
A primeira declara��o p�blica do presidente Luiz In�cio Lula da Silva (PT) em sua viagem oficial � Argentina, nesta segunda-feira (23/1), enviou pelo menos quatro recados claros tanto sobre o que esperar da pol�tica externa do seu terceiro mandato quanto em rela��o � situa��o interna.
Lula concedeu uma entrevista coletiva de pouco mais de 40 minutos na Casa Rosada, sede do governo argentino, ao lado do presidente do pa�s, Alberto Fern�ndez.
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Durante a entrevista, Lula mandou recados em dire��es diferentes: disse ser favor�vel � cria��o de uma moeda comum para transa��es comerciais entre Brasil e Argentina; disse que o Brasil deve voltar a usar o Banco Nacional de Desenvolvimento Econ�mico e Social (BNDES) para financiar obras no exterior; criticou as tentativas de isolar a Venezuela; disse que a comunidade internacional n�o deve se interferir em Cuba; e que militares brasileiros n�o devem se envolver na pol�tica.
Confira o que Lula disse sobre cada um desses t�picos:
Moeda comum

A pol�mica em torno da cria��o de uma moeda comum vinha dominando o debate �s v�speras da chegada de Lula a Buenos Aires, onde vai participar da VII Reuni�o da Comunidade dos pa�ses Latino-americanos e Caribenhos (Celac).
A controv�rsia come�ou no in�cio do ano e, desde ent�o, o governo brasileiro vem desmentindo rumores de que o projeto se trataria de criar uma moeda para substituir o real ou o peso argentino nos moldes do euro.
Segundo as autoridades brasileiras, a ideia que est� sendo estudada por t�cnicos dos dois pa�ses seria criar uma unidade de refer�ncia por meio da qual Brasil e Argentina possam fazer trocas comerciais sem recorrer ao d�lar americano.
A ideia � "driblar" a dificuldade da Argentina, que vive uma crise econ�mica com infla��o alta, em obter d�lares para suas importa��es.
Perguntado sobre o assunto, Lula n�o citou a cria��o de uma moeda que substitua o real ou peso, mas disse ser favor�vel � cria��o de um mecanismo que permita as transa��es comerciais entre os pa�ses da regi�o sem usar o d�lar.
"O que estamos tentando trabalhar agora � que nossos ministros da Fazenda, cada um com sua equipe econ�mica possam nos fazer uma proposta de com�rcio exterior e de transa��es entre os dois pa�ses que seja feito numa moeda comum a ser constru�da com muito debate e muitas reuni�es", afirmou Lula.
Lula admitiu que a ideia � que os pa�ses que aderirem fiquem menos dependentes do d�lar.
"Eu vou dizer o que eu penso: se dependesse de mim, a gente teria com�rcio exterior sempre nas moedas dos outros pa�ses para que a gente n�o precise ficar dependendo do d�lar. Por que n�o tentar criar uma moeda comum entre os pa�ses do Mercosul? Por que n�o criar uma moeda comum nos Brics (grupo de pa�ses formado por Brasil, R�ssia, �ndia, China e �frica do Sul)? Acho que com o tempo isso vai acontecer", disse Lula.
Financiamentos do BNDES
Lula tamb�m se posicionou sobre o seu desejo de que o BNDES volte a financiar obras em pa�ses estrangeiros.
Durante seus dois primeiros governos, o banco estatal financiou servi�os de engenharia em diversos pa�ses da Am�rica Latina e da �frica.
Alguns desses empr�stimos viraram alvo de investiga��es da Opera��o Lava Jato por suspeitas de que as empreiteiras que receberam os recursos pagaram propina a agentes pol�ticos no Brasil e no exterior.
Nesta segunda-feira, Lula mencionou a possibilidade de que o BNDES possa financiar parte da obra do gasoduto que vai ligar a bacia de g�s natural de Vaca Muerta, na Argentina, at� a fronteira com o Brasil.
"Se h� interesses dos empres�rios, se h� interesse do governo, e temos um banco de desenvolvimento pra isso, eu quero dizer que vamos criar as condi��es para o financiamento que a gente puder fazer para ajudar o gasoduto argentino", afirmou.
Em dezembro do ano passado, autoridades argentinas chegaram a afirmar que o BNDES j� havia confirmado a libera��o de pelo menos R$ 3 bilh�es para o segundo trecho da obra, que levaria o g�s at� o Rio Grande do Sul.
Na �poca, ainda na gest�o de Jair Bolsonaro (PL), o banco emitiu uma nota informando que nenhum recurso havia sido liberado.
Na semana passada, o BNDES enviou uma nota � BBC News Brasil informando que h� "conversas em curso" sobre o assunto, mas n�o foi feita nenhuma men��o ao financiamento de servi�os de engenharia, como ocorria no passado. A nota mencionava apenas a exporta��o de bens para a obra.
Lula, por�m, disse ser favor�vel � retomada do financiamento de obras de engenharia como ocorreu durante seus dois primeiros governos.
"De vez em quando, no Brasil, somos criticados por pura ignor�ncia. Pessoas que acham que n�o pode haver financiamento de servi�os de engenharia para outros pa�ses. Eu acho n�o s� que pode como � necess�rio que o Brasil ajude a todos os seus parceiros. E � isso que vamos fazer dentro das possibilidades econ�micas do nosso pa�s", disse Lula.

