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Estado de Minas ELEI��ES 2022

Pesquisas se tornaram 'neg�cio de risco', diz autor americano

Em entrevista � BBC News Brasil, o professor W. Joseph Campbell, autor do livro 'Lost in a Gallup: Polling Failure in U.S. Presidential Elections', afirma que iniciativas pol�ticas para punir institutos de pesquisa n�o t�m 'sentido' e diz que segmento est� em busca do seu 'novo padr�o-ouro'.


05/10/2022 09:56 - atualizado 05/10/2022 12:51


Ilustração mostra mão depositando papel em urna
'Acho que, privadamente, os membros da ind�stria de pesquisa reconheceriam que seu campo est� passando por muitas dificuldades agora', afirma W. Joseph Campbell, autor do livro 'Lost in a Gallup: Polling Failure in U.S. Presidential Elections' (foto: Getty Images)

"N�o � exagero dizer que o mercado das pesquisas eleitorais est� passando por uma crise", diz � BBC News Brasil o professor W. Joseph Campbell, que nos �ltimos anos tem se dedicado ao estudo dessas sondagens nos Estados Unidos.

Autor do livro Lost in a Gallup: Polling Failure in U.S. Presidential Elections (algo como "Perdidos na Gallup: Falhas em pesquisas nas elei��es presidenciais americanas") e professor de comunica��o na American University, em Washington, Campbell afirma que o sempre dif�cil e custoso trabalho de fazer pesquisas eleitorais se deparou nos anos recentes com novos desafios — como pessoas pouco dispostas a participar das entrevistas, seja por orienta��o pol�tica, seja por n�o aguentarem mais receber liga��es telef�nicas indesejadas de n�meros desconhecidos.

Independente dos motivos, fato � que, nos EUA, os institutos de pesquisa est�o passando por uma sequ�ncia sem precedentes de descompasso entre expectativas acerca do comportamento do eleitorado e a realidade revelada pelas urnas, ele diz.

"Em 2020, as falhas das pesquisas foram as piores em 40 anos, desde 1980, na elei��o de Ronald Reagan contra Jimmy Carter. Joe Biden ganhou em 2020 com cerca de 4,5% pontos percentuais de vantagem no voto popular, e alguns institutos chegaram bem perto disso. Mas a maioria ficou longe, com alguns estimando uma vantagem de 10 pontos sobre Donald Trump", afirma Campbell, que trabalhou como jornalista por 20 anos e � doutor em comunica��o. "Nas �ltimas cinco elei��es presidenciais, os institutos de pesquisa como um todo subestimaram os votos para o partido Republicano."


Colagem de fotos com Bolsonaro e Lula discursando em palanques de eventos
Nas urnas, dist�ncia entre Jair Bolsonaro e Luiz In�cio Lula da Silva n�o foi t�o grande quanto previam as pesquisas eleitorais (foto: EPA)

No Brasil, o debate acerca das pesquisas eleitorais se intensificou depois do primeiro turno, realizado no domingo (02/10). A dist�ncia entre os candidatos Luiz In�cio Lula da Silva (PT) e Jair Bolsonaro (PL) foi menor do que mostravam sondagens na v�spera. As pesquisas Datafolha e Ipec mostravam uma vantagem de cerca de 14 pontos percentuais do petista sobre o atual presidente — o Datafolha estimou em 36% o n�mero de votos v�lidos de Bolsonaro, e o Ipec, em 37%, o que daria, em uma conta simples, em torno de 42 milh�es dos votos v�lidos. O atual presidente teve, na realidade, 51 milh�es de votos v�lidos, ou seja, 43,2%, acima da margem de erro das pesquisas, de dois pontos percentuais.

Al�m disso, na disputa pelos governo estaduais, a elei��o no Rio de Janeiro foi vencida no primeiro turno pelo atual governador Cl�udio Castro (PL), quando as principais pesquisas previam que ele iria para o segundo turno contra Marcelo Freixo (PSB). Em S�o Paulo, Tarc�sio de Freitas (Republicanos) acabou em primeiro lugar, enquanto nas pesquisas aparecia em segundo, atr�s de Fernando Haddad (PT) — eles disputam agora o segundo turno. Tamb�m no Rio Grande do Sul, Onyx Lorenzoni (PL) ficou em primeiro lugar e Eduardo Leite (PSDB) em segundo, quando nas pesquisas a ordem era inversa. Lorenzoni e Leite tamb�m disputar�o o segundo turno.

