
A Uni�o do Vegetal entrou em uma crise interna ap�s a cobran�a de mestres da religi�o por apoio dos integrantes ao ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) e at� por participa��o em atos golpistas contra a vit�ria de Luiz In�cio Lula da Silva (PT).
A religi�o � conhecida pelo ritual do ch� de ayahuasca e pela defesa de princ�pios como a paz e preserva��o das florestas.
O inc�modo com o discurso pol�tico desses l�deres fez o caso chegar, inclusive, � Justi�a. Integrantes da Uni�o pediram a proibi��o tempor�ria do uso do ch�, bebida com efeitos psicod�licos, para investigar a sua utiliza��o de forma descontextualizada, com doutrina��o ideol�gica a favor de atos antidemocr�ticos pela c�pula do grupo.
No Brasil, o uso da ayahuasca � permitido apenas em rituais religiosos. A reportagem conversou com membros e ex-membros da Uni�o do Vegetal, sob reserva, que apontam que a institui��o vem se bolsonarizando desde 2018, mas que atingiu o �pice durante e logo ap�s as elei��es do ano passado.
Procurada, a UDV afirmou que � apartid�ria, n�o professa ideologias pol�ticas e n�o teve prefer�ncias por candidatos a presidente da Rep�blica. Diz, ainda, que chegou a afastar dirigentes que cometeram excessos.
Houve afastamento de pessoas que defenderam atos golpistas, mas tamb�m de quem criticou em p�blico a entidade pelo proselitismo de mestres a favor de Bolsonaro.
Um dos expoentes da religi�o � o empres�rio Lu�s Felipe Belmonte, um dos organizadores da tentativa frustrada de criar a Alian�a pelo Brasil, partido que pretendia abrigar os apoiadores de Bolsonaro.
Antes do segundo turno das elei��es, um dos principais l�deres da Uni�o do Vegetal, Raimundo Monteiro, 88, o mestre Monteiro, enviou uma mensagem a integrantes da religi�o afirmando que havia duas agendas pol�ticas antag�nicas no Brasil.
Em men��o indireta aos dois candidatos � Presid�ncia, respectivamente Bolsonaro e Lula, disse que uma das agendas defendia "valores crist�os, sustentados pela Uni�o do Vegetal", como "a fam�lia tradicional –homem, mulher e filhos", enquanto a outra propunha "pautas incompat�veis com os mais elementares fundamentos morais e espirituais de nossa doutrina".
"N�o se trata aqui de cercear os direitos de cidadania dos nossos filiados, mas de lembr�-los que, acima das ideologias (sejam elas quais forem) e dos interesses pol�ticos, est�o os princ�pios morais e espirituais da doutrina da Uni�o do Vegetal", orientou Monteiro.
Arrematou o comunicado dizendo que para ficar no "caminho da retid�o" � necess�rio seguir a "doutrina��o reta" do mestre, "sem dela divergir em qualquer circunst�ncia e sob qualquer pretexto, seja na vida particular, seja na vida p�blica".
Ap�s as elei��es, Monteiro apareceu em fotos em meio aos atos em frente ao quartel-general do Ex�rcito em Campo Grande (MS), em manifesta��es de teor golpista.
Conhecido por ter rela��o pr�xima com Jos� Gabriel da Costa, o mestre Gabriel (1922-1971), fundador da Uni�o do Vegetal, Monteiro � tido como um dos mestres mais respeitados da religi�o e tratado no site da entidade como "um zeloso guardi�o dos tesouros da UDV".
A mensagem n�o foi repassada oficialmente pela UDV, e o mestre Monteiro anunciou que iria parar de participar das reuni�es do conselho da c�pula religiosa.
Ele n�o foi o �nico a se manifestar favoravelmente aos atos golpistas. Outros mestres e integrantes tamb�m se expressaram nesse sentido em grupos da UDV.
Um integrante da c�pula da religi�o na Bahia gravou v�deos em atos golpistas afirmando que Bolsonaro vinha mandando mensagens cifradas para os seus seguidores no sentido de que n�o deixaria a Presid�ncia —segundo a reportagem apurou, ele foi afastado pela UDV.
