
Enquanto todos esses benef�cios eram colhidos, a fertilidade da popula��o de baixa renda diminuiu - mostrando que uma das ideias difundidas inicialmente para atacar o programa, a de que ele seria um incentivo para que fam�lias buscassem ter mais filhos para receberem mais, n�o tinha fundamento.
E a maior parte da primeira leva de benefici�rios deixou o programa, encontrando uma "porta de sa�da", conforme reportagem recente do jornal O Estado de S. Paulo.
Embora o programa necessitasse de ajustes - como ser ampliado em n�mero de benefici�rios e valor dos benef�cios, al�m de ser reajustado periodicamente como os sal�rios, para que seus benefici�rios n�o fossem prejudicados pela infla��o -, os resultado positivos s�o vis�veis.
Eles foram reconhecidos internacionalmente ao longo dos anos e constatados nos mais de 19 mil estudos sobre o programa registrados da Plataforma Lattes do CNPq (Conselho Nacional de Desenvolvimento Cient�fico e Tecnol�gico).
'18 anos de hist�ria desperdi�ados'
"Sabe quantos desses estudos foram usados para embasar a extin��o do Bolsa fam�lia? ZERO", lamentou em uma rede social a economista Tereza Campello, que foi ministra do Desenvolvimento Social e Combate � Fome durante o governo Dilma Rousseff (PT).
"S�o 18 anos de uma hist�ria de sucesso desperdi�ados", acrescentou Campello.
O Bolsa Fam�lia foi revogado pela Medida Provis�ria que criou o Aux�lio Brasil (MP 1.061/2021), publicada no Di�rio Oficial da Uni�o em 10 de agosto. A MP passou a valer imediatamente, mas ainda ter� que ser votada pelo Congresso em at� 120 dias para que o novo programa se torne definitivo.
O Aux�lio Brasil � a tentativa do presidente Jair Bolsonaro (sem partido) de imprimir uma marca pr�pria na assist�ncia social, apagando — �s v�speras das elei��es de 2022 — o nome fortemente associado �s gest�es petistas.
Nesta sexta-feira (29/10), os benefici�rios do Bolsa Fam�lia fizeram o �ltimo saque de valores do programa.
A partir de novembro, h� uma grande incerteza sobre o que vai acontecer com essa parcela da popula��o, j� que o Aux�lio Emergencial tamb�m chegou ao fim agora em outubro e o Aux�lio Brasil ainda n�o tem fonte de receitas definida, pois o Congresso n�o votou essa semana a PEC dos Precat�rios - esperan�a do governo Bolsonaro para abrir espa�o no teto de gastos para bancar o novo programa.
Enquanto o pa�s aguarda uma solu��o para a assist�ncia social aos mais vulner�veis, em meio ao avan�o da fome e da infla��o, relembre oito resultados do Bolsa Fam�lia, que chega ao fim ap�s 18 anos.
1) 3,4 milh�es de pessoas fora da pobreza extrema

O Bolsa Fam�lia foi criado em 2003, durante o primeiro mandato de Luiz In�cio Lula da Silva (PT), e tornou-se lei no ano seguinte.
O programa tinha como p�blico alvo todas as fam�lias com renda por pessoa de at� R$ 89 por m�s, consideradas em situa��o de extrema pobreza, ou com renda at� R$ 178 mensais (em situa��o de pobreza) com crian�as ou adolescentes at� 17 anos.
Com condicionantes como a perman�ncia das crian�as na escola, o acompanhamento de sa�de das gestantes e a vacina��o em dia, o programa teve como objetivo "quebrar o ciclo geracional da pobreza", isto �, a tend�ncia de os filhos das pessoas pobres acabarem vivendo na mesma pobreza em que seus pais.
Estudo publicado pelo Ipea (Instituto de Pesquisa Econ�mica Aplicada) em 2019, constatou o resultado positivo do programa em tirar fam�lias da situa��o de pobreza e pobreza extrema.
Segundo a pesquisa, em 2017, mais de 3,4 milh�es de pessoas haviam deixado a pobreza extrema por causa do Bolsa Fam�lia, e 3,2 milh�es passaram acima da linha de pobreza gra�as ao programa.
Ainda assim, alertavam os pesquisadores, 64% dos benefici�rios continuavam em situa��o de extrema pobreza, um resultado do baixo valor do benef�cio - que em 2017, era de em m�dia R$ 180 e, atualmente, passados quatro anos e muita infla��o, estava ainda em R$ 190.
2) Redu��o de 16% da mortalidade infantil
Um estudo publicado em setembro deste ano na revista cient�fica PLOS Medicine, liderado pelas pesquisadoras Dandara Ramos e N�vea Bispo da Silva, analisou uma amostra de mais de 6 milh�es de crian�as com idades abaixo de 5 anos, entre 2006 e 2015.