Nesta ter�a-feira (04/10), o ministro da Justi�a, Anderson Torres, afirmou que pediu � Pol�cia Federal que abra um inqu�rito sobre os institutos de pesquisa. Outro ministro do governo Bolsonaro, F�bio Faria, das Comunica��es, pediu que apoiadores do presidente n�o respondam a pesquisas eleitorais, as quais acusou de serem uma "arma de manipula��o".

A BBC News Brasil entrevistou W. Joseph Campbell por videochamada na segunda-feira (03/10), mas no dia seguinte, pediu um posicionamento do professor americano sobre puni��es propostas por pol�ticos contra institutos de pesquisa.

"Propor puni��es para pesquisas eleitorais que erram o alvo parece algo sem sentido — e provavelmente se trata de uma arrog�ncia pol�tica. Nos Estados Unidos, tais iniciativas rapidamente entrariam em conflito com as prote��es da Primeira Emenda", respondeu o pesquisador, referindo-se ao texto da Constitui��o americana que garante a livre express�o.

Desist�ncias e novos formatos

Campbell afirma que, nos EUA, a rea��o dos institutos de pesquisa � crise recente tem se dividido em dois caminhos.

"Alguns institutos muito conhecidos decidiram na verdade sair da �rea das pesquisas eleitorais, e isso inclui a empresa Gallup, que provavelmente � o nome mais conhecido no setor de pesquisas eleitorais. George Gallup fundou o instituto nos anos 1930 e este se tornou o mais importante do pa�s. Mas depois de uma s�rie de elei��es dif�ceis, culminando em 2012, a Gallup saiu desse setor", diz o professor, apontando que naquele ano o instituto previu que Mitt Romney estaria ligeiramente � frente de Barack Obama, que acabou vencendo a elei��o.

Desde ent�o, o instituto tem realizado outros tipos de pesquisa, como sobre valores, comportamentos e prefer�ncias de consumo dos americanos. O mesmo caminho foi escolhido pela empresa Pew Research Center, que em 2016 anunciou que n�o mais faria proje��es sobre votos nas elei��es nacionais e estaduais.


W. Joseph Campbell em frente a estante de livros, olhando para o lado com sorriso contido
W. Joseph Campbell diz que, entre conservadores, avers�o � imprensa e �s pesquisas eleitorais est�o 'intimamente ligadas' (foto: Divulga��o)

"Mas a resposta mais comum dos institutos foi rever de uma forma r�gida seu trabalho e experimentar novas abordagens. Esta experimenta��o tem sido muito impressionante. Este segmento est� em busca de um novo padr�o-ouro", diz, explicando que institutos t�m testado e combinado dados de postagens em redes sociais, recrutamento na internet de entrevistados recorrentes e de pesquisas demogr�ficas.

As pesquisas telef�nicas de discagem aleat�ria eram o padr�o-ouro das sondagens nos Estados Unidos, mas t�m tido uma taxa de resposta muito pequena, explica o pesquisador.

"Com o advento do telemarketing e dos identificadores de chamada, as pessoas simplesmente n�o querem atender uma liga��o de um n�mero desconhecido."

"A internet se tornou predominante na forma como as pesquisas eleitorais s�o conduzidas. Isso pode vir para o bem ou para o mal, mas de qualquer maneira, a internet ainda n�o � reconhecida como o padr�o-ouro das pesquisas eleitorais."

