O professor universit�rio Hilton Pereira da Silva, de Bras�lia, se sente orgulhoso e at� um pouco aliviado ao olhar para a filha Maria Luiza, de 13 anos, e perceber nela um interesse por pol�tica que ele pr�prio n�o p�de desenvolver nessa idade. "Minha inf�ncia foi vivida na ditadura. A discuss�o sobre pol�tica era muito restrita at� para os adultos." Hilton desejou que a menina tivesse uma forma��o diferente nesse aspecto e, junto com a esposa, decidiu que nenhum assunto seria tabu na cria��o dela.
O resultado veio naturalmente. H� dois anos, Malu avisou que queria ter uma conta no Instagram e que fosse algo construtivo. Com a supervis�o dos pais, ela criou a p�gina "Estude como uma menina", na qual compartilha seus estudos e pensamentos sobre temas como igualdade de g�nero. Recentemente, Malu passou a publicar trechos de conversas que teve com personalidades femininas, procuradas por e-mail ou pelo pr�prio Instagram.
A empres�ria Luiza Trajano, a deputada Tabata Amaral (PDT-SP) e a ministra-chefe da Secretaria de Governo, Fl�via Arruda, est�o entre as entrevistadas de Malu. "A pol�tica est� em tudo que fazemos. Em casa, na escola, mas tamb�m na �gua que a gente toma e no nosso alimento. Gosto de debater de forma civilizada e ouvir opini�es divergentes", diz a menina.
Malu integra uma gera��o que dificilmente vai ouvir que "pol�tica n�o � coisa de crian�a", como muitos mais velhos que ela escutaram de seus pais. Para al�m do incentivo em casa, ela e seus colegas est�o expostos a um incont�vel n�mero de tu�tes, "text�es", contas no TikTok, no Facebook e outras redes falando de temas como a��es de governo, projetos de lei e investiga��es constantemente. Se os est�mulos vindos de todo lado n�o podem ser ignorados, a preocupa��o de pais, escolas e institui��es � que eles sejam absorvidos de forma positiva.
"N�o h� desinteresse pela pol�tica hoje em dia. Ao contr�rio, h� mais interesse e engajamento do que nunca", diz Marco Konopacki, doutor em Ci�ncia Pol�tica pela UFMG. "A luta pol�tica est� mais atraente. A cria��o de memes, um hit no Twitter ou no TikTok se tornaram tamb�m atraentes para fortalecer essa luta pol�tica. O desafio est� em organizar esse potencial pol�tico para produzir consequ�ncias", afirma o professor.
"�s vezes ele me pergunta coisas que eu n�o sei nem explicar", conta a farmac�utica Cibele Ferraz, de S�o Paulo, m�e do Andr�, de 12. N�o � de se admirar. Andr� � curioso e exercita o desenvolvimento de seu senso cr�tico fazendo perguntas. Em 2018, tinha 10 anos e n�o entendia por que parte da fam�lia defendia o candidato Jair Bolsonaro (ent�o no PSL) e outra parte defendia o candidato Fernando Haddad (PT). Se os dois lados diziam defender o melhor para o Pa�s, eles n�o tinham que concordar? Foi ent�o que ele come�ou a ler sobre pol�tica e a ouvir com mais aten��o as pol�micas na fam�lia e nos jornais. "Gosto de ler sobre elei��es passadas e agora no tempo livre ando vendo coisas sobre a CPI da Covid. Acho importante acompanhar", diz o menino.
Na pr�tica. Iniciativas como o projeto Plenarinho, da C�mara dos Deputados, e as C�maras Mirins, espalhadas pelo Pa�s, t�m cooperado na miss�o de educar crian�as e jovens para a pol�tica. Criado em 2004, o Plenarinho tem como p�blico-alvo estudantes do ensino fundamental e, na internet, leva aos leitores conte�do sobre a pol�tica nacional em v�deos, �udios, desenhos animados e jogos, por exemplo. No ano passado, o site registrou mais de um milh�o de acessos.
Em Jaragu� do Sul (SC), a C�mara Municipal tem sua vers�o mirim h� dez anos. O projeto simula o Legislativo municipal do n�mero de parlamentares (11) a procedimentos para apresentar projetos de lei.
A atual presidente da C�mara Mirim da cidade, Maria Carollini Maes, 13, conta que a experi�ncia a ajudou a perceber a import�ncia do di�logo. Ela costuma receber de colegas da escola sugest�es de debates e projetos. "Ideias para melhorar o Pa�s podem come�ar em conversas, no di�logo. � muito importante", explica a menina.
A C�mara dos Deputados recebe, por ano, cerca de mil projetos de lei criados em parlamentos mirins de todo o Pa�s. Alguns j� foram apadrinhados por deputados e tramitam na C�mara.
"� preciso mostrar a pol�tica como fun��o primordial para harmonia da vida em sociedade, para que ideias possam ser implantadas de fato e enfatizar com os jovens que o encontro entre diferentes e o pr�prio conflito fazem parte desse processo", diz Ana Marusia Pinheiro Lima, diretora da Coordena��o de Intera��o com a Popula��o e Programas Institucionais da C�mara dos Deputados.
Not�cias. Palavr�es do "politiqu�s" como "suspei��o", "coliga��es" e "emenda parlamentar" ganham explica��o did�tica nas reportagens do jornal Joca. A publica��o quinzenal leva as principais not�cias do Brasil e do mundo para leitores de 3 a 16 anos em diversas escolas do Pa�s.
"A ideia de que pol�tica n�o � coisa de crian�a � totalmente incomum hoje", afirma M�nica Gouv�a, diretora educacional da publica��o. "A gente l� not�cias para se informar e poder interagir sobre os assuntos. As crian�as podem e devem participar de situa��es como esta desde pequenas, tendo a responsabilidade de debater sobre o que pode ser mudado."
Na semana passada, a equipe do Joca entregou � Prefeitura de S�o Paulo um documento com sugest�es de crian�as e adolescentes de escolas p�blicas e privadas colhidas durante o per�odo eleitoral de 2020 para diferentes �reas da gest�o municipal. Foram 99 sugest�es, entre elas mais investimento em atendimento b�sico de sa�de nas periferias, mais acessibilidade nas vias p�blicas e desapropria��o de im�veis inadimplentes.
Um dos maiores destaques das demandas das crian�as foi o pedido por mais investimento em ferramentas para universalizar o acesso � internet, facilitando as aulas online e o contato com as not�cias (al�m de jogos e outros meios de entretenimento, claro). Relat�rio recente da Abrinq (Associa��o Brasileira de Fabricantes de Brinquedos) mostra que 36% das crian�as de fam�lias com rendimento per capita de at� 1/4 de sal�rio m�nimo n�o t�m acesso � internet.
"A juventude j� est� criando uma massa cr�tica para essa busca coletiva de sa�das para v�rios temas", diz Marco Konopacki. "Para que esse sentimento n�o esfrie, n�o podemos deixar que pr�ticas pol�ticas restritivas e sect�rias joguem �gua fria nessa nova sociedade pol�tica que est� sendo gestada."
As informa��es s�o do jornal O Estado de S. Paulo.
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