(none) || (none)
UAI
Publicidade

Estado de Minas ELEI��ES 2022

As hip�teses para explicar os votos de Bolsonaro que as pesquisas n�o previram

Diferen�a menor para Lula do que a apontada nas sondagens eleitorais pode ter diferentes explica��es - desde quest�es demogr�ficas ou metodol�gicas at� c�lculos feitos pelo eleitor no �ltimo minuto.


03/10/2022 14:14 - atualizado 03/10/2022 14:54


Fila de eleitores no Rio de Janeiro neste domingo, 2 de outubro
Eleitores no Rio no �ltimo domingo; diferen�a de votos entre Lula e Bolsonaro foi menor do que a prevista (foto: EPA)

A vota��o acima do previsto pelos institutos de pesquisas do presidente Jair Bolsonaro (PL) e de outros candidatos associados ao bolsonarismo gerou surpresa e debates.

Na v�spera do primeiro turno, as pesquisas Datafolha e Ipec mostravam uma vantagem de cerca de 14 pontos percentuais de Luiz In�cio Lula da Silva (PT) sobre Bolsonaro.


O Datafolha estimou em 36% o n�mero de votos v�lidos de Bolsonaro, e o Ipec, em 37%, o que daria, em uma conta simples, em torno de 42 milh�es dos 118,2 milh�es de votos v�lidos computados no �ltimo domingo (2/10) pelo Tribunal Superior Eleitoral.


Mas o atual presidente teve, na realidade, 51 milh�es de votos v�lidos, ou seja, 43,2%, acima da margem de erro das pesquisas, de dois pontos percentuais.

No rescaldo do primeiro turno, especialistas levantam hip�teses que - isoladamente ou em conjunto - podem ajudar a explicar as discrep�ncias.

Ao mesmo tempo, representantes dos institutos de pesquisa dizem que as sondagens captam o momento e n�o s�o uma previs�o de futuro.

Censo defasado

Retrato mais fiel da composi��o da popula��o brasileira, o Censo est� desatualizado: os dados consolidados mais recentes s�o de 2010. A coleta de dados atualizados pelo IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estat�stica) deveria ter acontecido em 2020, mas foi adiada duas vezes - por conta da pandemia e por falta de verbas - e s� come�ou em agosto de 2022.

E qual o impacto eleitoral disso? � que os institutos conduzem suas pesquisas de opini�o com base em amostras de recortes da popula��o - de renda, idade, classe social ou religi�o, por exemplo.


Lula ao lado da mulher, Janja, neste domingo
H� d�vidas quanto a quem poderia ser receptor de um eventual 'voto envergonhado' - Lula ou Bolsonaro (foto: Reuters)

Se essas amostras estat�sticas forem embasadas em conjuntos populacionais desatualizados, isso pode impactar o resultado das pesquisas eleitorais, segundo estat�sticos.

Os institutos de pesquisa, � claro, t�m ci�ncia das limita��es impostas pelo Censo e usam dados adicionais para calibrar suas amostragens - como os da Pesquisa Nacional de Amostra Domiciliar (Pnad) ou do Tribunal Superior Eleitoral.

Mesmo assim, analistas veem a possibilidade de certos grupos teoricamente mais alinhados a Bolsonaro estarem subestimados. Os evang�licos, por exemplo, eram 22% no Censo de 2010, mas pesquisas do Datafolha j� sinalizavam que esse p�blico havia subido para 31% da popula��o em 2019.

Mobiliza��o entre evang�licos

A campanha entre o eleitorado evang�lico na reta final, por sinal, pode ter feito diferen�a em favor de Bolsonaro, avaliou a brasilianista Amy Erica Smith, da Universidade Estadual de Iowa.

"� poss�vel que a campanha dentro das igrejas ou nas redes sociais direcionada aos fi�is evang�licos tenha tido um papel relevante nos resultados", disse � BBC News Brasil a professora, que � autora do livro Religion and Brazilian Democracy: Mobilizing the People of God (Religi�o e Democracia Brasileira: Mobilizando o Povo de Deus, em tradu��o literal).