Outro exemplo desta revis�o pela qual est� passando o mercado de pesquisas eleitorais nos EUA � um relat�rio publicado em 2021 pela Associa��o Americana de Pesquisa de Opini�o P�blica, que representa institui��es e pesquisadores do setor. O relat�rio, assinado por quase 20 especialistas, debru�ou-se os "erros das pesquisas" na elei��o presidencial de 2020 nos EUA. O documento afirma que n�o se pode apontar um �nico e conclusivo motivo para as falhas — uma possibilidade real, mas dif�cil de ser comprovada, � a de que uma parcela significativa dos apoiadores do partido Republicano se recusou a participar de pesquisas eleitorais, estimulados por falas do ex-presidente Donald Trump contra essas sondagens.

Para W. Joseph Campbell, a "suspei��o" maior de eleitores conservadores em rela��o �s pesquisas eleitorais est� relacionada � falta de confian�a na imprensa que vem crescendo nesse campo pol�tico.

"As conex�es entre os institutos de pesquisa e os ve�culos de imprensa podem ser muito fortes. Nos EUA, grandes empresas de m�dia como New York Times, Washington Post e CNN t�m opera��es pr�prias de sondagens ou trabalham em parceria com outras empresas nessa area", aponta.

No Brasil, o instituto Datafolha faz parte do mesmo grupo empresarial do jornal Folha de S. Paulo, e o grupo Globo frequentemente encomenda pesquisas eleitorais de institutos especializados.

Confian�a

Al�m da relut�ncia de potenciais entrevistados — um fen�meno relativamente novo —, Campbell lembra que as pesquisas est�o sujeitas a problemas que sempre existiram.

"No meu livro, eu mostro que h� registro de erros em pesquisas eleitorais j� em 1936", diz, lembrando que h� limita��es na compara��o entre cen�rios de diferentes pa�ses, j� que os sistemas eleitoral e pol�tico podem ser muito distintos, al�m dos contextos socioecon�micos.

"Nos �ltimos dias antes da elei��o, n�o � desprez�vel que os eleitores possam mudar de ideia, ou que os indecisos escolham por um determinado candidato. Essas mudan�as tardias s�o muito dif�ceis de serem captadas pelas pesquisas."

Ap�s o primeiro turno no Brasil, institutos de pesquisa apresentaram poss�veis explica��es para as diferen�as nos percentuais de inten��o de voto por eles captados e as vota��es concretas que receberam os candidatos, como uma migra��o de �ltima hora de votos de Ciro Gomes (PDT) e Simone Tebet (MDB) para Bolsonaro e uma absten��o alta que pode ter afetado mais os eleitores de Lula.


Mão segurando telefone usado em telemarketing
Uso de telefone para pesquisas eleitorais se tornou um problema com a chegada do telemarketing, aponta professor americano (foto: Getty Images)

Representantes do Ipec, Datafolha e Quaest insistiram que n�o houve "erro" pois pesquisas eleitorais s�o retratos da inten��o do eleitor no momento das entrevistas, e n�o uma ferramenta de previs�o.

Mas, para Campbell, a proposta das pesquisas eleitorais � que seus resultados sejam o mais "confi�veis" poss�veis, ainda mais perto da vota��o.

"As sondagens nem sempre est�o erradas, �s vezes acertam, �s vezes mais ou menos. Mas elas t�m errado com uma frequ�ncia consider�vel, e as pesquisas passaram a ser reconhecidas como um neg�cio de risco", diz o americano.

"Acho que, privadamente, os membros da ind�stria de pesquisa reconheceriam que seu campo est� passando por muitas dificuldades agora. N�o � f�cil fazer pesquisas, fazer bem e com sucesso. � muito caro, demorado e as taxas de resposta s�o muito, muito baixas. Portanto, h� muitos fatores que tornam esse campo de atua��o muito dif�cil atualmente."

O pesquisador, autor de outros livros como Getting It Wrong: Debunking the Greatest Myths in American Journalism ("Errando: derrubando os maiores mitos no jornalismo americano", em tradu��o livre), alerta tamb�m que erros em pesquisas eleitorais frequentemente est�o associados a erros no jornalismo.

"Os jornalistas se baseiam fortemente nas pesquisas, e os resultados das pesquisas tendem a moldar a narrativa das campanhas pol�ticas e das elei��es", aponta o professor.

- Este texto foi publicado em https://www.bbc.com/portuguese/geral-63140085

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