Comparando fam�lias benefici�rias do Bolsa Fam�lia com outras fora do programa, as pesquisadoras constataram que o programa de transfer�ncia de renda reduziu em 16% a mortalidade de crian�as de 1 a 4 anos.
O efeito foi ainda mais significativo para fam�lias com m�es negras e nos munic�pios mais pobres, onde a redu��o chegou a 26% e 28%, respectivamente.
"Os resultados refor�am a evid�ncia de que programas como o Bolsa Fam�lia, de efic�cia j� comprovada para a redu��o da pobreza, tamb�m t�m grande potencial para melhorar a sa�de e a sobreviv�ncia infantil", destacaram as pesquisadoras, no estudo.
3) Aumento da participa��o escolar feminina

O Bolsa Fam�lia foi criado em 2003 com uma condicionante de frequ�ncia escolar para crian�as entre 6 e 15 anos. Em 2008, um programa complementar foi criado (Benef�cio Vari�vel Jovem) para contemplar jovens entre 16 e 17 anos.
Pelas regras, a frequ�ncia escolar deveria ser de pelo menos 85% das aulas para crian�as e adolescentes de 6 a 15 anos e de 75% para jovens de 16 e 17 anos. O cumprimento das condicionantes dava aos participantes do programa um valor adicional no benef�cio.
Um estudo publicado em 2015 no peri�dico cient�fico World Development constatou que o Bolsa Fam�lia teve resultados relevantes para o avan�o da educa��o feminina.
Analisando dados de mais de 11 mil domic�lios entre 2005 e 2009, os pesquisadores constataram que o programa aumentou a participa��o escolar das meninas em 8 pontos percentuais e a progress�o entre s�ries (quando o aluno passa de uma s�rie escolar para a seguinte) em 10 pontos percentuais. N�o foram encontrados resultados significativos para os meninos.
Para os pesquisadores, esse resultado talvez seja explicado pela menor depend�ncia das m�es benefici�rias do Bolsa Fam�lia do trabalho dom�stico de suas filhas.
"� poss�vel que a redu��o no tempo gasto pelas meninas com trabalho dom�stico permita a elas mais tempo para estudar", avalia o grupo liderado pelo pesquisador Alan de Brauw, do Instituto de Pesquisa em Pol�tica Alimentar Internacional de Washington, nos Estados Unidos.
4) Redu��o da desigualdade regional
O Bolsa Fam�lia foi respons�vel por 14,8% da redu��o da desigualdade regional no Brasil entre 1995 e 2006, constatou um outro estudo produzido pelo Ipea, publicado em 2013.
O papel do programa na redu��o da desigualdade foi maior do que o do BPC (Benef�cio de Presta��o Continuada, sal�rio m�nimo pago a idosos e pessoas com defici�ncia de baixa renda), que contribuiu para a redu��o das diferen�as regionais de renda em 8,9%.
O importante papel do Bolsa Fam�lia na redu��o da desigualdade regional se deve ao maior n�mero de benefici�rios nas regi�es Norte e Nordeste, as mais pobres do pa�s.
"Por exemplo, o valor recebido pelo Estado do Maranh�o equivalia a 1,8 e 4,7 vezes os valores recebidos, respectivamente, pelo Distrito Federal e S�o Paulo. Em termos m�dios, o valor recebido pelos dez estados mais pobres � quase o dobro (1,9 vez) daquele recebido pelos dez estados mais ricos", exemplificam os pesquisadores do Ipea.
"Do ponto de vista das pol�ticas de combate � desigualdade regional (...), � interessante notar que, embora n�o sejam diretamente pol�ticas regionais e espaciais, as pol�ticas sociais de transfer�ncias de renda trazem efeitos consider�veis sobre a distribui��o regional de renda", concluem Raul da Mota Silveira Neto e Carlos Roberto Azzon, autores do estudo.
5) Melhora dos indicadores de inseguran�a alimentar
As fam�lias atendidas por programas de transfer�ncia de renda tendem a gastar uma parcela importante do benef�cio com a compra de alimentos, principalmente para as crian�as.
Em 2012, um estudo revisou outras dez pesquisas anteriores sobre a rela��o entre o recebimento do Bolsa Fam�lia e a alimenta��o das pessoas, constatando que em cinco deles a conclus�o foi que o programa tem impacto positivo na seguran�a alimentar e nutricional.
Um desses estudos foi realizado pelo Ibase (Instituto Brasileiro de An�lises Sociais e Econ�micas), e ouviu 5 mil benefici�rios, de 229 munic�pios brasileiros em 2007.
