
Os protestos contra o governo de Jair Bolsonaro (sem partido), realizados em todo o pa�s neste s�bado (29/05), representam uma novidade no j� bastante conturbado ambiente pol�tico nacional.
Os atos aconteceram em pelo menos 180 munic�pios, de 24 Estados e do Distrito Federal, mostrando que h� uma ampla diversidade geogr�fica na parcela da popula��o que se op�e ao atual mandat�rio.
Tamb�m contaram com vasta repercuss�o na imprensa internacional, com cobertura de ve�culos t�o diversos como Guardian, Economist, Al Jazeera, Le Monde, NY Post, La Naci�n e Indian Times, contribuindo para ampliar o desgaste da imagem internacional do pol�tico de extrema direita.
- Como a imprensa internacional cobriu os protestos por impeachment de Bolsonaro
- Pa�s tem protestos contra Bolsonaro em 24 Estados e no DF
As manifesta��es de rua da oposi��o acontecem num momento em que Bolsonaro se v� pressionado pela queda de sua popularidade nas pesquisas de opini�o mais recentes e pelo avan�o das investiga��es da CPI (Comiss�o Parlamentar de Inqu�rito) que avalia a resposta do governo � pandemia que j� matou mais de 461 mil pessoas no pa�s.
Mas o que essa novidade pol�tica deve trazer de consequ�ncias pr�ticas para Bolsonaro?
A BBC News Brasil ouviu Carlos Melo, cientista pol�tico e professor do Insper; Pablo Ortellado, coordenador do Monitor do Debate Pol�tico no Meio Digital e professor da USP (Universidade de S�o Paulo); e Claudio Couto, cientista pol�tico e professor da FGV (Funda��o Getulio Vargas) para saber o que podemos esperar do "dia seguinte" das manifesta��es.
1. Bolsonaro perde o 'monop�lio das ruas'
Uma primeira consequ�ncia das mobiliza��es deste s�bado, segundo os analistas, � que Bolsonaro perde o "monop�lio das ruas", uma situa��o confort�vel em que apenas os seus apoiadores ocupavam o espa�o p�blico para se manifestar.
"Agora ele n�o pode mais falar que o povo est� na rua em seu apoio. Aquela ideia de 'eu autorizo, presidente' [slogan usado por manifestantes governistas] n�o � mais t�o simples, porque tivemos um contingente grande de pessoas dizendo que n�o autorizam o presidente", observa Melo, do Insper.
"Bolsonaro vinha at� aqui com uma certa tranquilidade em mencionar essa figura abstrata chamada 'povo', porque havia uma situa��o em que apenas os seus apoiadores iam para a rua", diz o cientista pol�tico. "Agora, ele perdeu o monop�lio da mobiliza��o popular e da manifesta��o."

2. Impeachment volta � mesa
Para Pablo Ortellado, da USP, uma outra consequ�ncia dos protestos deste fim de semana � que aumenta a press�o pelo impeachment no Congresso Nacional.
"O tamanho da manifesta��o e sua difus�o pelo territ�rio nacional colocam de novo no horizonte um impeachment que parecia um pouco 'enterrado' pela persist�ncia da aprova��o do Bolsonaro", avalia o pesquisador.
Para Ortellado, isso gera diversas consequ�ncias, que v�o desde novas movimenta��es para que o impeachment aconte�a, at� o aumento do "pre�o" que os deputados e senadores do Centr�o cobram pelo apoio ao governo.
Carlos Melo avalia que o fato de o PT, principal partido da oposi��o, n�o ter interesse no impeachment nesse momento - j� que o partido v� benef�cios no desgaste de Bolsonaro para seu pr�prio projeto eleitoral de 2022 - n�o � um fator impeditivo para que o clamor pelo impedimento presidencial avance.
"O impeachment � sempre algo que depende muito mais da insatisfa��o popular e da mobiliza��o de massas do que da vontade dos atores pura e simplesmente", diz o professor do Insper, lembrando dos casos de Fernando Collor e Dilma Rousseff.
"Com isso, n�o quero dizer que vai ter impeachment, mas n�o posso afirmar de forma alguma que simplesmente n�o vai ter porque o establishment n�o quer. N�o � assim que a coisa ocorre."
Claudio Couto, da FGV, por sua vez, avalia que o impeachment volta como uma bandeira de mobiliza��o, mas n�o necessariamente como "um item real do card�pio".
Segundo ele, s�o duas as raz�es para isso: a proximidade das elei��es de 2022 e o fato de o vice-presidente Hamilton Mour�o n�o se apresentar como uma alternativa confi�vel.

