Aten��o: mat�ria exclusiva publicada no Portal do Estad�o em 16/5/2021
H� 20 anos, Haroldo Cathedral chegou a Roraima e prosperou com neg�cios nos ramos da educa��o, da constru��o e da cerveja. Cultivou um prest�gio que fez os roraimenses darem a ele em 2018 a maior vota��o para deputado federal na primeira vez em que concorreu � C�mara, pelo PSD. Apesar do compromisso de trabalhar integralmente para seus eleitores, Cathedral usou sua cota no or�amento secreto para propor benfeitorias em Minas Gerais.
Mineiro de Itabira, ele � o autor de uma indica��o de R$ 1 milh�o para pavimenta��o de estrada vicinal em Camanducaia (MG), cidade a 3.250 quil�metros de Boa Vista, capital do Estado que o elegeu. O deputado alega que a proposta se deu por meio de "permuta" com parlamentares mineiros. Mas n�o pode dizer o que deu em troca.
"Como eu sou de Minas Gerais, embora eleito por Roraima, fiz uma permuta com outros colegas deputados. Quando � emenda extraor�ament�ria, n�o vejo problema nenhum, n�o. As emendas individuais e de bancada v�o todas para Roraima", disse ele ao Estad�o.
Al�m de Cathedral, outros 15 deputados e senadores aliados do presidente Jair Bolsonaro fizeram indica��es para Estados diferentes daqueles pelos quais foram eleitos, com o dinheiro do Minist�rio do Desenvolvimento Regional que o governo usou para agradar a aliados. Ao todo, indicaram o destino de R$ 181 milh�es para regi�es aleat�rias, onde n�o est�o suas bases.
Tudo feito abaixo do radar dos eleitores e dos �rg�os de fiscaliza��o. Como as indica��es foram acertadas diretamente com o Planalto e ocorreram por meio da "RP9", s� foi poss�vel identificar os autores por documento do governo que n�o � p�blico, mas foi obtido pelo Estad�o. Do contr�rio, n�o se saberia que 285 deputados e senadores ganharam o direito de controlar R$ 3 bilh�es do minist�rio no momento em que o governo tentava emplacar aliados no comando do Congresso.
A indica��o de verbas extras para Estados diferentes � vista com preocupa��o por especialistas em execu��o or�ament�ria. A suspeita � de que, como elas n�o t�m a mesma transpar�ncia que as emendas tradicionais, sejam usadas como "emendas bumerangue". Ou seja, haveria ganho financeiro futuro ao pol�tico ap�s o munic�pio ou estatal contemplado assinar contrato para obra ou compra a partir da indica��o dele. Na maioria desses empenhos, ainda n�o houve pagamentos.
Os parlamentares que admitiram ajudar regi�es aleat�rias negaram irregularidades, mas apresentaram contradi��es ao explicar os motivos. Al�m disso, as justificativas acabaram por refor�ar um problema central do or�amento secreto: o crit�rio t�cnico para defini��o das cidades que realmente precisam de investimentos � vilipendiado em favor de interesses pol�ticos de aliados de Bolsonaro.
Na planilha secreta do governo, o l�der do Podemos na C�mara, L�o Moraes, de Rond�nia, consta como o autor da indica��o de R$ 5 milh�es para obras em Capinzal do Norte e Bacuri. Os munic�pios ficam no Maranh�o, a uma dist�ncia de mais de 2.000 quil�metros de Porto Velho. "Foi indica��o de algum parlamentar da minha bancada para o Maranh�o. N�o passa pela minha escolha de l�der, n�o tem meu nome em of�cio encaminhado para o minist�rio ou para qualquer prefeitura do Estado", afirmou.
L�o Moraes revelou tamb�m que, como l�der, tinha "caminho aberto" no governo para definir as destina��es com os recursos extras liberados em dezembro de 2020. Foi nesse per�odo que o Executivo passou a distribuir cotas para deputados e senadores inclinados a votar nos candidatos do Planalto para as presid�ncias da C�mara e do Senado.
S� em janeiro, �s v�speras do pleito, o Podemos na C�mara declarou apoio a Arthur Lira (Progressistas-AL). Ao todo, parlamentares do partido indicaram R$ 71 milh�es do or�amento secreto de R$ 3 bilh�es.
De acordo com o planilh�o, Lira, como l�der do Progressistas, enviou cerca de R$ 10 milh�es para o Paran�, S�o Paulo, Mato Grosso do Sul e Mato Grosso. Procurado, ele n�o comentou.
