
Exalta��es � emissora se somaram ao coro de "Globo lixo" e aos ataques a ministros do STF (Supremo Tribunal Federal) e ao sistema eleitoral no evento em apoio ao candidato � reelei��o.
Ser apontada nas ruas como a voz dos seguidores de Jair Bolsonaro (PL) � o �pice da guinada da Jovem Pan, de 80 anos, que a levou a um crescimento exponencial de audi�ncia, aumento de verbas recebidas do governo federal e patroc�nios de empresas comandadas por apoiadores do presidente da Rep�blica.
O ano de 2014 marca o come�o da mudan�a na r�dio paulistana. Ant�nio Augusto Amaral de Carvalho Filho, o Tutinha, assumiu o comando do grupo no lugar do pai, e a empresa estreou o Pingos nos Is.O programa era apresentado pelo jornalista Reinaldo Azevedo, colunista da Folha. O sucesso veio rapidamente, e, em outubro de 2014, a audi�ncia chegou a 87 mil ouvintes por minuto na Grande SP, levando o programa ao topo. O ponto de inflex�o no r�dio, plataforma-m�e do grupo, foi em 2015, quando passou a galgar postos na pesquisa de audi�ncia do segmento, feita pela Kantar Ibope.
Reinaldo deixou a bancada em 2017, ap�s a procuradora-geral da Rep�blica divulgar conversas dele com Andrea Neves, irm� do ent�o senador A�cio Neves (PSDB). Antes de sua sa�da, a emissora j� havia pulado do terceiro para o primeiro lugar no setor de not�cias em S�o Paulo, posi��o que mant�m at� hoje.
�s 18h, hor�rio nobre do r�dio, na faixa ocupada pelo Pingos nos Is, a Jovem Pan ultrapassa os 100 mil ouvintes por minuto, 40% a mais do que a segunda colocada, a CBN, do Grupo Globo. S�o 2,8 milh�es de pessoas na capital paulista por m�s, tamb�m segundo a Kantar Ibope.
O crescimento levou concorrentes a realizarem pesquisas qualitativas. Resultados indicaram que a Jovem Pan tem um ouvinte fiel que n�o consome outras fontes. Tem a r�dio como �nica m�dia tradicional, n�o l� jornal, diz evitar TV e se informa majoritariamente em redes sociais e grupos de WhatsApp.
Assim como outras atra��es, o Pingos nos Is passou a ser retransmitido na TV do grupo, inaugurada no segundo semestre de 2021, e no canal de YouTube, um dos mais populares entre ve�culos de imprensa.
Apresentada por Vitor Brown, que dita as chamadas jornal�sticas, a bancada reveza comentaristas, mas mant�m o n�cleo formado por Augusto Nunes, Ana Paula Henkel, Guilherme Fiuza e Jos� Maria Trindade.
Com endosso a pautas do bolsonarismo, como suspeitas sobre o sistema eleitoral e cr�ticas � soltura de Lula e ao PT devido a acusa��es de corrup��o, o programa lidera o crescimento no YouTube entre os canais com vi�s de direita e de direita radical durante o mandato de Bolsonaro.
Levantamento da Novelo Data, consultoria que monitora a plataforma, mostra que o Pingo nos Is quintuplicou a base de seguidores em dois anos. Perto de 5 milh�es de inscritos, a atra��o est� pr�xima de superar o canal da pr�pria Jovem Pan, que agrega conte�do de toda a programa��o. Em 2022, a audi�ncia m�dia do programa di�rio � de 809,3 mil visualiza��es no YouTube.
Um estudo do NetLab, da Universidade Federal do Rio de Janeiro, publicado pela Folha, indica que a plataforma tamb�m d� destaque � Jovem Pan a novos usu�rios: para 18 perfis com zero intera��o na rede, o YouTube recomendou v�deos da emissora a 10 deles.
