O Minist�rio P�blico do Rio apontou ind�cios de que o vereador Carlos Bolsonaro (Republicanos) era o "benefici�rio final" de uma organiza��o criminosa suspeita de desviar sal�rios de assessores em seu gabinete na C�mara Municipal. Nessa estrutura, Ana Cristina Siqueira Valle, ex-chefe de gabinete de Carlos e segunda ex-mulher do presidente Jair Bolsonaro, ocupava, segundo as apura��es da Promotoria, lugar de destaque. Ela tinha sete parentes em cargos de confian�a e acumulou patrim�nio relevante. Parte dele foi adquirido enquanto Ana vivia com Jair, que foi seu parceiro em algumas transa��es com im�veis, segundo levantamentos feitos em cart�rios. O presidente, por�m, n�o � alvo da apura��o.
"Na presente investiga��o, pelos elementos de provas colhidos j� � poss�vel vislumbrar ind�cios da exist�ncia de uma organiza��o criminosa caracterizada pela perman�ncia e estabilidade, formada desde o ano de 2001 por diversos assessores nomeados pelo Parlamentar (...)", escrevem os promotores. O ano citado por eles � o primeiro de Carlos na C�mara. Ele foi eleito pela primeira vez em 2000 e assumiu em 2001, aos 18 anos. Assim, o suposto esquema teria operado desde o in�cio de seus mandatos, que j� duram mais de 20 anos. At� 2008, Ana trabalhou no gabinete.
Como o
Estad�o
mostrou no ano passado, Carlos adquiriu um im�vel em dinheiro vivo por R$ 150 mil em 2003, cerca de dois anos e meio depois de entrar no Legislativo. Durante os dois primeiros mandatos dele, Ana Cristina estava em uni�o est�vel com Bolsonaro.. Passaram depois por um div�rcio conflituoso. Anos depois, se reaproximaram.
Para o MP, os dados j� levantados sobre transa��es imobili�rias e dep�sitos e saques em esp�cie geraram a necessidade de pedir a quebra de sigilo banc�rio e fiscal da ex-chefe de gabinete. Por meio das novas informa��es, ser� poss�vel conferir se a remunera��o de parentes de Ana, nomeados no gabinete de Carlos, foi para a conta dela, em suposto esquema de "rachadinha". Nos esquemas de rachadinha, servidores lotados em cargos de confian�a "devolvem" ao parlamentar a maior parte do que recebem como sal�rios.
Segundo o Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf) assinalou em relat�rio citado pelo MP no pedido de quebra de sigilo acolhido pela Justi�a em maio, Ana, em mar�o de 2011, depositou em sua pr�pria conta R$ 191,1 mil. Quatro meses depois, foram mais R$ 341,1 mil. Houve ainda saques que somaram R$ 1,1 milh�o por meio de uma empresa. Tamb�m chamou a aten��o do MP a atua��o de Ana no mercado imobili�rio. Em alguns neg�cios, houve uso de dinheiro vivo e valores supostamente subfaturados.
"Tanto a aquisi��o de im�veis por pagamento �em moeda corrente� quanto a aquisi��o de bens por pre�os subestimados sugerem que Ana Cristina Siqueira Valle se utilizasse de dinheiro em esp�cie em suas opera��es imobili�rias, de modo que haver� de se aferir a possibilidade de que a remunera��o da C�mara Municipal destinada a seus parentes tenha sido clandestinamente repassada em seu favor", apontam os promotores.
Ana Valle teve sete parentes nomeados
Na investiga��o os sete parentes de Ana, al�m dela pr�pria, tiveram sigilos quebrados. Uma prima, Marta Valle, segundo o MP, ficava a muito longe do Centro do Rio. Ela sempre morou em Juiz de Fora, em Minas Gerais, e trabalhava em uma creche local.
Outra informa��o do Coaf destaca em favor de Ana "saldo total de ativos custodiados" no valor de R$ 602,5 mil. Esse patrim�nio seria incompat�vel com o "indicador de renda" da ex-chefe de gabinete. A Promotoria tamb�m checa poss�veis irregularidades em quatro empresas ligadas a ela, "a refor�ar a hip�tese de que possam ter sido utilizadas para oculta��o do desvio de recursos p�blicos oriundos do esquema de �rachadinha� na C�mara de Vereadores."
Foi na Valle Ana Consultoria e Servi�os de Seguros que o MP constatou os saques que ultrapassaram R$ 1 milh�o. A informa��o foi revelada pelo jornal O Globo e confirmada pelo Estad�o. Foram feitos de modo parecido ao observado na investiga��o contra o senador Fl�vio Bolsonaro (Patriota-RJ). Ele j� foi denunciado por causa de supostas "rachadinhas" na Assembleia Legislativa. Deram-se de modo fragmentado. Foram 1.185 saques entre 2008, ano em que ela saiu do gabinete e se separou de Bolsonaro, e 2014. O valor m�dio por saque foi R$ 1 mil.
