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Estado de Minas POL�TICA

Corre��o: Cidades campe�s de verbas secretas s�o ligadas a l�deres do Congresso


14/12/2021 21:03

Att senhores assinantes,

A primeira vers�o deste texto atribu�a � cidade de Pouso Alegre (MG) empenhos das emendas de relator no valor de R$ 237,2 milh�es, o que a colocaria no topo da lista dos munic�pios com mais recursos recebidos. A informa��o, no entanto, estava incorreta, e o valor efetivamente destinado ao munic�pio mineiro � menor. Do montante, R$ 132 milh�es se referem � compra de maquin�rio pesado por parte da Companhia de Desenvolvimento do Vale do S�o Francisco (Codevasf) junto � empresa de origem chinesa XCMG, sediada na cidade; os bens foram destinados a outras localidades. Segue texto corrigido e ampliado:


Falta quase tudo em Momba�a, no sert�o cearense. Com uma economia baseada na agricultura familiar, o munic�pio do semi�rido enfrenta problemas de infraestrutura e de abastecimento de �gua. Mas n�o precisava ser assim: Momba�a est� a apenas 79 km de Tau�, uma das campe�s nacionais das emendas de relator (c�digo RP-9), verbas que est�o na base do esquema do or�amento secreto revelado pelo Estad�o. A Uni�o j� empenhou R$ 151,4 milh�es dessas verbas para Tau�, mas s� R$ 2,9 milh�es para Momba�a. � como se o governo destinasse R$ 2.606,14 para cada morador de Tau�, mas apenas R$ 67,12 para os vizinhos.

Ao contr�rio do que disseram l�deres do Congresso ao Supremo Tribunal Federal (STF), a distribui��o do or�amento secreto n�o prioriza servi�os essenciais, mas a conveni�ncia pol�tica de alguns parlamentares. Cidades que s�o base eleitoral de aliados do Pal�cio do Planalto ou de parlamentares em posi��es influentes no Congresso recebem centenas de milh�es de reais, enquanto munic�pios pr�ximos ou vizinhos ficam � m�ngua. Juntas, as tr�s cidades campe�s em verbas do or�amento secreto que n�o s�o capitais estaduais receberam empenhos nominais de pouco mais de R$ 493,8 milh�es em 2020 e 2021. � mais que os 1.940 munic�pios da base da pir�mide, somados.

As cidades que n�o s�o capitais mais beneficiadas pelas emendas at� agora s�o Petrolina (PE), R$ 195,6 milh�es; Tau� (CE), R$ 151,5 milh�es, e Santana (AP), R$ 146,6 milh�es. Em comum, todas t�m em suas proximidades lugares que receberam pouco ou mesmo nada das emendas de relator. S�o ainda redutos eleitorais do l�der do governo no Senado, Fernando Bezerra (MDB-PE); do relator-geral do or�amento de 2020, Domingos Neto (PSD-CE); e do ex-presidente do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP). O princ�pio da igualdade, ess�ncia da Constitui��o, n�o � levado em conta na distribui��o dos repasses.

A partir de ter�a-feira, o plen�rio virtual do Supremo Tribunal Federal (STF) deve analisar decis�o da ministra Rosa Weber que decidiu liberar os repasses do or�amento secreto. Ela aceitou a vers�o dos presidentes da C�mara, Arthur Lira (Progressistas-AL), e do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), de que a suspens�o dos recursos, que tinha sido aprovada por 8 a 2 pelo plen�rio em novembro, era um "potencial" risco aos servi�os de Sa�de e Educa��o. N�o h� garantia alguma de que esse dinheiro v� para �reas essenciais. A distribui��o das emendas n�o atende crit�rios t�cnicos, muito pelo contr�rio.

Ao liberar os repasses no dia 6, Rosa Weber citou dados levantados a pedido da c�pula do Congresso ao afirmar que as emendas de relator beneficiaram 86,9% dos munic�pios brasileiros - o que, para a ministra, seria suficiente para demonstrar o "equil�brio" na distribui��o das verbas. N�o � bem assim. Na verdade, dos 5.570 munic�pios, mais da metade (2.564) receberam valores irris�rios, de menos de R$ 1 milh�o. Juntos, esses 2,5 mil munic�pios da parte de baixo da tabela tiveram pouco mais de R$ 1 bilh�o empenhados - os demais munic�pios ficaram com os R$ 29 bilh�es restantes.