Uma dupla de deputados do Norte tamb�m apresentou vers�es conflitantes sobre o motivo da destina��o de dinheiro ao Nordeste. Ottaci Nascimento (AM) e Bosco Saraiva (RR), do Solidariedade, aparecem no planilh�o do or�amento secreto como autores de indica��o para o munic�pio de Padre Bernardo, em Goi�s.
Eles confirmaram estar por tr�s de um conv�nio de R$ 4 milh�es para a aquisi��o de m�quinas e equipamentos agr�colas para a cidade goiana. No entanto, deixaram pelo caminho uma s�rie de d�vidas sobre o porqu�. Primeiro, Bosco informou que atendeu a pedido de Ottaci, amazonense e deputado de Roraima, para benfeitorias no munic�pio localizado a 250 quil�metros de Goi�nia.
Por sua vez, o gabinete de Ottaci afirmou que o deputado, na verdade, atendeu a um pedido do correligion�rio goiano, o deputado Lucas Verg�lio, l�der do partido. Este negou que tenha solicitado o repasse. Foi ent�o que Ottaci Nascimento voltou atr�s e divulgou nota afirmando que n�o foi a pedido de Lucas Verg�lio. "Subscrevi essa indica��o no ano passado. Vale destacar que atendo esses leg�timos pleitos, pois sempre recebo apoio quando preciso indicar recursos para Roraima", disse. E encerrou sem especificar a quem beneficiou com sua cota.
Mem�ria
O discurso de ajuda aos colegas tamb�m foi invocado pelo deputado Celso Sabino, do PSDB do Par�. Em entrevista ao Estad�o, primeiro ele negou ter destinado R$ 2 milh�es para pavimenta��o e obras em Santana, no Amap�. A cidade � separada do Par� pelo Rio Amazonas: "Isso � falso". Em seguida, recorreu � mem�ria. "�s vezes pedem para mim, para que eu ajude em seus pleitos, para conseguir vacinas, recursos para a sa�de. Existe a possibilidade de algu�m ter me pedido, mas do meu mandato n�o tenho nada para o Amap�", frisou. "Pode ter sido do deputado Luiz Carlos (PSDB-AP), somos muito amigos. Ele pede para conseguir recursos para Macap�."
Ao Estad�o, Luiz Carlos admitiu ter pedido o repasse a Santana, mas diretamente ao ministro Rog�rio Marinho. "Pode ser alguma confus�o (incluir o nome de Sabino na planilha)", disse.
Quatro deputados contatados pela reportagem negaram, enfaticamente, a autoria de indica��es para fora de seus Estados, apesar de seus nomes terem sido registrados na planilha de controle de repasses do governo federal. Gil Cutrim (Republicanos-MA) e Juscelino Filho (DEM-MA) negam que arranjaram R$ 2 milh�es, cada, para a Codevasf atuar na Bahia. O deputado Daniel Coelho (Cidadania-PE) disse que n�o fez indica��es para asfaltamento em Tabuleiro do Norte e Chaval, no Cear�. Sh�ridan (PSDB-RR) afirmou n�o ter rela��o com conv�nio de R$ 2,2 milh�es entre o minist�rio e C�cero Dantas, na Bahia.
J� o senador M�rcio Bittar (MDB-AC) disse que precisaria se informar com o seu chefe de gabinete sobre o questionamento feito pela reportagem a respeito de repasses para fora do Estado. O planilh�o de R$ 3 bilh�es do governo liga o senador a repasses de R$ 50 milh�es, ao todo. Nem um centavo para o Acre. Tudo foi empenhado para munic�pios de Goi�s e Cear�.
"N�o tenho a menor lembran�a disso", disse, sobre as indica��es de dezembro de 2020. Em seguida, por�m, minimizou a import�ncia de se apontar a autoria das indica��es. "O que importa se foi indica��o do Z�, do Pedro ou do Manoel? O que importa n�o � se foi usado o dinheiro p�blico para uma obra e foi feito bem feito?", disse Bittar.
O maior repassador de recursos do minist�rio a Estados alheios � o senador Davi Alcolumbre (DEM-AP). Foram R$ 51,6 milh�es para atender indica��es de senadores sem tr�nsito no Planalto com os quais ele articulou apoio a Pacheco. Ele n�o comentou o assunto.
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POL�TICA
Or�amento secreto: pol�ticos indicam verbas para fora de seus Estados
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