicita��o e tamb�m por 'pol�tica'. Isso foi feito tamb�m para outros ex-presidentes em outras �pocas. No caso, feito por reconhecimento e agradecimento pelo que o ex-presidente fez pelo grupo e tamb�m por perspectivas futuras, dentre as quais a possibilidade de Lula voltar a ser presidente do pa�s."
"As doa��es eram anuais e ocorreram durante uns tr�s anos", seguiu o executivo. "Eram operacionalizadas por notas fiscais normais de doa��o, sendo a negocia��o dos valores feita com Paulo Okamotto." N�o haveria demanda espec�fica.
Sobre as doa��es, Alexandrino afirmou que a de 2014 (R$ 3 milh�es) "foi um pouco maior porque era um ano eleitoral, em raz�o do cen�rio eleitoral, e n�o sabiam quando poderiam doar de novo, para n�o ter nenhuma surpresa para o Instituto durante o ano de 2014".
O relat�rio da PF aponta. "Instado a explicar a doa��o maior, considerando que o Instituto Lula � uma organiza��o civil, respondeu que o �, mas 'dentro de um cen�rio pol�tico' n�o daria para 'separar uma coisa de outra'. Se tivessem que dar uma outra doa��o, ocorreria apenas em 2016. N�o soube dizer o que isso mudaria no cen�rio eleitoral, dizendo apenas que a doa��o de 2014, mais expressiva, foi por solicita��o de Paulo Okamotto."
Caso triplex
O delegado Dante Pegoraro, que atua na Delegacia Regional de Combate ao Crime Organizado, cita a senten�a condenat�ria da a��o penal do caso "triplex" - im�vel no Guaruj�, litoral paulista piv� da primeira condena��o de Lula na Lava Jato - o ex-presidente cumpriu pena de abril de 2018 a novembro de 2019, at� ser solto depois que o Supremo decidiu que a execu��o da pena s� pode ocorrer ap�s o tr�nsito em julgado.
Nesta senten�a do triplex, ponderou o delegado, "foram estabelecidos requisitos para aferir a conduta t�pica dos r�us".
"N�o seria necess�rio indicar se o ex-presidente Luiz In�cio Lula da Silva foi ou n�o o art�fice principal do esquema criminoso que vitimou a Petrobr�s: basta verificar se existe prova de sua participa��o nos crimes de corrup��o e lavagem narrados na den�ncia, relativos ao contratos da Petrobr�s com cons�rcios integrados pela empreiteira (naquele caso, a OAS), o que ficou demonstrado na senten�a."
"O d�bito da vantagem auferida ocorreu a partir da conta geral de propinas (naquele caso, da OAS), � margem da contabilidade oficial, alimentada por acertos de corrup��o em diversos contratos do governo federal, dentre os quais aqueles havidos em contratos com a Petrobr�s."
"Enriquecimento sem causa pessoal do ex-presidente Lula. Por�m, o argumento n�o � taxativo, pois o enriquecimento pode ser de terceiros aos quais sejam destinadas as vantagens, familiares inclusive."
"A sofistica��o n�o constitui elemento necess�rio � caracteriza��o do crime de lavagem de dinheiro, o qual pode ocorrer inclusive, por exemplo, por doa��o eleitoral oficial, por�m com oculta��o da origem esp�ria, utilizando-se o ve�culo oficial justamente para conferir apar�ncia l�cita � opera��o financeira de transfer�ncia de recursos", assinala Dante Pegoraro.
Na avalia��o da PF, "as evid�ncias mostraram que os recursos transferidos pela Odebrecht sob a rubrica de "doa��es" foram abatidos de uma esp�cie de conta corrente informal de propinas mantida junto � construtora, da mesma forma ocorrida com aqueles destinados � aquisi��o do im�vel para o Instituto Lula".
Atos posteriores
A PF decidiu, tamb�m, apurar atos posteriores de destina��o dos recursos pelo Instituto Lula, "se houve beneficiamento pessoal ou de pessoas pr�ximas".
"Independentemente da aus�ncia de comprova��o cabal no sentido de que as empresas G4 e Flexbr efetivamente prestaram servi�os ao Instituto Lula compat�veis com as remunera��es direta e indiretamente recebidas, n�o se pode olvidar o fato de que a simples contrata��o de empresas de familiares para a presta��o de servi�os pressup�e uma exclusividade, um privil�gio com potencial de gera��o de lucros, o que � o objetivo natural da entidade empresarial, cujo conceito � a 'atividade economicamente organizada, voltada ao lucro'."
Direcionamento
Segundo o relat�rio subscrito pelo delegado Dante Pegoraro, "ainda que se considerem regularmente prestados os servi�os contratados, e por pre�os justos, h� de se reconhecer que houve um direcionamento de vantagem financeira a terceiros do c�rculo familiar do ex-presidente".