Venezuela e Cuba
Lula tamb�m fez coment�rios sobre as situa��es pol�ticas da Venezuela e de Cuba. Nos �ltimos dias, na Argentina, parte da imprensa local fez cr�ticas � possibilidade de que o pa�s recebesse os presidentes da Venezuela, Nicol�s Maduro, e da ilha, Miguel Di�z-Canel.
Os dois pa�ses s�o criticados por organismos internacionais por viola��es de direitos pol�ticos e humanos.
Maduro, no entanto, cancelou sua vinda � Argentina poucas horas antes de uma reuni�o bilateral que teria com Lula. Uma nota divulgada pelo governo venezuelano justificou o cancelamento da ida de Maduro a Buenos Aires mencionando um suposto "plano" de grupos de direita contra a comitiva venezuelana.
Sobre a Venezuela, Lula criticou a decis�o de pa�ses que reconheceram o l�der da oposi��o venezuelana, Juan Guaid�, como presidente do pa�s, a partir de 2019. Pa�ses e blocos como o Brasil e a Uni�o Europeia chegaram a reconhecer Guaid� como l�der da Venezuela.
"Esse cidad�o (Guaid�) ficou v�rios meses exercendo o papel de presidente sem ser presidente. At� as reservas em ouro da Venezuela depositadas num banco ingl�s foi esse cara que foi dada a garantia desse dinheiro", disse Lula.
O presidente brasileiro afirmou que o pa�s pretende restabelecer sua embaixada em Caracas e que a Venezuela dever� retomar suas atividades diplom�ticas no Brasil.
Lula ignorou as cr�ticas de defensores dos direitos humanos e disse que a crise pol�tica na Venezuela, com elei��es frequentemente contestadas pela oposi��o e organismos internacionais, ser� resolvida com di�logo.
"Pra resolver o problema da Venezuela, a gente vai resolver com di�logo e n�o com bloqueios. Vamos resolver com di�logo e n�o com amea�a de ocupa��o. Vamos resolver com di�logo e n�o com ofensas pessoais", disse Lula.
Sobre Cuba, Lula tamb�m n�o mencionou as cr�ticas de defensores de direitos humanos que inclui restri��es � liberdade de imprensa e de express�o. Em contrapartida, ele afirmou que o povo cubano n�o quer o "modelo" brasileiro ou americano.
"Espero que Cuba possa voltar a um processo de normalidade, que se acabe o bloqueio a Cuba que j� dura mais de 60 anos sem nenhuma necessidade. Porque os cubanos n�o querem copiar o modelo do Brasil. Eles n�o querem copiar o modelo americano. Eles querem fazer o modelo deles. E quem � que tem alguma coisa a ver com isso?
Crise militar

Dois dias depois de trocar o comando do Ex�rcito, Lula aproveitou a viagem � Argentina para enviar mais um recado aos militares.
O presidente demitiu o general J�lio C�sar de Arruda, que havia tomado posse no in�cio do ano, e nomeou o general Tom�s Miguel Ribeiro de Paiva.
A troca de comando aconteceu duas semanas depois da invas�o das sedes dos Tr�s Poderes, no dia 8 de janeiro.
Ap�s a invas�o, Lula chegou a comentar que havia perdido a confian�a nos militares, uma vez que os invasores encontraram facilidade para entrar no Pal�cio do Planalto, que deveria ser protegido por um batalh�o do Ex�rcito.
Sobre o assunto, Lula atacou Bolsonaro e disse que o ex-presidente havia conquistado o apoio de parte das For�as Armadas e de policiais militares. O presidente afirmou que os militares e outros integrantes de carreiras de Estado n�o devem se envolver com pol�tica.
"Eu escolhi um comandante do Ex�rcito que n�o foi poss�vel dar certo. Eu tirei e escolhi outro comandante. Tive uma boa conversa com o novo comandante pensa exatamente como tudo o que eu tenho falado na quest�o das For�as Armadas. As For�as Armadas n�o servem a um pol�tico. Ela n�o existe pra servir a um pol�tico", disse.
"O que vou falar n�o � s� para os militares. Penso que todas as certeiras de estado n�o podem se meter na pol�tica no exerc�cio da sua fun��o. Essa gente tem estabilidade. Essa gente n�o pertence a nenhum governo. Essa gente pertence ao Estado brasileiro e precisam aprender a conviver democraticamente com qualquer pessoa que vier a ocupar o governo. O Itamaraty n�o tem que servir o Lula e assim vale para os militares", afirmou o presidente.