Ao mesmo tempo em que passaram a receber montantes bilion�rios de recursos p�blicos para financiar suas opera��es e campanhas, os partidos pol�ticos est�o destinando parcelas cada vez maiores da verba do Fundo Partid�rio para as funda��es mantidas pelas pr�prias legendas. Os gastos dessas funda��es n�o s�o divulgados pelo Sistema de Presta��o de Contas Anual do Tribunal Superior Eleitoral (TSE). Deste modo, enquanto as receitas dos partidos est�o em alta, a destina��o das despesas est� cada vez menos transparente.
As funda��es s�o institui��es obrigat�rias - por lei, todas as legendas precisam ter uma e destinar a elas ao menos 20% de recursos do Fundo Partid�rio. A ideia da legisla��o � manter, dentro das siglas, �rg�os de car�ter educativo que capacitem seus integrantes para propor pol�ticas p�blicas consistentes. Um hist�rico de suspeitas, no entanto, ronda essas institui��es. Nos �ltimos anos, gastos sem rela��o com fun��es educativas foram alvo de investiga��es.
Em 2019, em m�dia, 22% das despesas dos partidos foram para as funda��es. No ano passado, foram 28%. Neste ano, em dados parciais, esse porcentual m�dio chega a 39%, segundo informa��es do TSE. Esses n�meros consideram a soma das despesas de todas as siglas. H� partidos que chegam a mandar para as funda��es mais da metade de suas despesas - como PSC, PP (partido do presidente da C�mara, Arthur Lira) e PSL.
Desde 2019, as funda��es receberam cerca de R$ 414 milh�es dos partidos - um dinheiro que financiaria por dois anos, por exemplo, a Faculdade de Filosofia, Letras e Ci�ncias Humanas da USP, que abriga o Departamento de Ci�ncias Pol�ticas da universidade.
O Fundo Partid�rio e o Fundo Especial de Assist�ncia Financeira aos Partidos Pol�ticos (o chamado fundo eleitoral) s�o as duas principais fontes de financiamento das legendas nacionais. O financiamento p�blico passou a ganhar espa�o como receita a partir de 2015, quando a minirreforma pol�tica foi aprovada - na esteira da Lava Jato - e baniu o financiamento empresarial de campanhas.
Desde ent�o, pol�ticos t�m feito press�o para incrementar esses fundos. Recentemente, o Congresso ampliou para R$ 5,7 bilh�es a previs�o do fundo eleitoral para o ano que vem (em 2020, o valor havia sido de R$ 2 bilh�es e, em 2018, de R$ 1,7 bilh�o).
A responsabilidade pela fiscaliza��o das contas das funda��es passou por um vai e vem entre Minist�rio P�blico e Justi�a Eleitoral, que se alternavam na fun��o entre 2018 e 2020, gra�as a dois entendimentos diferentes sobre o tema no TSE. Atualmente, essas despesas s�o analisadas de forma manual pelo tribunal, que n�o tem um sistema para publicar como esse dinheiro � gasto. "O TSE est� se estruturando para a an�lise das contas das funda��es", disse o �rg�o, em nota, ao informar que elaborou proposta para desenvolvimento de um novo sistema de presta��o de contas que vai contemplar "elabora��o, exame e divulga��o da presta��o de contas das funda��es". N�o foi informado o prazo para a efetiva��o do novo sistema.
Blogueiros e d�vidas
Dentre as suspeitas j� levantadas sobre usos fora da legisla��o para as verbas das funda��es h� a transfer�ncia de recursos da Funda��o �ndigo, do PSL, para blogueiros ligados ao chamado "gabinete do �dio" do governo Jair Bolsonaro. Em 2017, o MP vetou uma tentativa do MDB de usar R$ 5 milh�es em recursos da funda��o do partido, a Ulysses Guimar�es, para bancar d�vidas de campanha.