Ela agregou que � comum que nos dias que antecedem o pleito ou no pr�prio domingo de vota��o, l�deres religiosos defendam candidatos em serm�es ou redes sociais.

"Com isso, pode haver mudan�as de �ltima hora em favor do candidato apoiado pelas igrejas", disse. "Alguns chamam isso de clientelismo, mas n�o � bem por a�, porque n�o h� necessariamente compra de votos. O que acontece � que muitas pessoas ainda est�o indecisas e acabam tomando a decis�o no �ltimo dia, influenciadas pelas igrejas".

Outra possibilidade para esse grupo n�o ter sido plenamente captado pelos institutos de opini�o � que "Bolsonaro em v�rios momentos pregou certa desconfian�a em rela��o �s pesquisas. Isso pode ter feito com que alguns de seus eleitores n�o respondessem aos question�rios e pesquisadores", avalia Smith.


Boslonaro fala com apoiadores após o primeiro turno
Boslonaro fala com apoiadores ap�s o primeiro turno; apoio no interior e entre evang�licos pode ter tido peso forte na reta final (foto: EPA)

Al�m disso, o p�blico evang�lico foi alvo frequente de desinforma��o e fake news nestas elei��es: reportagem da BBC News Brasil mostra que filhos e aliados de Bolsonaro difundiram amplamente falsas not�cias associando Lula � persegui��o religiosa.

"As pessoas est�o mais informadas em rela��o ao perigo das fake news do que estavam em 2018, quando muitos foram pegos de surpresa. Mas certamente esse tipo de desinforma��o com fundo religioso ter� grande impacto no resultado", disse � BBC News Brasil, antes das elei��es, Magali Cunha, pesquisadora do Instituto de Estudos da Religi�o (Iser) e editora-geral do Coletivo Bereia, especializado em checagem de not�cias falsas com teor religioso.

'Voto envergonhado'

Um fen�meno ainda a ser plenamente compreendido nestas elei��es � o do chamado "voto envergonhado" ou "amedrontado" - ou seja, de eleitores que deixariam de expressar sua prefer�ncia �s sondagens eleitorais por "vergonha" ou "medo".

Esse fen�meno se baseia em uma teoria de comunica��o de massa conhecida como "espiral do sil�ncio", segundo a qual o indiv�duo tende a omitir sua opini�o quando ela contraria a opini�o dominante, por medo de isolamento social.

Nos meses anteriores � vota��o, o cientista pol�tico Antonio Lavareda, presidente do Conselho Cient�fico do Ipespe (Instituto de Pesquisas Sociais, Pol�ticas e Econ�micas), levantou a hip�tese de haver voto envergonhado em Bolsonaro entre camadas do eleitorado em que Luiz In�cio Lula da Silva se manteve majorit�rio, por exemplo nas camadas de baixa renda e escolaridade.

Lavareda disse na ocasi�o que discrep�ncias entre resultados de pesquisas de inten��o de voto presenciais (quando as pessoas podem se sentir mais inibidas a falar diante de pessoas conhecidas) e por telefone poderiam sugerir uma subnotifica��o de votos bolsonaristas.

O cientista pol�tico Felipe Nunes, do instituto de pesquisas Quaest, disse que, na verdade, seus levantamentos haviam identificado o contr�rio: um poss�vel voto envergonhado em Lula, explic�vel pelo medo de sofrer viol�ncia ou por ser associado aos esc�ndalos de corrup��o atribu�dos ao PT.

Outros institutos de pesquisa, como Ipec e Datafolha, disseram n�o ter identificado evid�ncias de subnotifica��o, mas j� adiantavam que s� depois das elei��es seria poss�vel ter certeza se a "espiral do sil�ncio" de fato aconteceria ou n�o.

Voto �til cirista?

Outro fator que vai ser debatido na campanha do segundo turno � o destino dos votos dos candidatos atr�s de Bolsonaro e Lula nas pesquisas, em especial Simone Tebet (MDB) e Ciro Gomes (PDT).

