
O
terceiro discurso de Bolsonaro
na Assembleia Geral da Organiza��o das Na��es Unidas (ONU), nesta (21/09), deve funcionar como um ensaio do que ele pretende mostrar ao completar os 1.000 dias de governo, marca que alcan�ar� no fim de setembro e que tem mobilizado alta expectativa na gest�o.
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Por um lado, Bolsonaro tentar� mostrar como seu governo avan�ou com a vacina��o dos brasileiros e conteve a pandemia ao mesmo tempo em que irrigou a economia com um aux�lio emergencial que beneficiou quase um ter�o da popula��o e impediu uma recess�o mais aguda em 2020. Al�m disso, focar� em realiza��es para, nas palavras de integrantes do pr�prio Itamaraty, "desarmar a bomba" da quest�o ambiental que o pr�prio governo ajudou a montar e que trouxe danos � imagem internacional do pa�s.
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Por outro lado, tentar� caracterizar que o tom mais pragm�tico em certos assuntos n�o o afasta dos princ�pios que o elegeram - e que agradam sua base mais aguerrida. S�o esperadas cita��es a temas como o marco temporal (que limita a possibilidade de demarca��o de terras ind�genas �quelas ocupadas por eles em 1988), � liberdade de express�o da direita em redes sociais e a valores crist�os e conservadores.
Para o Itamaraty, que preferia que Bolsonaro evitasse men��es a temas controversos - e fizesse um discurso mais ao sabor da fala dele na 13ª c�pula dos Brics (grupo que re�ne Brasil, R�ssia, �ndia, China e �frica do Sul), h� alguns dias, quando o presidente chegou a dizer que a parceria com a China tem sido "essencial" para o combate da pandemia por seu governo -, a expectativa � que a agenda positiva que o presidente vai apresentar solape eventual repercuss�o negativa dos aspectos mais ideol�gicos da apresenta��o.
No Itamaraty, a percep��o � que o presidente "j� surpreendeu positivamente em abril", na C�pula do Clima promovida pelo presidente americano, Joe Biden, e portanto a expectativa agora seria "positiva".
O Itamaraty sabe, por�m, que a Assembleia Geral da ONU � uma plataforma valorizada pelo presidente e que ao menos trechos do discurso devem escapar ao tom discreto e pragm�tico que o chanceler Carlos Fran�a tem tentado imprimir � atua��o do Itamaraty.
"Ele provavelmente vai apresentar algo mais moderado, mas n�o veremos uma vers�o 'Bolsonarinho paz e amor'", diz Guilherme Casar�es, professor de rela��es internacionais da Funda��o Getulio Vargas, em uma alus�o ao Lulinha Paz e Amor criado pelo marqueteiro Duda Mendon�a em 2002 para amenizar a imagem de radical do ex-presidente Lula.

'Agenda positiva'
Al�m de destacar que o Brasil � o pa�s em desenvolvimento com metas mais ambiciosas, tanto no combate ao desmatamento (zerar at� 2030) quanto � emiss�o de gases do efeito estufa (alcan�ar a neutralidade at� 2050) e relembrar que o Brasil det�m mais de 80% de sua matriz energ�tica de fonte limpa, os diplomatas brasileiros querem que Bolsonaro anuncie em plen�rio o cumprimento de uma promessa que fez em abril, na C�pula do Clima, a Biden.
Na ocasi�o, o brasileiro havia dito que dobraria a verba de fiscaliza��o para coibir a devasta��o ambiental. Em meados de agosto, o governo anunciou incremento de 118% nos recursos de �rg�os como o Ibama. E ainda no m�s passado, os dados apontaram uma queda no desmatamento, interrompendo uma tend�ncia de alta.
As sinaliza��es s�o vistas como fundamentais para voltar a atrair o investidor estrangeiro. "Acredito que avan�amos. Antes o presidente at� negava que houvesse um problema, agora reconhecemos o desafio do desmatamento e estamos enfrentando", afirmou � BBC News Brasil um embaixador, em car�ter reservado.
Em outra frente, Fran�a defende que Bolsonaro explore o bom momento do pa�s na pandemia. O Brasil rec�m-ultrapassou os EUA em propor��o de cidad�os vacinados com pelo menos uma dose (68,1% a 63%), embora esteja muito distante em rela��o � taxa dos vacinados com duas doses (37% a 54%). Possivelmente pelo avan�o na imuniza��o, a m�dia m�vel de casos e mortes por covid-19 recuou para patamares inferiores ao verificado ao longo do �ltimo ano. A expectativa do Planalto � que at� o fim de outubro o pa�s tenha a maioria da popula��o completamente imunizada.

