Os pedidos para a Procuradoria-Geral da Rep�blica (PGR) investigar presidentes bateram recorde na gest�o de Jair Bolsonaro. Foram 93 representa��es registradas desde a posse, em 2019, segundo dados obtidos pelo Estad�o por meio da Lei de Acesso � Informa��o (LAI). O n�mero supera a soma do que foi apresentado contra a petista Dilma Rousseff (36) na reta final de seu governo e toda a gest�o do emedebista Michel Temer (53). Em comum est� o fato de a maior parte das apura��es ter parado no arquivo antes de se tornar um inqu�rito.
Embora apenas tr�s representa��es contra Bolsonaro n�o estejam em sigilo, � poss�vel associar a alta com a escalada da pandemia de covid-19 no Pa�s, quando a gest�o do governo federal no enfrentamento da doen�a passou a ser contestada. De cada tr�s pedidos de investiga��o, dois foram apresentados a partir de mar�o do ano passado. O n�mero de pedidos de impeachment do presidente tamb�m cresceu no per�odo - at� agora, s�o 74 no total.
Parlamentares de partidos de oposi��o, como PSOL e PT, assinam algumas destas representa��es em que cobram a atua��o do procurador-geral da Rep�blica, Augusto Aras, respons�vel por investigar o presidente da Rep�blica. Nelas, acusam o chefe do Executivo de infra��es a medidas sanit�rias por n�o usar m�scara, crime de responsabilidade e at� genoc�dio. Essas den�ncias s�o autuadas pelo Minist�rio P�blico Federal como not�cia de fato, nomenclatura usada para registrar qualquer demanda apresentada contra autoridades.
As apura��es preliminares instauradas por Aras s�o uma esp�cie de "pr�-inqu�rito", que, mais � frente, pode levar � abertura de uma investiga��o propriamente dita - ou ser arquivada. E foi justamente o arquivo o destino de 82% das representa��es contra Bolsonaro at� aqui, o que tem motivado cr�ticas ao atual chefe do Minist�rio P�blico Federal.
"H� uma grande leni�ncia do Aras em rela��o � conduta de Bolsonaro na pandemia e nos ataques � democracia", afirmou ao Estad�o o ex-procurador-geral da Rep�blica Cl�udio Fonteles, que chefiou o �rg�o de 2003 a 2005, no in�cio do governo de Luiz In�cio Lula da Silva. Ele mesmo assina um dos pedidos de investiga��o em que acusa o presidente de cometer crimes sanit�rios previstos no C�digo Penal.
"Ao Parlamento cabe a an�lise do crime de responsabilidade, que pode resultar em impeachment. Agora, isso n�o desobriga o procurador-geral da Rep�blica a atuar tamb�m. � ele quem tem a atribui��o de analisar eventos delituosos daqueles que gozam de foro por prerrogativa de fun��o, como � o caso do presidente", disse Fonteles.
Aras afirmou que todas as demandas que chegam ao �rg�o s�o analisadas, mas nem sempre s�o fundamentadas. "As representa��es chegam a 300 por m�s, contra autoridades, n�o apenas contra o presidente. A mera autua��o n�o significa que haja ali ind�cio de crime", disse o procurador-geral, por meio de sua assessoria, ressaltando que qualquer cidad�o pode apresentar um pedido de investiga��o contra o presidente.
Considerado um aliado por integrantes do governo Bolsonaro, principalmente por ter sido indicado ao cargo sem aval interno da categoria, Aras tem sofrido press�es internas e externas para investigar mais a fundo a responsabilidade de autoridades do governo federal durante a pandemia, que j� matou mais de 280 mil pessoas no Brasil. Em documento enviado ao Supremo Tribunal Federal no m�s passado, o procurador-geral afirmou que tem sido "zeloso" e enumerou uma s�rie de apura��es em curso.
At� agora, por�m, o �nico inqu�rito aberto no Supremo sobre o tema apura se houve omiss�o do ent�o ministro da Sa�de, Eduardo Pazuello, na crise que levou ao colapso do sistema de sa�de de Manaus (AM) no in�cio do ano, quando pacientes morreram sufocados por falta de oxig�nio. O presidente n�o � alvo desta investiga��o. Com a demiss�o de Pazuello do cargo, o caso deve ser transferido para a primeira inst�ncia.
As representa��es contra Bolsonaro n�o se limitam � pandemia. Em julho de 2019, o senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP) pediu para a ent�o procuradora-geral, Raquel Dodge, investigar irregularidades no uso de avi�o da For�a A�rea Brasileira (FAB) para levar familiares do presidente ao casamento do filho de Bolsonaro, deputado Eduardo Bolsonaro (PSL-RJ), no Rio. O caso segue em an�lise pela equipe de Aras.
A t�tulo de compara��o, nas duas gest�es de Rodrigo Janot, que ocupou o posto nos governos Dilma e Temer, foram analisadas 77 not�cias de fato relacionadas a presidentes. Todas foram arquivadas. Com Raquel, foram mais 28, e apenas uma ainda em an�lise, sobre o uso da aeronave da FAB.
Mesmo tendo arquivado todas as representa��es que chegaram � PGR, Janot n�o deixou de investigar Temer. Com base na dela��o do empres�rio Joesley Batista, da JBS, ele denunciou o ent�o presidente por corrup��o e obstru��o da Justi�a. O emedebista foi absolvido em um dos casos no ano passado. Raquel tamb�m apresentou uma den�ncia contra o antecessor de Bolsonaro, relacionada a desvios no Porto de Santos.
J� Aras determinou a abertura de inqu�rito para apurar se o presidente interferiu indevidamente na Pol�cia Federal. A investiga��o teve como origem acusa��o feita pelo ex-ministro da Justi�a S�rgio Moro.
'Judicializa��o da pol�tica'
O procurador-geral da Rep�blica, Augusto Aras, atribuiu o aumento no n�mero de representa��es recebidas pela PGR contra o presidente Jair Bolsonaro ao que chama de "judicializa��o da pol�tica". "Grupos e partidos formulam representa��es contra fatos dos quais discordam, alguns eventualmente delituosos, outros, n�o. Cabe ao Minist�rio P�blico analisar cada caso tecnicamente para evitar ser transformado em um instrumento de disputa pol�tica. Isso sempre foi assim, como indicam os n�meros de meus antecessores", disse Aras, por meio de assessoria.
Ele afirmou ainda que nem sempre as representa��es s�o fundamentadas, o que explica o alto �ndice de arquivamentos. "Um mesmo fato � objeto de v�rias representa��es, de parlamentares e cidad�os que t�m o direito de peticionar, sem obriga��o de saber, tecnicamente, se o seu relato descreve um delito ou n�o. Na maioria das vezes, n�o, como demonstram os n�meros de diferentes gest�es na PGR", completou o procurador-geral. Procurado, o Pal�cio do Planalto n�o se manifestou. As informa��es s�o do jornal O Estado de S. Paulo.
POL�TICA