3. Aumenta a 'fatura' do Centr�o
Se t�m vis�es distintas sobre as perspectivas para o impeachment, em uma coisa os analistas s�o un�nimes: a demonstra��o de for�a da oposi��o deve aumentar o pre�o cobrado pelo apoio do chamado "Centr�o" - grupo de partidos de centro-direita que costuma estar na base de qualquer governo do pa�s, independentemente da posi��o ideol�gica, mediante troca de favores como cargos e verbas.
"Os pol�ticos s�o sens�veis �s mobiliza��es e entendem elas como uma forma de press�o da popula��o", avalia Melo.
"Isso aumenta a 'fatura' do Centr�o e tamb�m a possibilidade de o Centr�o, depois que 'resgatar essa fatura', n�o entregar o que prometeu, porque o Centr�o � antes de tudo pragm�tico", observa o analista.
"Conforme a perspectiva de reelei��o entra em risco, esses setores tendem a abandonar o barco, para embarcar em projetos mais promissores. Tem uma frase do Tancredo Neves que diz o seguinte: todo pol�tico vai com outro at� a sepultura, mas n�o se joga."
Claudio Couto, da FGV, tamb�m escolhe uma frase de efeito para falar sobre essa quest�o.
"Tem um ditado da pol�tica brasileira que diz que 'o Centr�o ningu�m compra, s� aluga'", cita o cientista pol�tico.
"Essa � uma ideia interessante porque ela mostra o seguinte: o Centr�o n�o est� ali para ser um partido org�nico do governo, que vai apoi�-lo at� o final. Ele � importante para a aprova��o de projetos, para proteger o presidente, por exemplo, de uma tentativa de impeachment, mas ele � insuficiente quando o governo enfrenta dificuldades reais. Se o Centr�o perceber que o barco est� afundando, ele corre para outro lado."
4. Dificulta a reelei��o de Bolsonaro
A debandada do Centr�o pode ter uma outra consequ�ncia para Bolsonaro: dificultar a aprova��o no Congresso de projetos que o governo deve tentar encaminhar nos pr�ximos meses com objetivo de melhorar sua popularidade para as elei��es do pr�ximo ano.
Em entrevista publicada pela Folha de S. Paulo na �ltima segunda-feira (24/05), o ministro da Economia Paulo Guedes deixou clara essa inten��o.
"Agora vem a elei��o? N�s vamos para o ataque. Vai ter Bolsa Fam�lia melhorado, BIP [B�nus de Inclus�o Produtiva], o BIQ [B�nus de Incentivo � Qualifica��o], vai ter uma por��o de coisa boa para voc�s baterem palma", disse o ministro, citando programa planejado pelo governo de incentivo � qualifica��o para jovens, tendo como contrapartida uma bolsa paga em parte pelo governo (que seria chamada de BIP) e em parte pelas empresas (BIQ).
"O projeto de reelei��o depende de uma s�rie de fatores, inclusive da aprova��o de medidas na C�mara e no Senado e as manifesta��es enfraquecem a agenda do governo dentro do Congresso Nacional", avalia Carlos Melo.
"O governo tem desempenho fr�gil, � pouco realizador - n�o � toa Bolsonaro tem inaugurado ponte de madeira -, enfrenta o problema ser�ssimo da pandemia, com 460 mil mortos at� agora, e uma economia que d� sinais de recupera��o, mas com milh�es sem emprego. Nada disso ajuda."

5. Empodera a CPI da covid
Por fim, uma �ltima consequ�ncia apontada pelos analistas deve afetar o novo entretenimento preferido dos brasileiros: a CPI que investiga a resposta da atual gest�o � pandemia.
"A manifesta��o demonstra que h� um grande descontentamento. Que esse setor que n�o gosta do Bolsonaro est� com muito �mpeto", avalia Ortellado. "Isso d� mais respaldo para o bloco de oposi��o da CPI, porque ele se sente simbolicamente apoiado pela popula��o."
Segundo o professor da USP, isso tamb�m deve permitir aos pol�ticos n�o identificados com a oposi��o serem mais cr�ticos, caso, por exemplo, do presidente da comiss�o, Omar Aziz (PSD-AM).
Carlos Melo avalia que o clamor das ruas tamb�m pode retrair parte da base de apoio ao governo.
"N�o acho que o Fernando Bezerra [senador pelo MDB-PE e l�der do governo no Senado] amanh� estar� intimidado, ou que o Flavio Bolsonaro estar� intimidado. Mas uma s�rie de nomes na CPI que andam ali no fio da navalha, fazendo discursos amb�guos, ter�o um pouco mais de cuidado."
Para Claudio Couto, mais do que as ruas empoderarem a CPI, s�o os achados da CPI que podem ajudar a esquentar a temperatura das ruas.
"A tend�ncia � muito mais esse tipo de mobiliza��o ser alimentada pela CPI do que o oposto. Mas, � claro, que isso tamb�m de alguma forma legitima a atua��o da CPI, produz um efeito favor�vel no sentido de facilitar que a comiss�o avance no seu trabalho."
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