Momba�a e Tau� diferem no recebimento das verbas, mas t�m condi��es econ�micas e sociais parecidas. Momba�a, de 43 mil habitantes, e Tau�, de 58 mil, t�m �ndice de Desenvolvimento Humano (IDH) m�dio, uma com 0,604 e a outra com 0,633. Pouco mais da metade da popula��o dos dois munic�pios ganha at� meio sal�rio m�nimo.

O prefeito de Momba�a, Orlando Filho (MDB), trabalha para desenvolver as cadeias produtivas do gado leiteiro e do mel. Ele diz que o trabalho poderia ser mais efetivo com o apoio do Minist�rio do Desenvolvimento Regional e do Minist�rio da Agricultura. "Eu n�o gosto muito de falar de problemas e de dificuldades, porque aqui tem todas, t� entendendo? Tem falta de dinheiro, o povo � carente, a gente faz da tripa o cora��o para conseguir entregar a melhor estrutura para os produtores (rurais)", disse. "Mas, obviamente, se tivesse uma m�quina perfuratriz, por exemplo, ajudaria a solucionar o problema de falta de �gua."

Na pol�tica local do Sert�o dos Inhamuns, onde est�o Tau� e Momba�a, Orlando Filho faz parte do grupo pol�tico oposto ao do relator do Or�amento de 2020, o deputado federal Domingos Neto (PSD-CE). Al�m de ser a terra natal do relator, Tau� � governada pela m�e dele, Patr�cia Aguiar (PSD). "Os problemas s�o todos os imagin�veis. Temos que usar a intelig�ncia para tentar superar um por um", diz Orlando Filho. Dos R$ 2,9 milh�es recebidos por Momba�a at� agora, a maior parte (R$ 2,5 milh�es) foi para a Sa�de.

Outros pol�ticos com votos na regi�o tamb�m reclamam de n�o conseguir resolver problemas em suas bases sem usar as emendas de relator. "No ano passado, os moradores de Canind� (CE) estavam reclamando de falta de �gua. Fui falar com o (ent�o) presidente da Funasa (Funda��o Nacional de Sa�de), o (coronel) Geovanne (Gomes da Silva). E ele me disse que n�o tinha como. N�o tinha verba. E sugeriu que eu procurasse o relator-geral, Domingos Netto, que tinha R$ 100 milh�es para obras", diz o deputado Danilo Forte (PSDB-CE).

Em Catarina (CE), a apenas 48 km da cidade de Patr�cia Aguiar e Domingos Neto, as emendas RP-9 levaram R$ 562 mil desde 2020, cerca de 262 vezes menos do que em Tau�. � como se cada morador de Catarina recebesse R$ 29,99 da Uni�o, ante R$ 2,6 mil de Tau�. O munic�pio de 18 mil habitantes tamb�m tem indicadores econ�micos e sociais piores que Momba�a, com um IDH de 0.580, considerado baixo. Casos como este n�o seguem a Lei de Diretrizes Or�ament�rias (LDO): no art. 86, ela determina que as transfer�ncias levem em conta os "indicadores socioecon�micos da popula��o beneficiada".

O topo do ranking de cidades com mais verba do RP-9 � de Petrolina (PE). A cidade � a terra natal e base pol�tica do senador Fernando Bezerra Coelho e tem por prefeito o filho dele, Miguel Coelho. Entre outras melhorias, o dinheiro do RP-9 foi usado na cidade para reformar o Centro de Conven��es Nilo Coelho - o nome homenageia a mem�ria do tio do l�der governista, que governou Pernambuco de 1967 a 1971. Vizinhas a Petrolina, est�o cidades bem menos afortunadas em termos de recursos da RP-9, como Afr�nio (PE), com apenas 3,1 milh�es empenhados; e Casa Nova (R$ 2,7 milh�es).

Fecha a lista dos munic�pios com mais verbas das emendas de relator a cidades de Santana (AP), com R$ 146,6 milh�es empenhados em 2020 e 2021, respectivamente. O munic�pio � parte da zona metropolitana de Macap� (AP), reduto pol�tico do ex-presidente do Senado Davi Alcolumbre (DEM-AP), um dos congressistas que mais indicou verbas do or�amento secreto - em Macap�, os empenhos somam R$ 330,5 milh�es, colocando-a � frente de outras capitais bem mais populosas, como Porto Alegre (RS) e Curitiba (PR).

Se o levantamento levasse em conta somente o ano de 2021, a cidade de Arapiraca (AL) tamb�m ficaria entre as campe�s, com R$ 69,9 milh�es empenhados. A cidade � reduto eleitoral do presidente da C�mara, Arthur Lira (Progressistas-AL).