Com base nisso, a coliga��o do PT entrou na quinta (14) com a��o no TSE (Tribunal Superior Eleitoral) pedindo explica��es ao YouTube sobre o caso e alegando que a Jovem Pan "tem evidente tend�ncia ideol�gica". O caso criou rusgas j� expostas ao vivo: uma queda brutal de audi�ncia no programa daquela noite levou apresentadores a sugerirem que houve censura por parte da empresa, sem explicitar como.
Al�m da audi�ncia pela internet, o programa usufrui da capilaridade de pequenas emissoras que transmitem no interior as duas horas de opini�es que muitas vezes casam com a expectativa do ouvinte.
A escolha dos termos dos comentaristas vem do dialeto bolsonarista. Lula � chamado de ex-presidi�rio, a amea�a democr�tica vem do "Judici�rio ativista" ou do "ativismo de toga" --n�o das ofensivas do presidente contra as urnas--, a m�dia tradicional � a "imprensa velha" e os apoiadores do presidente nas ruas s�o "jovens de bem", "mulheres honestas" e "patriotas em defesa da liberdade".
� Folha o CEO da Jovem Pan, Roberto Ara�jo, nega que a emissora apoie o presidente. "O Grupo Jovem Pan n�o se posiciona em defesa de figuras ou de partidos pol�ticos", afirmou ele, em entrevista por email.
O executivo diz ter uma rela��o institucional com Bolsonaro, "como ocorre com governadores, prefeitos e demais representantes do povo em qualquer um dos Poderes".
Para veicular campanhas do governo federal, as r�dios do grupo receberam cerca de R$ 2,2 milh�es em 2021. Foi o maior montante destinado a emissoras do tipo, 13% do total gasto em r�dios. A Bandeirantes, com R$ 1,6 milh�o, e as r�dios da Globo, com R$ 759 mil, vieram atr�s. O valor n�o inclui publicidade das estatais, como Caixa Econ�mica Federal, Petrobras e Banco do Brasil.
Em 2015, �ltimo ano completo do governo Dilma Rousseff (PT), a emissora recebeu R$ 1,9 milh�o (em valores corrigidos) de verba publicit�ria do governo federal. O montante representou 7% do total gasto na �poca, quase a metade do percentual do ano passado.
Na novata Jovem Pan News TV, uma campanha do Governo Fraterno, a��o da gest�o Bolsonaro para incentivar a doa��o de cestas de alimentos, rendeu R$ 368 mil em compra de espa�o comercial em 2022.
"Hoje, a verba p�blica representa a menor fatia do bolo da nossa receita, um sinal de que nossa transforma��o ocorreu como esperado", afirma Ara�jo. Ele acrescenta que o grupo tem sido cada vez mais procurado por "empresas privadas para projetos que fogem do modelo convencional de m�dia".
Profissionais do mercado publicit�rio, entretanto, relatam que a linha editorial adotada espantou anunciantes no in�cio do projeto. At� hoje, a empresa tem dificuldade de atrair as maiores companhias, que buscam elos com temas como diversidade e preserva��o ambiental.
Entre os anunciantes da Jovem Pan est�o empresas cujos donos s�o apoiadores do presidente. Marcas como Havan e Coco Bambu aparecem no espa�o comercial do r�dio e da TV. Os donos das redes de lojas, Luciano Hang, e de restaurantes, Afr�nio Barreira Filho, foram alvo de opera��o da Pol�cia Federal que investiga ataques �s institui��es e dissemina��o de fake news em grupo de WhatsApp.
"A Jovem Pan traz um jornalismo independente, coisa que nosso pa�s precisa atualmente", disse Ronald Aguiar, um dos s�cios do Coco Bambu, no anivers�rio da emissora.
Tamb�m s�o anunciantes o jornal Gazeta do Povo, a produtora de v�deos de direita Brasil Paralelo, o grupo Gocil, de Washington Cinel, e a Riachuelo, de Fl�vio Rocha --ambos os empres�rios j� declararam apoio a Bolsonaro.
No YouTube, o canal da Jovem Pan tem 5,6 milh�es de seguidores, � frente de Globo, Band, SBT e Record.
