
� enganoso um v�deo viral nas redes sociais que conclui que o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) tem apoio de 87,5% da popula��o a partir da parcial de uma enquete de um programa de TV regional. Ao divulgar esse n�mero como sinal de aprova��o do presidente, o youtuber bolsonarista Gustavo Gayer omite o resultado final da enquete e n�o deixa claro que esse tipo de levantamento n�o tem valor cient�fico e n�o representa adequadamente a opini�o da popula��o brasileira.
Em 29 de junho, o programa Balan�o Geral, da TV Sucesso, no interior de Goi�s, pediu que os espectadores enviassem por WhatsApp o nome do candidato em quem votariam para presidente. Ao final do programa, 64,9% disseram que escolheriam Bolsonaro e 33,5% citaram o ex-presidente Luiz In�cio Lula da Silva (PT).
N�o � poss�vel tirar conclus�es a partir do resultado dessa enquete porque o programa tem alcance regional e n�o h� controle sobre quem responde � pergunta. N�o h� como saber quantas pessoas participaram do levantamento, quantas eram mulheres e quantas eram homens, quantas t�m t�tulo de eleitor, nem mesmo se algu�m enviou mais de uma mensagem.
Pesquisas eleitorais realizadas por institutos como Ipec (formado por ex-executivos do Ibope) e Datafolha usam m�todos estat�sticos para garantir que a popula��o ouvida seja representativa de todos os brasileiros. Ou seja: os entrevistados s�o selecionados em propor��es de sexo, escolaridade, ra�a e renda semelhantes �s da totalidade do pa�s.
Como verificamos?
Consultamos uma verifica��o publicada anteriormente pelos parceiros do UOL Confere, por meio da qual acessamos a �ntegra do programa Balan�o Geral de Goi�s. Tamb�m recuperamos checagens do Comprova sobre enquetes e pesquisas eleitorais. Checamos as regras do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) sobre divulga��o de pesquisas de opini�o.
Analisamos ainda os dados da pesquisa de inten��o de voto para presidente mais recente, realizada pelo Ipec e divulgada pelo Estad�o.
Por fim, consultamos verifica��es anteriores do Comprova a respeito da auditabilidade do voto eletr�nico.
Entramos em contato com Gustavo Gayer por e-mail e WhatsApp. O youtuber se limitou a ironizar a reportagem.
Verifica��o
A enquete do Balan�o Geral
Como mostrou o UOL Confere, a TV Sucesso � uma afiliada da Record que transmite para 30 cidades do sudoeste de Goi�s. O Balan�o Geral � apresentado por Anderson Magr�o, em um est�dio em Jata�, e por R�mulo C�sar, em Rio Verde. No dia 29 de junho, o programa pediu que os espectadores enviassem por WhatsApp a resposta � pergunta “se a elei��o fosse hoje, voc� votaria em quem?”.
No resultado parcial citado no v�deo de Gustavo Gayer, exibido �s 12h15 no programa original, Bolsonaro aparecia com 87,5% e Lula com 6,2%. Outros 6,2% citaram o ex-juiz federal S�rgio Moro. Pouco mais de 20 minutos depois, �s 12h36, os n�meros j� eram ligeiramente diferentes: 83,3% para Bolsonaro e 11,3% para Lula.

Ao final do programa, foi exibido o resultado final: 64,9% para Bolsonaro e 33,1% para Lula. Moro foi mencionado em 1,2% das respostas e o ex-ministro Ciro Gomes (PDT), em 0,4%. O governador de S�o Paulo, Jo�o Doria (PSDB), tamb�m apareceu com 0,4%.
O apresentador R�mulo C�sar comenta os n�meros dizendo que a mesma pergunta � feita todo m�s, com resultados semelhantes. Ele n�o informa quantas pessoas responderam � din�mica, nem quantas mandaram mais de uma mensagem. Tamb�m n�o h� segmenta��o por sexo, escolaridade ou renda.