"87% relataram gastar o benef�cio recebido com a compra de alimentos. Questionados sobre o que ocorreu com a alimenta��o da fam�lia ap�s o recebimento do benef�cio, mais de 70% responderam que aumentou a quantidade e a variedade de alimentos consumidos e 63% responderam que passaram a comprar mais alimentos preferidos pelas crian�as", encontrou a pesquisa do Ibase, segundo a revis�o publicada na Revista Panamericana de Salud P�blica .
No entanto, um outro efeito n�o t�o positivo tamb�m foi encontrado: tr�s dos estudos revelaram que as fam�lias gastaram mais com alimentos cal�ricos e de baixo valor nutricional, como biscoitos, alimentos industrializados e a�ucarados.
"O Programa Bolsa Fam�lia pode auxiliar na promo��o da seguran�a alimentar e nutricional das fam�lias benefici�rias, ao propiciar �s popula��es em vulnerabilidade social maior capacidade de acesso aos alimentos", observam os pesquisadores, ponderando, por�m, que o programa poderia ter melhor efeito se combinado com a��es de incentivo � alimenta��o saud�vel.
6) Efeito multiplicador no PIB

Cada R$ 1 gasto com o Bolsa Fam�lia gera um impacto de R$ 1,78 no PIB (Produto Interno Bruto) brasileiro, mostrou estudo realizado pelos pesquisadores Marcelo Neri, Fabio Monteiro Vaz e Pedro Herculano de Souza.
O efeito multiplicador de 1,78 � maior do que o de todas as demais formas de transfer�ncia de renda, constaram os pesquisadores, como BPC (1,19), seguro-desemprego (1,06) e abono salarial (1,06), por exemplo.
"Os efeitos multiplicadores s�o maiores quanto mais focalizadas s�o as transfer�ncias nos mais pobres, porque estas fam�lias possuem maior propens�o marginal a consumir", explicam os pesquisadores.
Quer dizer: as fam�lias pobres s� n�o consomem mais porque n�o t�m renda para isso. Assim, quando recebem mais dinheiro, tendem a consumir o valor recebido, movimentando a economia.
7) Queda da fecundidade feminina
Apesar do argumento persistente de que o Bolsa Fam�lia incentivaria as mulheres a terem mais filhos, a fecundidade das mulheres de baixa renda diminuiu de 5,5 filhos em 1991, para 4,6 filhos em 2000 e 3,3 filhos em 2010, segundo outro estudo publicado pelo Ipea, da autoria de Jos� Eust�quio Diniz Alves e Suzana Cavenaghi.
Assim, embora n�o se possa atribuir a queda diretamente aos efeitos do Bolsa Fam�lia, fica evidente que o programa n�o alterou a trajet�ria de decl�nio da taxa de fecundidade brasileira, iniciada na d�cada de 1960.
"As mulheres que fazem parte do maior contingente de renda coberto pelo Programa Bolsa Fam�lia apresentaram uma redu��o do n�mero m�dio de filhos tanto na �ltima d�cada do s�culo 20, quanto na primeira d�cada do s�culo 21", observam os pesquisadores.
"Ou seja, a fecundidade da popula��o mais pobre do Brasil vinha caindo antes da implanta��o do Programa Bolsa Fam�lia e continuou a cair depois da amplia��o da cobertura da transfer�ncia de renda."
8) 69% acharam a "porta de sa�da"
Na quinta-feira (28/10), o presidente Jair Bolsonaro disse, em entrevista ao apresentador Sik�ra Jr., da Rede TV , que quem recebe Bolsa Fam�lia "n�o sabe fazer quase nada".
"N�o tem como tirar o Bolsa Fam�lia do pessoal, como alguns querem. S�o 17 milh�es de pessoas que n�o t�m como ir mais para o mercado de trabalho. Com todo o respeito, n�o sabem fazer quase nada. O que a juventude aprendeu com quase 14 anos de PT, tendo o ministro [Fernando] Haddad l� na educa��o?", disse Bolsonaro.
No entanto, levantamento realizado pelo jornal O Estado de S. Paulo revelou que dos 1,15 milh�o de contemplados na primeira leva do Bolsa Fam�lia, em outubro de 2003, 795 mil - ou 69% do total - conseguiram deixar o programa.
A reportagem conta, por exemplo, o caso de Simara Martins, de 34 anos e filha de uma ex-benefici�ria do Bolsa Fam�lia.
Vanilda, a m�e de Simara, come�ou a vender pamonha com os R$ 110 recebidos pela fam�lia. Com a renda do neg�cio e a entrada das filhas no mercado de trabalho, conseguiu sair do programa, seis anos ap�s ingressar nele.
Simara hoje � dona de uma confec��o de roupas de praia e emprega sete pessoas. Ela � um exemplo dos resultados positivos do Bolsa Fam�lia em interromper o ciclo de pobreza intergeracional.
J� assistiu aos nossos novos v�deos no YouTube ? Inscreva-se no nosso canal!