
Os institutos de pesquisa de opini�o est�o sendo alvo de pesadas cr�ticas, e n�o apenas no Brasil. Tamb�m nos Estados Unidos e no Reino Unido, entre outros pa�ses, as mudan�as de comportamento do eleitorado e o surgimento de um eleitor desconfiado do sistema criaram um desafio para capturar essa base demogr�fica.
Nos EUA, a Associa��o Americana de Pesquisa de Opini�o P�blica publicou em 2021 um relat�rio abrangente tentando entender as raz�es por que as pesquisas indicavam lideran�a da democrata Hillary Clinton na elei��o de 2016, quando ela acabou perdendo no col�gio eleitoral para Donald Trump.Em 2020, os institutos erraram ainda mais feio ao mostrar o democrata Joe Biden confortavelmente � frente de Trump em alguns Estados-chave, que no fim se revelaram vantagens muito mais apertadas. As margens de erro nas duas semanas finais da corrida foram as mais altas em 40 anos, chegando a 5 pontos percentuais, em m�dia, nas pesquisas presidenciais por Estado. Em geral, as sondagens subestimaram o voto no partido Republicano e superestimaram os Democratas.
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V�rias raz�es foram dadas para tentar explicar essa diferen�a, mas o relat�rio n�o encontrou evid�ncia para comprovar nenhuma das mais citadas — por exemplo, um suposto "voto envergonhado" em Trump, uma suposta decis�o tardia dos eleitores de votar no republicano, ou uma m� representa��o do eleitorado em termos de idade, ra�a, etnia, orienta��o sexual ou n�vel educacional.
O que explicava, ent�o, o erro das pesquisas?
Politiza��o das sondagens
A hip�tese mais plaus�vel, segundo o relat�rio, trouxe pouco al�vio para os pesquisadores: a de que certos grupos cruciais para a elei��o de Trump simplesmente n�o estavam participando das pesquisas.
O fen�meno Trump havia criado uma nova forma de eleitor descontente com o sistema, cr�tico das institui��es pol�ticas e desconfiado das pesquisas eleitorais. "Trump indicou explicitamente aos seus apoiadores que as pesquisas eram "fake" e tinham como objetivo suprimir votos. Estas declara��es de Trump podem ter transformado a participa��o nas sondagens em um gesto pol�tico, pelo qual seus apoiadores mais ferrenhos optariam por n�o responder �s pesquisas," disse o relat�rio.
O problema criava uma representa��o enviesada dos eleitores republicanos. "N�o se sabe se os republicanos que responderam �s pesquisas votaram de forma diferente daqueles que n�o responderam", disse o relat�rio.
Assim, se os eleitores de Trump fossem menos propensos a participar das pesquisas, os republicanos que responderam aos institutos de pesquisa de opini�o teriam opini�es mais moderadas, turvando a compreens�o dos pesquisadores sobre este eleitorado. "Mesmo que a porcentagem correta de republicanos tenha sido respeitada, as diferen�as entre os republicanos que responderam e n�o responderam �s pesquisas poderiam produzir o erro de sondagem observado," disse o relat�rio.
O problema com essa hip�tese � a dificuldade de comprov�-la: para sab�-lo com certeza, seria preciso ouvir os eleitores que, por defini��o, n�o conversaram com os pesquisadores.
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O desafio de alcan�ar o eleitor
H� algum tempo os institutos de pesquisa americanos j� tentam contornar o problema das baixas taxas de resposta em pesquisas eleitorais.
Em 2019, por exemplo, o Pew Research Center publicou um levantamento afirmando que a taxa de resposta nas pesquisas por telefone havia ca�do para apenas 6% — em outras palavras, os pesquisadores s� conseguiam completar as pesquisas com 6% dos lares contatados aleatoriamente nas suas amostras. Isso porque muitos adultos sondados se recusavam a participar das pesquisas, fartos com o alto n�mero de chamadas de telemarketing ou receosos de serem v�timas de fraude.
De acordo com a sua metodologia, cada pesquisa tem limita��es espec�ficas e isso se aplica em v�rios contextos: tradicionalmente, por exemplo, a pesquisa telef�nica n�o consegue atingir os grot�es onde o sinal de comunica��o � fraco, enquanto a pesquisa presencial tem dificuldade de sondar os condom�nios fechados. Hoje, com a penetra��o da internet, as pesquisas online se tornaram mais comuns, mas elas dependem de pain�is de eleitores que se voluntariam para participar das pesquisas — o que tamb�m pode levar � representa��o enviesada do eleitorado.
