
"O presidente Lula pode dar apoio a essa ideia. Joguei o tema para ser debatido no grupo de trabalho das cidades. Meu papel � ajudar a convenc�-lo da necessidade do direito de ir e vir. Assim como a popula��o tem acesso � sa�de gratuita e universal, acesso � educa��o, precisa ter acesso ao transporte", diz Jilmar Tatto (PT), deputado federal eleito por S�o Paulo e que integra a equipe de transi��o de governo.
Uma das quest�es que poderiam ajudar no avan�o da proposta, e que precisa ser resolvida na al�ada federal, � a do vale-transporte. Hoje, as empresas pagam o benef�cio s� aos funcion�rios que usam �nibus e trens. Uma das ideias para custear o passe livre � mudar o modelo: as companhias passariam a pagar ao governo uma taxa de transporte para todos os funcion�rios, sendo que o valor por empregado seria menor do que o gasto atual com o VT. Assim, haveria um aumento de arrecada��o, pois, espera-se, mais empresas passariam a contribuir.
"Isso deve reduzir os custos das empresas que pagam muito VT e aumentar os das que pagam pouco, como os escrit�rios de advocacia, onde muita gente vai de carro", avalia S�rgio Avelleda, coordenador do N�cleo de Mobilidade Urbana do Insper e ex-secret�rio estadual de Transportes de S�o Paulo.
Os especialistas consideram que poderia se criar uma cesta de v�rias fontes de recursos para custear a ideia, como verbas de cobran�a por estacionamento na rua, ped�gio urbano, transfer�ncias federais e venda de certificados de potencial construtivo.
S�o Paulo
At� hoje, nenhuma grande metr�pole adotou tarifa zero de forma completa, sobretudo porque os custos de manter um sistema para transportar milh�es de pessoas por dia s�o muito elevados. A cidade de S�o Paulo gastou, em 2021, R$ 3,3 bilh�es em subs�dios para a rede de �nibus, fora o valor pago pelos passageiros.
A capital paulista, no entanto, j� foi pioneira em outras mudan�as no transporte. Em 2004, lan�ou o Bilhete �nico, que permite mais de uma viagem com uma s� cobran�a, em determinado per�odo. A mudan�a abriu mais possibilidades de deslocamento aos usu�rios, especialmente das periferias.
Quando o Bilhete �nico foi integrado ao metr�, alguns anos depois, o total de passageiros nos vag�es teve forte alta, mostrando que havia uma grande demanda reprimida pelo transporte.
Outros locais
Cidades que est�o adotando agora a tarifa zero no Brasil tamb�m registram forte procura. Em Caucaia (CE), a cobran�a foi abolida em agosto de 2021. Desde ent�o, o total de viagens de �nibus passou de cerca de 500 mil para mais de 2 milh�es mensais
"� uma transfer�ncia direta de renda para a popula��o, que pode usar o dinheiro que gastaria no transporte em outras coisas, movimentando a economia da cidade", diz Vitor Valim (sem partido), prefeito de Caucaia, que tem 360 mil habitantes.
Valim diz que o transporte consome 3,6% do Or�amento e que fez arranjos nas contas municipais para acomodar o gasto, sem criar novas taxas. "Com vontade pol�tica, � exequ�vel", considera.
Segundo a NTU (Associa��o Nacional das Empresas de Transportes Urbanos), h� 51 cidades no pa�s com projetos ativos de passe livre no Brasil, a maioria no Sudeste (35).
No estado de S�o Paulo, s�o 17, entre as quais Holambra, Ilha Solteira, Pirapora do Bom Jesus e Presidente Bernardes. Em Ribeir�o Pires, a gratuidade vale s� aos domingos e feriados. O segundo estado com mais iniciativas � Minas Gerais, com 12.
No Paran�, a cidade de Paranagu�, com 157 mil habitantes, adotou a medida em mar�o. Os moradores e trabalhadores da cidade tiveram de fazer um cadastro para ter direito ao benef�cio.
Paranagu� tentou criar uma nova taxa sobre as empresas para custear a mudan�a, de R$ 50 por funcion�rio, mas a medida foi barrada pela Justi�a. A cidade ent�o passou a bancar as passagens com recursos j� existentes, como os obtidos com publicidade nos �nibus. As empresas continuaram a ter de pagar VT para os colaboradores. O dinheiro vai para o caixa da prefeitura.
Em Maric� (RJ), a transi��o rumo � tarifa zero foi mais longa. O processo come�ou em 2013. A prefeitura optou por criar uma autarquia, a EPT, para implantar a gratuidade. A empresa come�ou com frota e motoristas pr�prios, mas hoje tamb�m contrata empresas para operar as linhas gratuitas.
No entanto, o servi�o gr�tis foi lan�ado ao mesmo tempo em que outras, cobradas, continuavam operando. Isso levou os operadores dos �nibus pagos a entrar na Justi�a para questionar a mudan�a, gerando um embate que se resolveu s� em 2020, quando os contratos de concess�o terminaram. A isen��o de tarifa � bancada com recursos de royalties do petr�leo.
Entre 2021 e 2022, Maric� ampliou a frota de 50 para 115 �nibus. No mesmo per�odo, o total de passageiros se multiplicou, de 40 mil para 120 mil por dia.
"Antigamente, quem morava num certo distrito n�o conhecia os outros distritos da cidade, porque n�o tinha dinheiro para o deslocamento. A economia n�o girava. Agora, pode-se ir a qualquer �rea do munic�pio, o que melhora muito o desenvolvimento das regi�es", afirma Claudio Haddad, presidente da EPT de Maric�.
J� entre as capitais, apenas S�o Lu�s (MA) tem um piloto de tarifa zero, oferecida em uma regi�o da cidade e para funcion�rios do com�rcio, a partir das 21h, desde outubro do ano passado.
Para as empresas de �nibus, a isen��o n�o traria problemas, porque as prefeituras podem remunerar os empres�rios pelos km rodados por cada �nibus, em vez de pagar por pessoa transportada, como � hoje.
Empresas
Como o n�mero de passageiros teve forte queda com a pandemia, as empresas que tinham o valor da passagem como principal fonte de renda passaram a ter dificuldades. Elas geralmente n�o podem aumentar a tarifa sem aval da prefeitura, e o custo pol�tico de subir os pre�os, como 2013 mostrou, pode ser alto. Assim, houve casos no interior do pa�s em que empresas desistiram de operar as linhas, deixando as cidades sem transporte.
"Uma coisa � a tarifa cobrada do usu�rio, e outra � a tarifa de remunera��o das empresas. A nossa preocupa��o � ter garantias de que a remunera��o dos custos operacionais ter� continuidade", diz Marcos Bicalho, diretor da NTU. "� importante primeiro trabalhar nas fontes de recurso para depois implementar a pol�tica."
"Muitas cidades est�o dando subs�dio [para as empresas], mas a popula��o n�o sente diferen�a. Com a tarifa zero, h� transpar�ncia para o p�blico e previsibilidade [de receitas] para as empresas", diz Valim, de Caucaia.