A campanha de Ciro, em particular, desidratou na reta final do primeiro turno. O candidato, que se apresentava como a principal alternativa para a polariza��o no pa�s, acabou com 3,5% dos votos v�lidos (3 pontos percentuais a menos do que nas pesquisas), atr�s de Tebet, com 6,34%.

Houve muito esfor�o da milit�ncia petista para tentar migrar votos de Ciro para Lula ainda no primeiro turno. Na avalia��o de Felipe Nunes, do Quaest, por�m, tudo indica que Bolsonaro � quem se beneficiou dessa desidrata��o cirista ainda no primeiro turno. "O voto �til que a gente observou na reta final do (eleitor do) Ciro foi todo na dire��o de Bolsonaro", disse ele em entrevista ao UOL.

O outro lado dessa equa��o, por�m, � que, caso esse movimento a favor de Bolsonaro j� tenha de fato acontecido, o saldo restante de votos em Ciro provavelmente tem mais chances de migrar para Lula no segundo turno, na avalia��o de Nunes.


Ciro Gomes no dia da votação
Destino do voto de eleitores do Ciro � um dos temas em discuss�o diante do segundo turno (foto: EPA)

Mas, para o analista Bruno Carazza, autor de Dinheiro, Elei��es e Poder: as engrenagens do sistema pol�tico brasileiro, ainda � cedo para cravar para onde foram os votos de Ciro, uma vez que Lula pode ter herdado parte desses votos no primeiro turno.

No Twitter, Filipe Campante, professor na Universidade Johns Hopkins (EUA), tamb�m acha poss�vel que o voto �til possa j� ter beneficiado o pr�prio Lula. "Impressionante como muita gente est� assumindo que o voto �til n�o funcionou, quando � perfeitamente poss�vel que tenha sido o que salvou Lula e o manteve � frente", escreveu ele no Twitter.

Engajamento em Estados antipetistas

Um dos destaques do primeiro turno foi a vota��o expressiva do ex-ministro bolsonarista Tarc�sio de Freitas (Republicanos) a governador em S�o Paulo. Ele estava em segundo lugar nas pesquisas de opini�o, mas acabou com mais votos v�lidos (42,3% a 35,7%) do que Fernando Haddad (PT), com quem vai disputar o segundo turno.

Uma possibilidade � que Tarc�sio tenha recebido voto �til de parte dos eleitores do atual governador, Rodrigo Garcia (PSDB).

Mas seu desempenho sinaliza algo tamb�m para a disputa nacional: que Bolsonaro e aliados se beneficiaram ainda mais do que o previsto do sentimento antipetista em Estados onde Lula mant�m alta rejei��o, como nos da regi�o Sudeste, que abriga o maior col�gio eleitoral do pa�s.

Em S�o Paulo, Rio de Janeiro e Esp�rito Santo, Bolsonaro ganhou com folga de Lula no primeiro turno - � frente por cerca de 7, 10 e 12 pontos percentuais, respectivamente.

Nessa regi�o, Lula s� venceu em Minas Gerais (por 5 pontos percentuais), apesar de as pesquisas de opini�o terem previsto uma vantagem de Lula no Sudeste - o Datafolha previa vantagem de 8 pontos percentuais do candidato petista na regi�o.

De modo geral, o interior do pa�s - tanto do Sudeste quanto do Sul e do Centro-Oeste - tem sido negligenciado por acad�micos, analistas e imprensa, avalia Carazza.

Dessa forma, deixa-se de compreender um conjunto de valores e anseios diferentes dos que predominam nos grandes centros urbanos, bem como como de represent�-los corretamente do ponto de vista estat�stico, aponta o analista.

"E o Bolsonaro se comunica muito bem nessa regi�o, algo que ficou expl�cito na vota��o (expressiva de aliados do presidente) para C�mara e Senado".

Na C�mara, por exemplo, o PL, partido de Bolsonaro, ter� a maior bancada.