O Coaf alertou que a empresa tem os saques em esp�cie como principal forma de sa�da dos recursos. Isso dificultaria "a identifica��o da real utiliza��o dos valores". Aqui, o MP mostra que, enquanto Ana tem 90% da sociedade da empresa, os outros 10% pertencem a uma mulher que tamb�m teve familiares no gabinete do Carlos. Por isso, empresas da ex-mulher de Bolsonaro e pessoas envolvidas nelas entraram em um subn�cleo da investiga��o, vinculadas ao n�cleo da fam�lia Valle.
Adriana Teixeira da Silva Machado teve a m�e, Luci Teixeira da Silva, nomeada no gabinete durante dois anos. E seu irm�o, Luiz Claudio Teixeira da Silva, trabalhou para Fl�vio Bolsonaro.
"Tais v�nculos, associados � expressiva movimenta��o de dinheiro em esp�cie na conta da Valle Ana Consultoria, sugerem a possibilidade de que Ana Cristina Siqueira Valle possa ter indicado parentes de sua s�cia para atuarem como �funcion�rios fantasmas�, de modo a viabilizar o desvio dos recursos p�blicos destinados � sua remunera��o (...)", afirma o MP.
Seis fam�lias s�o suspeitas de operar rachadinha
O MP acredita que a suposta organiza��o criminosa dedicada � "rachadinha" era integrada por seis n�cleos - na verdade, fam�lias. Al�m de Carlos, outras 26 pessoas tiveram os sigilos banc�rio e fiscal quebrados por ordem da Justi�a, em maio. Segundo os promotores, o filho do presidente teria usado o esquema para cometer o crime de peculato (desvio de dinheiro p�blico por servidor), "cuja pena m�xima supera quatro anos".
O primeiro e mais detalhado dos n�cleos envolve Ana e seus sete parentes que passaram pelo gabinete de Carlos. As demais fam�lias t�m os sobrenomes G�es, Martins, Gerbatim, Fernandes e Duarte. Em todos os casos, h� suspeitas de nomea��es de "fantasmas". O caso dos Gerbatim, por exemplo, � embasado por uma reportagem do Estad�o. Ela mostrou que eles nunca haviam emitido crach� funcional na C�mara. M�rcio e Claudionor s�o parentes de Fabr�cio Queiroz. Ele foi denunciado como operador das "rachadinhas" em outro gabinete do cl� presidencial. Foi na assessoria do senador Fl�vio Bolsonaro (Patriota-RJ) quando ele era deputado estadual no Rio.
H� outras situa��es mais curiosas. Como a de uma ex-assessora, Nadir Barbosa G�es, que recebeu parcelas de R$ 187,8 do Bolsa Fam�lia por dois meses, apesar de ter sal�rio de R$ 10,1 mil no mesmo per�odo. Foi entre outubro e dezembro de 2018. O benef�cio social, explicou o MP, seria desnecess�rio "caso o valor da remunera��o fosse efetivamente destinado para o sustento da ex-assessora e de sua fam�lia."
Outros exemplos parecidos exp�em a discrep�ncia entre os sal�rios oficiais de assessores e suas reais condi��es de vida. Juciara da Concei��o Raimundo, por exemplo, do n�cleo da fam�lia Fernandes - ligada ao chefe de gabinete Jorge Luiz Fernandes -, teve remunera��o m�dia de mais de R$ 8 mil por mais de 11 anos. Enquanto isso, mantinha como endere�o uma casa pobre numa favela de Cordovil, zona norte do Rio, A moradia dividia espa�o com uma oficina mec�nica.
"O objetivo da investiga��o n�o � devassar a esfera de intimidade dos investigados, mas sim apurar a efetiva destina��o dos recursos p�blicos desviados e tra�ar o percurso do dinheiro, buscando desmascarar transa��es banc�rias e imobili�rias praticadas para lavar o dinheiro il�cito e, ao fim da an�lise dos dados financeiros, identificar todos os integrantes da organiza��o criminosa e promover a efetiva repara��o dos danos causados ao er�rio estadual", afirma o MP no pedido de quebra de sigilo. Assinado no dia 5 de maio, o documento teve quase todas as suas solicita��es acolhidas pela Justi�a no dia 28 do mesmo m�s.
Defesa
Procuradas, as defesas de Ana Cristina Valle e Carlos Bolsonaro n�o se posicionaram at� o fechamento desta reportagem. Em outras ocasi�es, o vereador negou as acusa��es iniciais feitas pelo MP.
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POL�TICA
MP aponta Carlos Bolsonaro como �benefici�rio final� de �organiza��o criminosa�
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