Do outro lado do mapa do Brasil, Pouso Alegre (MG), de 154 mil habitantes e IDH alto, de 0774, aparece nominalmente como a cidade brasileira com mais recursos empenhados (isto �, reservados) das emendas de relator, excetuando as capitais de Estados. A cidade aparece como destinat�ria de empenhos na ordem de R$ 237,2 milh�es, o que a colocaria no topo da lista das campe�s do RP-9. Na verdade, por�m, a cidade n�o ficou com este volume de recursos. Ao menos R$ 132 milh�es foram empenhados pela Companhia de Desenvolvimento do Vale do S�o Francisco (Codevasf) foram para a compra de maquin�rio em uma empresa sediada na cidade, a XCMG, e acabaram lan�ados nas notas de empenho como sendo executados na cidade mineira.

"No �mbito da Codevasf, os valores associados ao munic�pio de Pouso Alegre guardam rela��o com contratos firmados pela Companhia com empresa fabricante de m�quinas (como motoniveladoras e p�s-carregadeiras), sediada nesse munic�pio, para fornecimento de bens que s�o empregados em projetos e a��es de desenvolvimento regional de diferentes unidades da federa��o", disse a Codevasf, em nota.

Mesmo excetuando as compras da estatal, a cidade de Pouso Alegre ainda figura em notas de empenho que somam R$ 105,1 milh�es. � muito mais que a cidade vizinha de Po�os de Caldas (MG), com apenas R$ 1,5 milh�o. Como n�o transpar�ncia sobre qual pol�tico indicou o qu�, n�o � poss�vel saber quem destinou recursos para as duas cidades.

Um dos principais defensores da continuidade do or�amento secreto � o presidente do Senado. Ele � aliado do prefeito de Pouso Alegre, Rafael Sim�es (DEM), e esteve na cidade no dia 19 de novembro para o lan�amento da pedra fundamental do novo hospital oncol�gico, que ter� mais de 11 mil metros quadrados de �rea constru�da e 100 novos leitos - embora a obra ainda n�o tenha recebido recursos das emendas de relator.

Ao Estad�o, Pacheco negou ter direcionado verbas das emendas de relator para Pouso Alegre. "Eu sempre cuidei de ter propor��o nisso (destina��o das emendas). Como Minas s�o 853 munic�pios, eu tenho essa preocupa��o de n�o gerar distor��es", disse ele. "Ali�s, a minha terra mesmo, que � Passos (MG), nunca foi privilegiada em rela��o a outros munic�pios", disse o presidente do Senado.

A reportagem procurou Domingos Neto, Davi Alcolumbre e Fernando Bezerra Coelho para coment�rios, mas n�o obteve resposta de nenhum dos parlamentares citados at� a publica��o desta reportagem.

Economista e fundador da ONG Contas Abertas, Gil Castello Branco explica que a concentra��o de recursos em poucas cidades se deve ao excesso de programa��es gen�ricas no Or�amento - isto �, quando a Lei Or�ament�ria n�o destina as verbas para um local espec�fico, deixando que isso seja feito apenas na hora do empenho do dinheiro. "O or�amento � aprovado com programa��es gen�ricas e, depois, isso passa a ser disputado para saber quem ser�o aqueles que far�o as indica��es", diz Castello Branco.

O problema j� ocorria quando as verbas discricion�rias (que podem ser usadas livremente) estavam sob poder do Executivo, mas se agravou com as emendas de relator. "O que acontece? Voc� distorce as pol�ticas p�blicas ao liberar desse modo uma verba bilion�ria. O dinheiro passa a ser destinado com crit�rios meramente pol�ticos, pessoais ou partid�rios." A solu��o do problema, segundo ele, � minimizar a quantidade de "programa��es gen�ricas". "A LDO j� postula assim, mas isso tem sido letra morta, pois n�o h� nenhum interesse do Legislativo nem do Executivo para que seja diferente."

At� o dia 5 de novembro, quando uma decis�o do Supremo Tribunal Federal determinou a suspens�o dos pagamentos das emendas de relator, posteriormente revista por uma liminar concedida pela ministra Rosa Weber, o Executivo federal tinha empenhado R$ 30,7 bilh�es na rubrica, nos Or�amentos de 2020 e 2021, dos quais R$ 12,1 bilh�es j� haviam sido pagos. Outros R$ 3,6 bilh�es em restos a pagar, do exerc�cio de 2020, tamb�m j� tinham sido quitados.


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