A escalada de apoio a Bolsonaro e aos golpistas causou rea��es de adeptos da religi�o. Em uma carta aberta, membros criticaram a "manifesta��o de apoio, por parte de pessoas da alta hierarquia da Uni�o, a posicionamentos pol�ticos" que consideram contr�rios ao do mestre Gabriel.
Afirmaram que "longe dos discursos superficiais de direita e de esquerda", n�o se alinhavam a discursos de �dio ou de preconceitos contra as minorias, � defesa da ditadura militar e � libera��o de armas de fogo —bandeiras da gest�o Bolsonaro.
"Como hoasqueiros [consumidores de ayahuasca], que bebem o Vegetal, composto de duas plantas nativas da floresta Amaz�nica e que compreendem a natureza como sagrada, temos nos sensibilizados bastante com a quest�o ambiental. A desregulamenta��o das pol�ticas ambientais, anunciada desde a �poca de campanha, est� sendo colocada em pr�tica", afirmaram.
Em v�deos, outros integrantes da Uni�o do Vegetal tamb�m reagiram � defesa de pol�ticos. "Nunca tinha visto entrar a pol�tica dentro da nossa religi�o", disse um deles, Agamenon Hon�rio, em um v�deo, citando elei��es desde a de Fernando Collor, em 1989.
"Depois da elei��o de Bolsonaro � que come�aram a entrar ideologias partid�rias na UDV", afirmou. "Dirigentes da Uni�o do Vegetal tentam impor a sua opini�o perante os membros, inclusive em sess�es."
Agamenon, que afirma ser integrante da Uni�o do Vegetal h� 34 anos, foi afastado ap�s ter publicado o v�deo.
Em uma entrevista ao canal Daniel Gontijo, do YouTube, um ex-integrante da Uni�o do Vegetal, Armando Grisi, tamb�m fez uma s�rie de cr�ticas a pessoas na c�pula da religi�o, que estariam "fomentando a desordem" ao defender a reuni�o de pessoas em frente a quart�is.
Em uma a��o popular apresentada ao STF (Supremo Tribunal Federal) em 10 de janeiro, um ex-membro da UDV, Alexandre de Oliveira Rodrigues, pediu a "proibi��o em car�ter tempor�rio do uso do ch� para investigar a poss�vel utiliza��o descontextualizada do ch� ayahuasca".
O relator do processo, ministro Ricardo Lewandowski, afirmou que o caso deve ser decidido pelo TJ-DFT (Tribunal de Justi�a do Distrito Federal e Territ�rios) e enviou os autos para a corte. Ainda n�o h� uma decis�o do tribunal.
Uni�o do Vegetal afirma que afastou dirigentes e que � apartid�ria
Procurada pela reportagem, a Uni�o do Vegetal disse em nota que � uma institui��o religiosa apartid�ria, que n�o "professa ideologias pol�ticas e n�o teve prefer�ncia ou indica��o por qualquer candidatura � Presid�ncia da Rep�blica nas elei��es passadas".
"As express�es de prefer�ncias pol�ticas de alguns de seus associados n�o representam a UDV, sendo apenas manifesta��es de car�ter estritamente pessoais", diz nota da institui��o, assinada por seu presidente, Tadeo Feij�o.
A UDV apresentou uma carta circular de dezembro do ano passado ressaltando que a religi�o � apartid�ria.
A nota diz que a religi�o "n�o permite manifesta��es pol�ticas em seu �mbito, tendo tomado provid�ncias nos casos em que foram verificados excessos, inclusive com afastamento de membros integrantes da dire��o".
Afirma ainda que a a��o popular � "uma iniciativa sem fundamento e sem nenhuma base probat�ria".
"A UDV conta, entre seus mais de 22 mil associados, com pessoas com filia��o a diversos partidos pol�ticos. Desde a origem da institui��o, militantes e parlamentares identificados como de esquerda, direita e centro convivem fraternalmente em seu seio religioso."