Multa por fake news chega a R$ 10 mil

O dinamarqu�s Salah Sulaiman, de 46 anos, disse em seu canal no YouTube que a pol�cia de Kuala Lumpur, capital da Mal�sia, demorou cerca de uma hora para atender uma ocorr�ncia que ele havia denunciado. Os oficiais provaram que o atendimento demorou s� oito minutos. Com isso, ele se tornou o primeiro preso no �mbito da lei contra fake news que come�ava a valer no pa�s asi�tico.

Isso aconteceu em 2018 e, dois anos depois, as tentativas de punir a produ��o e dissemina��o de informa��es falsas se intensificaram, sobretudo em meio � pandemia do novo coronav�rus. De um lado, o discurso de proteger a sa�de do cidad�o com a tentativa de coibir a desinforma��o; do outro, os riscos � liberdade de express�o e de imprensa.

No Brasil, Estados t�m se inclinado � primeira op��o - um risco, para entidades de direitos humanos e de imprensa. Na Para�ba, no Cear� e, mais recentemente, no Acre, leis sancionadas recentemente permitem que sejam aplicadas multas a quem divulgar informa��es falsas sobre epidemias e pandemias. Na Para�ba, o valor � de at� R$ 10,2 mil; no Acre, R$ 7,4 mil e, no Cear�, R$ 2,2 mil.

As leis aprovadas, por�m, t�m informa��es gerais sobre quem pode ser punido. Para a presidente da Comiss�o de Estudos Constitucionais da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) no Cear�, Arsenia Breckenfeld, que analisou a regra aprovada em seu Estado, a lei � d�bia por citar "meios eletr�nicos ou similares", o que n�o representa clareza.

A descri��o � semelhante nas tr�s leis aprovadas, o que pode abrir brechas para o cerceamento da liberdade de imprensa, avalia Marcelo Tr�sel, presidente da Associa��o Brasileira de Jornalismo Investigativo (Abraji). "A imprensa � quem mais produz informa��o sobre a pandemia. E muitas autoridades s�o negacionistas. Se alguma delas receber o v�deo de um epidemiologista defendendo a quarentena, vai considerar 'fake news'?", questiona. "Como as leis s�o vagas, fica a crit�rio das autoridades decidir o que se enquadra e o que n�o se enquadra", afirma.

O jornal O Estado de S. Paulo levantou medidas como essas em discuss�o j� em pelo menos mais cinco assembleias legislativas do Pa�s. Em S�o Paulo, o deputado estadual Thiago Auricchio (PL) prop�e multa de at� R$ 5,5 mil a quem divulgar fake news sobre o coronav�rus. "A desinforma��o � perigosa em qualquer momento, mas, no quadro atual se torna mais grave pois pode custar vidas", diz o parlamentar. Projetos similares tramitam nas assembleias do Piau�, Amazonas, Esp�rito Santo e Bahia.

Imprensa. O governador do Par�, Helder Barbalho (MDB) revogou horas depois de sancionar na sexta-feira passada, uma lei aprovada pelos deputados que permitiria ao Estado multar quem divulgasse informa��es e opini�es "sem comprova��o de veracidade" com o objetivo de provocar desinforma��o ou para "manchar a honra pessoal de autoridades".

A regra valeria inclusive para a imprensa. "O texto aprovado implica em v�cio forma e material de inconstitucionalidade", explicou o governador ap�s o veto. Ele promete enviar um projeto com nova reda��o para a assembleia.

O movimento acontece ap�s uma sequ�ncia de casos de fake news envolvendo a a��o dos Estados frente � crise de coronav�rus. No Cear�, antes da aprova��o da multa, a administra��o de Camilo Santana (PT) tamb�m foi v�tima de um boato que utilizava �udio falso para sugerir que ele estaria usando a pandemia para desestabilizar o governo do presidente Jair Bolsonaro.

O �udio era atribu�do a um suposto assessor do governo chamado Ricardo Certi, mas ele n�o consta da lista de servidores estaduais. De acordo com a Secretaria de Estado da Casa Civil do Cear�, o caso foi informado �s autoridades.

Na Bahia, o governo do Estado apresentou, na ter�a-feira passada, projeto sugerindo multa que pode chegar a R$ 18,8 mil a quem divulgar informa��es falsas sobre pandemias.

O projeto do governador Rui Costa (PT) ressalva que textos produzidos por jornalistas e textos opinativos n�o constituem il�cito. "Desconhe�o a pol�mica criada de que nosso projeto para combater as fake news iria cercear a liberdade de express�o. Jamais existiu essa inten��o. Mais do que nunca, o momento � da sociedade de unir para combater essa mil�cia digital que tanto mal tem feito ao nosso Pa�s", diz Costa.

Risco

Para Cristina Tard�guila, diretora adjunta da International Fact-Checking Network, entidade ligada ao Instituto Poynter que re�ne mais de 80 organiza��es de checagem de informa��es, � um risco que o Estado fa�a regulamenta��o de um conceito que ainda n�o tem uma defini��o clara. Ela relata que experi�ncias de regulamenta��o em pa�ses como Tail�ndia, �ndia e Cingapura abriram brechas para viola��o de direitos humanos.

Para Cristina, os projetos e multas contra fake news podem levar a regulamenta��es com consequ�ncias graves, como o caso de Sulaiman, citado no in�cio da reportagem.

"J� estivemos em pa�ses onde legisla��es foram aprovadas e que passaram a vivenciar situa��es de autocensura e de censura. � enorme a possibilidade de a Am�rica Latina replicar as falhas no combate � desinforma��o que aconteceram na �sia", afirma.

"� uma pena que essa discuss�o, que merece um enorme debate democr�tico, esteja acontecendo num momento em que a conversa n�o est� fluindo normalmente (por causa da pandemia). Qualquer tentativa de legislar sobre isso, neste momento, � oportunismo", afirma Tard�guila"

Projetos

Na C�mara dos Deputados, ao menos seis projetos sobre puni��o a fake news foram apresentados desde 18 de mar�o. Em cinco deles, deputados pedem a tipifica��o da dissemina��o de fake news relacionadas a pandemias ou a riscos � seguran�a sanit�ria do Pa�s como crime no C�digo Penal. Dois projetos pedem a criminaliza��o apenas para a dissemina��o de informa��es falsas por parte de ocupantes de cargos p�blicos. As informa��es s�o do jornal O Estado de S. Paulo.