Isso possibilitaria, segundo afirmou um embaixador � BBC News Brasil, que Bolsonaro fizesse um an�ncio: o Brasil pretende doar doses de vacinas contra a covid-19 para outros pa�ses da Am�rica Latina que enfrentam escassez de doses, como o Paraguai, o Peru e o Haiti. O movimento seria uma tentativa de retomar certo protagonismo na regi�o, enfraquecido depois que o governo Bolsonaro deixou de priorizar o Mercosul e as rela��es Sul-Sul.
Ainda para reafirmar a import�ncia global do Brasil, Bolsonaro deve falar sobre a rec�m-conquistada vaga n�o permanente no Conselho de Seguran�a da ONU e mencionar que o pa�s estendeu a afeg�os o visto humanit�rio, que j� havia sido disponibilizado a s�rios e haitianos.
Temas controversos
Para o brasilianista Brian Winter, editor-chefe da publica��o americana Americas Quartely, a tentativa de agenda positiva faz sentido para atrair o investidor estrangeiro, que "est� particularmente interessado em quest�es de meio ambiente e em ver se Bolsonaro far� alguma observa��o que signifique confronto entre Poderes ou fragilidade � democracia".
"O problema � que mesmo que ele fa�a afirma��es contundentes em favor do meio ambiente, muita gente n�o vai acreditar porque Bolsonaro tem um problema de credibilidade", diz Winter.
A quest�o da vacina��o � um exemplo da fragilidade que o brasilianista aponta. A defesa da imuniza��o em massa esbarra na condi��o pessoal do presidente brasileiro, o �nico l�der do G-20 a afirmar n�o estar vacinado. "O que acontece, voc� vai tomar vacina para que? Para ter anticorpos. A minha taxa de anticorpos est� l� em cima. Eu te apresento o documento, estou com 991 (no exame m�dico IgG). Ent�o eu estou bem. Vou tomar vacina CoronaVac, por exemplo, que n�o vai chegar a essa efetividade, para que eu vou tomar? Agora, todo mundo j� tomou vacina no Brasil? Depois que todo mundo tomar, eu vou decidir meu futuro a�", afirmou o presidente, ao lado do ministro da Sa�de, Marcelo Queiroga, que tamb�m comp�e a comitiva que foi a Nova York.
Outro tema que o presidente promete abordar, para contrariedade dos diplomatas, � a quest�o do marco temporal, atualmente em an�lise pelo Supremo Tribunal Federal. "O que eu devo falar l� (na ONU)? Algo nessa linha: se o marco temporal for derrubado (pelo STF), se tivermos que demarcar novas terras ind�genas —hoje em dia temos aproximadamente 13% do territ�rio nacional demarcado como terra ind�gena j� consolidada—, caso tenha-se que levar em conta um novo marco temporal, essa �rea vai dobrar", afirmou Bolsonaro em live antes de chegar a Nova York.
Segundo Bolsonaro, se o STF rejeitar a tese do marco temporal, a "seguran�a alimentar" do Brasil e do mundo estaria em risco, em prov�vel refer�ncia � redu��o das terras dispon�veis para a produ��o do agroneg�cio. Existe a tens�o entre integrantes do governo que uma men��o a um assunto sob delibera��o de outro poder possa reacender a crise institucional, amenizada pela carta recuo de Bolsonaro, elaborada pelo ex-presidente Michel Temer em 09/09 .

Outro prov�vel tema do presidente brasileiro ser� a defesa da liberdade de express�o de lideran�as da direita global, que ele acredita estarem sendo silenciadas pelas grandes empresas tecnol�gicas do Vale do Sil�cio, como Twitter e Facebook. O tema foi um dos que animaram a milit�ncia bolsonarista no 7 de Setembro. O assunto foi alvo de uma Medida Provis�ria assinada por Bolsonaro, mas que acabou devolvida ao Planalto pelo presidente do Senado, Rodrigo Pacheco. A mesma medida tamb�m havia sido barrada em decis�o da ministra do STF Rosa Weber. Neste domingo, 19/09, o governo anunciou que enviaria um projeto de lei ao Congresso com teor semelhante ao da MP derrubada.
Bolsonaro chegou a Nova York no fim da tarde deste domingo. Em frente ao hotel do presidente, cerca de dez pessoas protestavam contra o marco temporal e chamavam o mandat�rio de "criminoso" e "genocida". Bolsonaro, no entanto, n�o viu o protesto porque entrou no hotel por uma porta secund�ria.
O discurso do brasileiro, que abre a 76ª Assembleia Geral da ONU, ser� na manh� da pr�xima ter�a, 21. Al�m da fala, o presidente tamb�m se encontrar� com o primeiro-ministro brit�nico, Boris Johnson, e com o presidente da Pol�nia, Andrezj Duda. Com ambos, o presidente brasileiro tem afinidades ideol�gicas.
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