Os links para v�deos da emissora, em especial do Pingo nos Is, pipocam em grupos bolsonaristas de WhatsApp e de Telegram e ganham destaque como a voz jornal�stica em meio � cacofonia de youtubers de direita que improvisam est�dios em casa.
O Pingo nos Is transmite na �ntegra as lives do presidente, que j� afirmou ter apre�o pelo espa�o. Ao Flow Podcast Bolsonaro disse que o programa da Jovem Pan � o que ele acompanha e recomenda.
No 7 de Setembro na Paulista, entre os comentaristas in loco em meio � multid�o estavam Marco Ant�nio Costa, conhecido como "Superman do P�nico", Zoe Mart�nez e Carla Cecato. Somava-se ao grupo Adrilles Jorge, que chegou a ser demitido da r�dio por uma sinaliza��o associada ao nazismo, mas retornou antes de se licenciar do trabalho para disputar o cargo de deputado federal pelo PTB em S�o Paulo.
Ap�s o evento, os coment�rios foram publicados no YouTube em modo de celebra��o: "Escondidos com medo do povo, ministros do STF reagem ao 7 de Setembro", "Alexandre Garcia: Nunca vi um l�der mobilizar tanta gente como Bolsonaro", "Fiuza: Povo na rua � sinal de resultado positivo do governo Bolsonaro" e "Jos� Maria Trindade: Nunca vi nada igual, havia um mar de pessoas na Esplanada".
M�dia parceira do Google, como outros ve�culos de jornalismo, a emissora est� sujeita �s mesmas regras de qualquer canal e teve v�deos banidos do YouTube. Ao menos 45 conte�dos foram retirados da plataforma de v�deos nos dois �ltimos anos por infra��o �s pol�ticas da empresa, de acordo com a Novelo Data. Eram v�deos sobre Covid, vacina��o, Guerra da Ucr�nia e fraude eleitoral.
O �ltimo registro suspenso retransmitia uma live presidencial de julho de 2021, quando Bolsonaro levantou suspeitas infundadas sobre o sistema eleitoral. Na ocasi�o, admitiu n�o ter provas de fraude e dizia que "�bitos seriam evitados se n�o houvesse politiza��o da cloroquina e da ivermectina".
A primeira rea��o ap�s a fala foi de Augusto Nunes, que classificou a live de "reveladora". Naquele dia, Marcelo Mattos, que apresentava o programa, destacou que a audi�ncia chegava a 322 mil visualiza��es simult�neas, um recorde para o Pingo nos Is no YouTube at� ent�o.
A Folha procurou Augusto Nunes e outros jornalistas da r�dio, que preferiram n�o falar com a reportagem.
A menos de um m�s da elei��o, Bolsonaro foi sabatinado na Jovem Pan. A jornalista Amanda Klein questionou a compra de im�veis em dinheiro vivo por sua fam�lia. "Amanda, voc� � casada com uma pessoa que vota em mim. Eu n�o sei como � teu conv�vio na tua casa com ele" foi a resposta.
Depois, Bolsonaro disse que a profissional, ao fazer a pergunta, o rotulava de corrupto e estava sendo leviana. Amanda faz parte de uma minoria na r�dio que critica o presidente. Al�m dela, Guga Noblat, Diogo Schelp e F�bio Piperno participam de programas da casa e questionam a��es do governo.
Amanda foi lembrada no ato da Paulista. No carro de som, Tom� Abduch, l�der do movimento Nas Ruas, chegou a convocar o que chamou de "recado" � jornalista, mas depois retomou o microfone para pedir respeito, para que os manifestantes n�o se portassem como "petistas da direita".
"Ao presidente Tuta [Ant�nio Augusto Amaral de Carvalho Filho], a todos voc�s que s�o do jornalismo, que levam a mensagem para n�s, brasileiros, digo a voc�s que n�o vamos perder nosso pa�s", disse ele.
Ao fundo, os apoiadores gritavam o nome da emissora.