Como a participa��o � espont�nea e o p�blico conhece as parciais antes do encerramento, isso pode influenciar as conclus�es. Por exemplo, um eleitor de Ciro poderia se sentir impelido a mandar mais mensagens para melhorar a porcentagem do pedetista.
Por que enquetes n�o t�m valor cient�fico?
Enquetes n�o t�m controle sobre o p�blico respondente. O resultado reflete apenas a opini�o dos espectadores do Balan�o Geral daquele dia que decidiram participar da din�mica de vota��o. Importante lembrar que mesmo entre os moradores do interior de Goi�s, nem todos assistem ao programa, t�m acesso � Internet ou usam smartphone — por isso, h� uma parte da popula��o que n�o � representada.
Em pesquisas eleitorais, institutos de pesquisa como o Ipec e o Datafolha usam dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estat�stica (IBGE) e do TSE para definir cotas de sexo, idade, escolaridade e outras caracter�sticas. O objetivo � ouvir um grupo proporcional � popula��o brasileira, ainda que em n�mero menor.
Na pesquisa de inten��o de voto mais recente, divulgada em junho pelo Ipec, foram ouvidas 2.002 pessoas de 141 munic�pios brasileiros, presencialmente. A partir de dados do Censo 2010 e da Pesquisa Nacional por Amostra de Domic�lios Cont�nua (PNADC) 2018, estipulou-se o n�mero de entrevistados de cada grupo em crit�rios de sexo, idade, n�vel de instru��o e atividade profissional em todas as regi�es do pa�s.
O resultado: 49% dos entrevistados disseram que votariam em Lula e 23% em Bolsonaro, com margem de erro de 2 pontos porcentuais para mais ou para menos. O petista tem vantagem sobre o atual presidente em todos os segmentos populacionais analisados pelo Ipec.
Em anos eleitorais, a divulga��o de pesquisas segue regras elaboradas pelo TSE. Devem ser registradas junto ao Tribunal informa��es sobre “o contratante da pesquisa, com CPF ou CNPJ; o valor e a origem dos recursos gastos; a metodologia e o per�odo de sua realiza��o; o question�rio aplicado ou a ser aplicado; o nome do estat�stico respons�vel; e a indica��o do estado em que ser� realizado o levantamento”.
O TSE pro�be a divulga��o de enquetes no per�odo eleitoral. Segundo a Resolu��o nº 23.600/2019, se encaixam nessa categoria “o levantamento de opini�o sem plano amostral, que depende da participa��o espont�nea do interessado e que n�o utiliza m�todo cient�fico para a sua realiza��o, apresentando resultados que possibilitam ao eleitor perceber a ordem dos candidatos na disputa”.
Qual a opini�o da classe C e dos menos escolarizados?
No v�deo, o youtuber Gustavo Gayer diz que a enquete do Balan�o Geral reflete a opini�o da classe C e dos menos escolarizados. Na realidade, de acordo com a �ltima pesquisa Ipec, a maior parte desses segmentos populacionais declarou inten��o de votar no ex-presidente petista.
Entre os entrevistados que cursaram at� a 4ª s�rie do ensino fundamental, 52% disseram preferir Lula e 18%, Bolsonaro; na faixa de pessoas que estudaram da 5ª � 8ª s�rie, os �ndices s�o de 59% e 19%; entre os que chegaram ao Ensino M�dio, 50% e 24%. No grupo de escolaridade superior, a diferen�a entre os dois candidatos � menor: 37% responderam que votariam em Lula e 29% em Bolsonaro.
Na segmenta��o por renda, o petista tem a prefer�ncia de 62% entre os que recebem at� 1 sal�rio m�nimo, contra 20% do atual presidente; nos que ganham de 1 a 2 sal�rios m�nimos, os �ndices s�o de 51% e 22%; na faixa de 2 a 5 sal�rios, 40% e 29%. Bolsonaro chega mais perto de Lula apenas no grupo com renda superior a 5 sal�rios m�nimos: tem 34% das inten��es de voto, contra 39% do ex-presidente.