Al�m disso, as sondagens eleitorais se prop�em a fazer um retrato instant�neo do momento pol�tico, por isso s�o conduzidas em intervalos de poucos dias, com poucas tentativas feitas para alcan�ar os indiv�duos selecionados para a amostragem.
Para corrigir estas distor��es, os institutos de pesquisa ajustam os resultados das suas amostragens para tentar extrapolar as conclus�es para a popula��o geral com o maior grau de precis�o poss�vel. O efeito disso tem sido claro no Reino Unido, onde as sondagens subestimaram o voto conservador nas elei��es de 2015 e o voto trabalhista em 2017.

"Uma das quest�es bem conhecidas aqui � que parece ser mais f�cil entrevistar eleitores trabalhistas," disse � BBC News Brasil John Curtice, professor da Universidade de Strathclyde, na Esc�cia, pesquisador-s�nior do instituto NatCen e presidente do Conselho Brit�nico de Pesquisas de Opini�o.
Uma explica��o seria a motiva��o dos trabalhistas para participar do jogo pol�tico, em contraste com os conservadores, mais interessados em cuidar da sua vida privada. Embora essas categorias j� n�o sejam t�o claramente vis�veis, o fato, segundo Curtice, � que "se voc� tiver dois dias para fazer uma sondagem eleitoral, voc� simplesmente achar� mais f�cil conseguir eleitores trabalhistas".
At� as elei��es de 2015, as sondagens tendiam a exagerar o voto trabalhista. Depois de sofrerem cr�ticas, os institutos de pesquisa de opini�o ajustaram suas metodologias e "exageraram na dose" em 2017, diz Curtice. Em 2019 os resultados foram mais pr�ximos do verificado nas urnas.
Novas frentes de batalha
Mas as novas frentes de batalha que surgiram na pol�tica criaram uma mudan�a nas atitudes pol�ticas, dificultando o trabalho dos institutos de pesquisa. O plebiscito que culminou com a sa�da do Reino Unido da Uni�o Europeia, em 2016, foi ilustrativo nesse sentido.
At� ent�o, as elei��es brit�nicas eram pautadas por uma divis�o cl�ssica entre esquerda e direita, em torno de perfis de classe social, sendo o papel do governo na economia um tema central. Em 2016, a imigra��o se converteu em tema central, e as frentes de batalha passaram a ser sociais e culturais.
"Foi uma divis�o entre liberais e conservadores em quest�es sociais," qualificou Curtice em um artigo analisando o mau desempenho das sondagens � �poca. "Os primeiros tendem a se sentir confort�veis com a diversidade que acompanha a imigra��o, enquanto os �ltimos preferem uma sociedade na qual as pessoas compartilhem os mesmos costumes e cultura."
As linhas divis�rias j� n�o eram classe social ou opini�es sobre o papel do Estado na economia, mas idade e grau de educa��o. Os mais jovens e com mais educa��o tendiam a compor o estrato liberal e votar a favor de permanecer na Uni�o Europeia. J� os mais velhos/menos educados eram mais conservadores e propensos a votar pelo Brexit.
Quantificar essas novas dimens�es do eleitorado, especialmente numa situa��o sem precedentes como fora o plebiscito do Brexit, � como tentar ajustar a rota de percurso com o avi�o em pleno voo. Como aponta Curtice, as mudan�as podem requerer modifica��es na amostragem, nos dados coletados e na forma como esses dados s�o pesados e considerados. Nem sempre estes dados, ou indiv�duos, est�o dispon�veis na rapidez e na propor��o que a corrida eleitoral exige.
"� muito dif�cil fazer essas coisas de imediato. Eu sei, eu entendo os jornalistas que querem saber no dia seguinte, por que as pesquisas erraram? Bem, d� aos institutos seis meses para descobrir e talvez voc� consiga a resposta," diz Curtice. "No caso dos EUA, ap�s meses de investiga��o, eles ainda n�o conseguiram descobrir."
- Este texto foi publicado em https://www.bbc.com/portuguese/brasil-63129310
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