Alta absten��o

O Tribunal Superior Eleitoral (TSE) apontou que a absten��o no �ltimo domingo foi de 20,9%, ou seja, 32 milh�es de brasileiros aptos a votar n�o compareceram �s urnas.

� uma porcentagem parecida � de 2018 (de 20,3%), mas ainda assim a maior das �ltimas duas d�cadas em pleitos presidenciais.

Mesmo antes do dia 2, analistas apontavam que a absten��o tendia a prejudicar Lula, porque se manifesta mais entre camadas onde o petista tem mais inten��es de voto - por exemplo, entre o eleitorado de baixa renda e baixa escolaridade.

Dificuldade em captar o voto conservador?

Outro tema que tem despertado debates � quanto a se os institutos de pesquisa est�o conseguindo captar com precis�o a opini�o de determinados p�blicos, como o conservador.

"N�o � uma surpresa que teremos segundo turno, mas � uma surpresa que ser� um segundo turno competitivo", disse � BBC News Brasil o brasilianista Brian Winter.

"Est� claro que o Brasil, assim como os Estados Unidos, tem um eleitor conservador que n�o aparece de forma adequada nas pesquisas. Como na It�lia, Su�cia, Estados Unidos e Reino Unido, h� uma popula��o conservadora muito energizada que a m�dia e outros consistentemente subestimam."


Apoiadora de Bolsonaro
Discute-se se voto conservador est� sendo insuficientemente captado pelas pesquisas e pelas an�lises pol�ticas (foto: Reuters)

Nos EUA, em 2020, lembra ele, as pesquisas eleitorais davam ao democrata Joe Biden uma vantagem muito mais ampla sobre Donald Trump do que mostrou o resultado nas urnas.

"Essa sensa��o de sentar em frente � TV, observar a divulga��o de resultados e ficar surpreso com o n�mero de votos conservadores � um d�j� vu que passamos dez vezes ao longo dos �ltimos seis anos, desde a elei��o de Trump [em 2016]", diz Winter.

Ele ressalta que os pr�prios conservadores podem ser mais reativos a dar entrevistas aos institutos de pesquisa, porque muitos acham que o sistema est� contra eles.

Agora, � preciso entender o quanto esse fen�meno pode estar se repetindo entre o p�blico conservador no Brasil, avalia Bruno Carazza. Alguns afirmaram no Twitter terem "boicotado" os institutos de pesquisa (o que, vale destacar, podem ser apenas casos isolados, sem impacto na qualidade dos dados coletados).

Felipe Nunes, do Quaest, rebateu as cr�ticas �s pesquisas de opini�o.

"A gente passou a campanha inteira dizendo que pesquisa n�o � progn�stico (do que vai acontecer), � diagn�stico, (mas) chega a elei��o, as pessoas esquecem disso e cobram das pesquisas algo que elas s�o incapazes de fazer, que � adivinhar o que o eleitor vai fazer", disse ele em entrevista ao UOL nesta segunda-feira.

O papel da pesquisa, agregou ele, � "nos ajudar a entender os movimentos que est�o por vir", disse ele, destacando que a vota��o de Lula esteve dentro da margem de erro prevista pelas pesquisas e que a de Bolsonaro pode ter se beneficiado de movimentos como o voto cirista.

Na semana anterior � vota��o, Luciana Chong, diretora do Datafolha, disse tamb�m ao UOL que a serventia da pesquisa eleitoral � "trazer v�rias fotografias" dos momentos que antecedem a elei��o.

Com reportagem de Paula Adamo Idoeta, Luis Barrucho, Julia Braun e Thais Carran�a, da BBC News Brasil em Londres e S�o Paulo

- Este texto foi publicado em https://www.bbc.com/portuguese/brasil-6311639

Sabia que a BBC est� tamb�m no Telegram? Inscreva-se no canal.

J� assistiu aos nossos novos v�deos no YouTube? Inscreva-se no nosso canal!


receba nossa newsletter

Comece o dia com as not�cias selecionadas pelo nosso editor

Cadastro realizado com sucesso!

*Para comentar, fa�a seu login ou assine

Publicidade

(none) || (none)