A pesquisa de inten��o de voto divulgada pelo Datafolha em maio mostrou um cen�rio semelhante. Entre os que t�m escolaridade de ensino fundamental, 51% disseram preferir Lula e 20%, Bolsonaro. Essas porcentagens foram de 39% e 26% na faixa de ensino m�dio e de 30% e 22% na de ensino superior. O petista tamb�m apresentou vantagem entre os que ganham at� 2 sal�rios m�nimos (47%, contra 20% do atual presidente) e no grupo que recebe de 2 a 5 sal�rios (34% a 29%). Bolsonaro apareceu � frente no segmento mais rico: 30% entre os que t�m renda de 5 a 10 sal�rios e 24% entre os que recebem mais de 10 sal�rios. Nessas faixas, Lula pontuou com 26% e 18%.
Voto eletr�nico j� � audit�vel
No v�deo, Gayer diz que “se n�s n�o conseguirmos o voto audit�vel com contagem p�blica, Lula vai ser colocado na Presid�ncia, por mais que 87,5% da popula��o rejeite Lula e aprove Bolsonaro”. Ele faz refer�ncia � Proposta de Emenda � Constitui��o (PEC) 135/2019, do voto impresso audit�vel, que tramita na C�mara dos Deputados. O texto, da deputada federal Bia Kicis (PSL-DF), define a instala��o de impressoras junto aos equipamentos de vota��o, para emitir comprovantes que ficariam armazenados em urnas.
O sistema de vota��o eletr�nica, no entanto, j� � audit�vel. Como mostrou o Comprova no ano passado, h� v�rios mecanismos para a auditagem dos votos. Partidos, coliga��es, candidatos e Minist�rio P�blico podem fazer auditoria pr� e p�s-elei��es.
O TSE informa que nunca se identificou ou comprovou fraude eleitoral durante todo o per�odo de uso das urnas eletr�nicas. O equipamento � regularmente submetido a testes p�blicos de seguran�a e atualiza��es.
Quem � o youtuber
Ele tem um canal de YouTube com 419 mil inscritos. J� foi desmentido em verifica��es do Comprova que demonstraram que um documento n�o prova fraude nas elei��es 2018 e que uma pesquisa brasileira n�o usou doses letais para matar pacientes e desacreditar cloroquina. Foi candidato a prefeito de Goi�nia em 2020 pelo Democracia Crist� (DC); ficou em 4º lugar com 7,6% dos votos.
Por que investigamos?
Em sua quarta fase, o Comprova checa conte�dos suspeitos sobre o governo federal ou a pandemia de COVID-19 que tenham atingido alto grau de viraliza��o. O v�deo verificado foi visto ao menos 286,6 mil vezes no YouTube e Facebook.
Conte�dos que descredibilizam o sistema eleitoral brasileiro, ainda que por meio de informa��es manipuladas e enganosas, corroboram as acusa��es, sem fundamentos, que o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) faz constantemente � veracidade do processo eleitoral. Desde o in�cio do voto eletr�nico no Brasil, em 1996, nenhum caso de fraude foi identificado e comprovado.
Desde a �ltima elei��o presidencial, quando as supostas falhas no sistema eleitoral passaram a ser divulgadas, o Comprova j� verificou diversas vezes conte�dos falsos e enganosos sobre o assunto. Em outubro do ano passado, o projeto mostrou que um documento n�o prova fraude nas elei��es de 2018 nem comprova vit�ria de Bolsonaro no 1º turno. No m�s seguinte, duas publica��es do Comprova apontaram para o fato de o voto eletr�nico no Brasil j� ser audit�vel.
Para o Comprova, um conte�do � enganoso quando confunde, com ou sem a inten��o deliberada de causar dano, porque usa dados imprecisos e induz a uma interpreta��o diferente da inten��o de seu autor, al�m de ter sido retirado do contexto original e usado em outro, com altera��es no significado.