Al�m disso, sem a divulga��o dos dados, fica imposs�vel que entidades externas e a sociedade civil verifiquem se as funda��es gastam os recursos p�blicos com empresas pertencentes aos pr�prios dirigentes partid�rios ou a doadores de campanha. Essa pr�tica foi apontada pelo Movimento Transpar�ncia Partid�ria h� tr�s anos, quando a entidade, em parceria com o TSE, cruzou despesas do Fundo Partid�rio com os CPFs dos filiados nos partidos. As transfer�ncias dessa natureza superaram R$ 10 milh�es.
"Tem ainda a quest�o do uso eficiente dos recursos p�blicos. � adequado que seja pago um aluguel de uma mans�o no Lago Sul (de Bras�lia) para ser a sede de um partido? � leg�timo questionar isso", disse Marcelo Issa, do Movimento Transpar�ncia Partid�ria. "Falta muita transpar�ncia nas funda��es. Voc� consegue visualizar no sistema o porcentual transferido para a funda��o. Dali para a frente, como a funda��o utilizou, voc� n�o consegue. A funda��o n�o precisa alimentar o sistema."
Uma das ideias que circulam nas discuss�es sobre a nova reforma pol�tica no Congresso � a de repassar mais uma vez ao MP a responsabilidade sobre a fiscaliza��o das contas dos partidos.
"Infelizmente, os partidos n�o querem transpar�ncia e contam com a colabora��o, a meu ver, do TSE. Em plena era digital, se v� o tribunal julgando contas de cinco, seis anos atr�s", afirmou o secret�rio-geral da organiza��o Contas Abertas, Gil Castelo Branco. "As funda��es s�o ve�culos para a falta de transpar�ncia. Acabam convergindo recursos cada vez maiores e as presta��es de contas s�o opacas e defasadas."
Sem um sistema de divulga��o das contas partid�rias, o Estad�o questionou as funda��es como gastaram sua cota dos recursos p�blicos do Fundo Partid�rio. As entidades afirmaram que enviam a presta��o de contas ao TSE e ao Minist�rio P�blico e que os gastos s�o com cursos de forma��o (presencial e, desde o ano passado, online), realiza��o de simp�sios e eventos e com a edi��o de publica��es de natureza partid�ria.
Duas das mais conhecidas funda��es, a Perseu Abramo (do PT) e o Instituto Teot�nio Vilela (do PSDB) enviaram uma rela��o de atividades realizadas nos �ltimos dois anos com os recursos do fundo, em �reas que v�o do desenvolvimento sustent�vel a propostas de enfrentamento da pandemia.
O Instituto Liberdade e Cidadania (Instituto Tancredo Neves), do DEM, disse que o instituto devolve ao partido os recursos n�o usados do Fundo Partid�rio. No ano passado, dos R$ 8,8 milh�es recebidos, R$ 5,4 milh�es retornaram � sigla, segundo nota enviada � reportagem.
O Instituto �ndigo, do PSL, declarou que envia a presta��o de contas ao MP do Distrito Federal e ao TSE, e que seria poss�vel acompanhar tais gastos. A Funda��o Ulysses Guimar�es, do MDB, afirmou que todas as suas contas at� 2019 foram aprovadas e que, no ano passado, realizou simp�sios e cursos de educa��o a dist�ncia. A Funda��o Milton Campos, do Progressistas, disse que n�o aumentou a propor��o de gastos do fundo, diferentemente do que mostra o sistema do TSE. Afirmou que investiu os recursos em cursos online e material de divulga��o digital.
A Funda��o Liberdade Econ�mica, do PSC, informou que foi estruturada em fevereiro de 2018 e s� passou a receber recursos do Fundo Partid�rio ap�s 2019 (eles vinham sendo depositados judicialmente). A Funda��o afirma cumprir todas as normas de transpar�ncia e teve suas contas aprovadas pela Justi�a.
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POL�TICA
Partidos ampliam repasse de verba para funda��es, que t�m menos transpar�ncia
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