"Por�m, n�o � poss�vel afirmar nem negar que os recursos espec�ficos repassados a empresas de familiares tenham origem direta nas 'doa��es' da Odebrecht, tendo em vista que recursos de outras fontes tamb�m ingressam no patrim�nio do Instituto Lula ao longo do tempo."
"Diante do exposto, j� descritas anteriormente as condutas de cada um nos fatos investigados relativos aos repasses do total de R$ 4 milh�es da Odebrecht ao Instituto Lula, entre dezembro de 2013 e mar�o de 2014, tendo como origem os cr�ditos da conta de propinas materializada na 'planilha italiano', gerenciada por Marcelo Odebrecht, indicio as pessoas de Luiz In�cio Lula da Silva, Paulo Tarciso Okamotto e Antonio Palocci Filho pela pr�tica do delito de corrup��o passiva previsto no artigo 317 do C�digo Penal, bem como Marcelo Bahia Odebrecht pela pr�tica do delito de corrup��o ativa previsto no artigo 333 do C�digo Penal."
O delegado decidiu, ainda, indiciar Lula, Okamotto, Palocci e Odebrecht por lavagem de dinheiro, crime previsto no artigo 1.º da Lei no 9.613/98.
A PF aponta "dissimula��o da origem e natureza dos citados valores repassados pela Odebrecht ao Instituto Lula, cujos atos foram falsamente formalizados e informados como se se tratasse de 'doa��o'".
No cap�tulo derradeiro do relat�rio "Considera��es finais", a PF ressalta que sobre as doa��es ao Instituto Lula e pagamentos de palestras pelo grupo Queiroz Galv�o "n�o houve aprofundamento das apura��es, tendo em vista que se adotou, como linha de investiga��o, aguardar por poss�vel de acordo de colabora��o premiada que se tinha not�cia em andamento no Minist�rio P�blico Federal, mas at� este momento sem not�cias de acerto".
"A essas alturas das investiga��es, portanto, considerando a natureza dos servi�os prestados a t�tulo de palestras, os quais se presumem ocorridos, representando assim a pr�pria contrapresta��o aos pagamentos, n�o verificamos a pr�tica de crime, ressalvadas apura��es espec�ficas que venham eventualmente a demonstrar a ocorr�ncia", destaca o documento da PF.
Doa��es das outras
O delegado tamb�m n�o considerou, em princ�pio, haver elementos suficientes para caracterizar a origem il�cita dos recursos utilizados especificamente para as doa��es ao Instituto Lula feitas pela Camargo Correa, OAS e Andrade Gutierrez, "ou seja, se decorrentes de contrapartidas a benef�cios conferidos a elas no cartel da Petrobr�s, em que pese as suspeitas nesse sentido se levarmos em conta o amplo contexto das investiga��es da Opera��o Lava Jato".
"Fica ressalvado, por �bvio, que apura��es espec�ficas, eventualmente existentes ou futuras (fatos novos), possam a vir demonstrar a configura��o de crime", argumenta. "O mesmo conclu�mos quanto a outros grupos investigados no �mbito da conex�o com a opera��o Lava Jato perante a 13.ª Vara Federal em Curitiba, quais sejam a UTC Engenharia, (somente uma palestra), Cons�rcio QUIP S/A (somente uma palestra) e BTG PACTUAL (tr�s palestras e uma doa��o de R$ 1 milh�o ao Instituto Lula). Diante do exposto, entendo por bem encerrar as investiga��es no �mbito deste inqu�rito policial."
Defesas
Em nota, o advogado Cristiano Zanin Martins, que defende o ex-presidente Lula, afirmou: "O indiciamento � parte do Lawfare promovido pela Lava Jato de Curitiba contra o ex-presidente Lula, e n�o faz nenhum sentido: as doa��es ao Instituto Lula foram formais, de origem identificada e sem qualquer contrapartida. � �poca das doa��es Lula sequer era agente p�blico e o benefici�rio foi o Instituto Lula, institui��o que tem por objetivo a preserva��o de objetos que integram o patrim�nio cultural brasileiro e que n�o se confunde com a pessoa f�sica do ex-presidente."
O criminalista Tracy Joseph Reinaldet dos Santos, que defende o ex-ministro Ant�nio Palocci, falou. "Ant�nio Palocci colaborou de modo efetivo com a Pol�cia Federal e com o Minist�rio P�blico Federal para o esclarecimento dos fatos investigados."
"A Odebrecht, comprometida com uma atua��o �tica, �ntegra e transparente, tem colaborado com as autoridades de forma permanente e eficaz, em busca do pleno esclarecimento de fatos do passado", afirma a empresa em nota.
A reportagem entrou em contato com as assessorias do Instituto Lula e de Marcelo Odebrecht e aguarda posicionamento.