Quem foi Paulo Freire, criticado por Bolsonaro no debate na Band

por Maria Dulce Miranda

Durante o primeiro debate do segundo turno, realizado na Band nesse domingo (16/10), Jair Bolsonaro (PL) voltou a criticar Paulo Freire, considerado o patrono da educa��o brasileira. Ao destacar que as crian�as tiveram as aulas presenciais suspensas durante a pandemia e que o governo usa um aplicativo para ajudar na alfabetiza��o, o candidato � reelei��o relacionou Freire ao seu advers�rio.

 “No passado, no tempo do Lula, a garotada demorava tr�s anos para ser alfabetizada. Agora, no nosso governo, leva seis meses. O seu Paulo Freire n�o deu certo”, disse ao petista. 

Por causa da cita��o no debate deste domingo, Freire ficou em alta nas redes sociais. Considerado alvo de cr�ticas dos bolsonaristas, internautas comentam sobre o pedagogo. Enquanto cr�ticos a Bolsonaro lembram feitos do educador, apoiadores compartilham imagens de pessoas fora da dicotomia de g�nero dentro de escolas, chamando de “gera��o Paulo Freire”.

Veja alguns coment�rios:

N�o � a primeira vez que Paulo Freire � citado nestas elei��es. Em agosto, durante a sabatina no Jornal Nacional, Lula (PT) citou o pedagogo para justificar a alian�a com Geraldo Alckmin (PSB) na chapa das elei��es de outubro. Alckmin � um ex-advers�rio hist�rico de Lula. Os dois disputaram o cargo de presidente em 2006.

“Tem uma frase do Paulo Freire, que � fant�stica, que eu usei para mostrar aos militantes do PT a import�ncia da entrada de Alckmin: ‘De vez em quando, n�s precisamos conversar com os divergentes para derrotar os antag�nicos’. E agora n�s precisamos vencer o antagonismo do facismo da ultra-direita”, disse Lula, citando o atual presidente e candidato � reelei��o, Jair Bolsonaro.

Paulo Freire: vida dedicada � educa��o

Nascido em 1921, no Recife, Paulo Freire cursou Direito na Faculdade de Direito da Universidade de Recife, hoje chamada de Universidade Federal de Pernambuco (UFPE). Foi durante o curso que ele teve contato com a filosofia da educa��o. Assim, desistiu da carreira de advogado e optou por lecionar l�ngua portuguesa. 

Freire trabalhou com o letramento de comunidades pobres. Para isso, desenvolveu um m�todo de alfabetiza��o para adultos que buscava a conscientiza��o dos indiv�duos. Um dos feitos do educador reconhecido pelo meio acad�mico foi ter alfabetizado um grupo de duzentos cortadores de cana-de-a��car em apenas quarenta e cinco dias. 

“A ideia central � que a educa��o deve ser um ato, ao mesmo tempo, do educador e do educando. � nessa rela��o que se pode estabelecer uma educa��o libertadora, problematizadora e humanizadora”, explicou Nita Freire, vi�va do educador, durante uma entrevista � R�dio UFMG Educativa, em 2018. 

Ela acrescentou que o pensamento freiriano acredita em uma rela��o dial�tica entre professor e aluno.  “Na hora que ensina, ele est� aprendendo outra vez. E o aluno, na hora que aprende, com suas perguntas, ensina o professor o que ele j� sabia ou precisa saber mais ou nem sabia. Ent�o, Paulo dizia: ‘Educar n�o � um ato neutro, � pol�tico’. A educa��o se d� de distintas formas dependendo da classe social que o estudante pertence”, afirmou. 

Ex�lio e trabalho internacional

Pela influ�ncia dentro das comunidades nordestinas, Freire chegou a coordenar o Plano Nacional de Alfabetiza��o, no governo Jo�o Goulart, mas foi destitu�do e perseguido durante a ditadura militar, quando teve que se exilar do pa�s.

Em 16 anos de ex�lio, passou por Chile, Su��a, Estados Unidos e Inglaterra e difundiu sua metodologia de ensino em pa�ses africanos de coloniza��o portuguesa, como Guin�-Bissau e Cabo Verde. Considerado inimigo da Ditadura Militar, Freire s� voltou ao Brasil em 1980, com a Lei da Anistia. Em 1997, ele morreu, v�tima de um ataque card�aco. 

O seu livro mais famoso, ‘A pedagogia do oprimido’, foi traduzido em mais de 40 idiomas. Na obra, Freire detalha seu m�todo de ensino, com uma din�mica menos vertical entre professores e alunos e a sociedade na qual se inserem.

25 anos ap�s sua morte, Paulo Freire � o terceiro pensador mais citado no mundo em universidade da �rea de humanas. O dado � de um levantamento feito na plataforma Google Scholar. 

Inimigo bolsonarista

Apesar de todo o reconhecimento, essa n�o foi a primeira vez que o presidente Jair Bolsonaro teceu cr�ticas ao pensamento freiriano. Em um momento, chegou a chamar o educador de energ�meno.

Bolsonaro tamb�m extinguiu a medalha Paulo Freire, pr�mio que era concedido a educadores ou institui��es que se destacavam na luta pelo fim do analfabetismo no pa�s.

Em 2021, a Justi�a do Rio de Janeiro chegou a proibir o governo federal de “praticar qualquer ato institucional atentat�rio � dignidade intelectual” de Freire. Nas redes sociais, o deputado federal e filho do presidente, Eduardo Bolsonaro (PL) criticou a decis�o. “Educa��o do pa�s de p�ssima qualidade e n�o se pode nem criticar o patrono desta bagun�a? Isso n�o � justi�a, � milit�ncia doentia”, disse.

Dois anos antes, em 2019, o deputado federal Heitor Freire (Uni�o Brasil, ent�o no PSL) criou o Projeto de Lei 1930/19 que revoga a legisla��o que declara Freire patrono da educa��o brasileira. 

Na �poca, ele afirmou que a escolha de Freire como patrono da educa��o representa a elimina��o do pensamento plural nas escolas e no meio acad�mico. “O modelo freiriano de educa��o � celebrado pela revers�o, pela indisciplina, pela insubordina��o do aluno perante o professor”, criticou o deputado.

O texto ainda est� em tramita��o e aguarda parecer do relator da Comiss�o de Educa��o da C�mara dos Deputados.