Plen�rio da Assembleia Legislativa de Minas: aglutina��o de votos por regi�o confronta argumento de representatividade em todo o estado (foto: pablo valaares/c�mara dos deputados)
Dos 77 deputados que comp�em a Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG), 57 concentraram mais da metade de seus votos na �ltima elei��o em apenas uma regi�o do estado – o que representa quase tr�s quartos da Casa. Na bancada mineira da C�mara dos Deputados, o percentual de parlamentares na mesma situa��o � menor, mas ainda bastante significativo: s�o 24 dos 53 representantes mineiros, cerca de 43,4%. Se somadas as duas Casas, 81 dos 130 parlamentares mineiros encaminharam sua vit�ria na elei��o com os votos que tiveram em apenas uma regi�o de Minas.
"Os temas tratados por um deputado o for�am a expandir sua base. N�o tem como deixar de tratar da quest�o das barragens em todo o estado ou da seca mais ao Norte"
Este levantamento feito pelo Estado de Minas, com base nos n�meros oficiais do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), poderia sugerir que os parlamentares s�o representantes apenas da regi�o em que obtiveram a vota��o expressiva, mas especialistas ouvidos pela reportagem explicam que essa concentra��o segue uma tend�ncia hist�rica e a l�gica do sistema de voto proporcional. De qualquer forma, a pergunta que fica �: um parlamentar que teve 80% ou 90% dos votos numa determinada cidade ou regi�o do Sul de Minas, por exemplo, vai batalhar por projetos no Vale do Mucuri, ou no Tri�ngulo?
O deputado estadual Dr. Maur�cio (Novo), que teve 99,18% de seus votos oriundos da macrorregi�o Sul/Sudoeste do estado – a maior concentra��o entre os deputados da atual legislatura –, tem a resposta na ponta da l�ngua. Ele garante que as outras regi�es de Minas n�o ser�o esquecidas no seu trabalho legislativo. “Aqui no Parlamento n�s estamos representando Minas Gerais inteira, eu n�o vou votar pensando s� no Sul de Minas, vou pensar em todo o estado, todos os habitantes. Mesmo porque nossas regi�es s�o similares, a produ��o agr�cola, o tipo de vida, os costumes de vestimenta, os costumes alimentares, a torcida de futebol. Estou apto a representar Minas Gerais como um todo”, afirma o parlamentar.
T�o expressiva como a vota��o do deputado na regi�o Sul/Sudoeste de Minas, foi o seu desempenho em Ouro Fino, cidade com 33 mil habitantes, onde foi prefeito por dois mandatos. Nada menos que 70% dos votos v�lidos do munic�pio foram para ele. Dr Maur�cio conta que n�o dispunha de recursos para viajar o estado, ent�o preferiu apostar no eleitorado de Ouro Fino e regi�o. “Minas Gerais � um estado maior que v�rios pa�ses do mundo, ent�o � muito dif�cil, em uma primeira campanha, percorrer o territ�rio todo e se tornar conhecido em todos os rinc�es do estado, ent�o fiz um trabalho em minha regi�o”.
Bandeira
A deputada federal Delegada Ione Barbosa (Avante) � outro caso de parlamentar com alta concentra��o de votos, n�o apenas em uma macrorregi�o, mas em uma cidade. Com uma carreira estabelecida na Pol�cia Civil em Juiz de Fora, ela teve mais de 83% de seus 52 mil votos vindos do munic�pio da Zona da Mata. Ione credita sua a��o como delegada na cidade como fator motivador da aglutina��o de votos. A parlamentar espera, no entanto, que seu trabalho na defesa do direito das mulheres permita garantir mais votos ao redor do estado a partir da bandeira, que n�o se limita a uma atua��o regional.
“Essa vota��o expressiva em Juiz de Fora foi tamb�m pelo papel de delegada de mulheres durante muitos anos e por ter uma institui��o de acolhimento de v�timas de viol�ncia dom�stica. Isso me deu uma visibilidade muito grande na cidade, onde tamb�m concorri � prefeitura. Mas quero aumentar essa vota��o, trabalhar em outras cidades da Zona da Mata e tamb�m em outras regi�es, levar essa bandeira para mais longe ainda, com o prop�sito tamb�m de iniciativas como levar a estrat�gia de Patrulha Preven��o � Viol�ncia Dom�stica atuarem nas zonas rurais”, comentou.
O deputado estadual Vit�rio J�nior (PP) teve quase 99% de seus votos vindos da Regi�o Metropolitana de Belo Horizonte (RMBH), sendo aproximadamente 84% apenas em Ribeir�o das Neves, onde foi vereador, secret�rio e vice-prefeito. Ele credita o resultado regionalizado ao trabalho na cidade da Grande BH, mas espera construir novas rela��es na Assembleia ao longo do mandato.
“Precisamos ter uma aten��o especial � Grande BH, em especial a Ribeir�o das Neves, tamb�m Esmeraldas e regi�o de Venda Nova em Belo Horizonte, mas vamos criar muita rela��o por Minas Gerais. Pretendo, principalmente na sa�de, investir muito atrav�s das emendas em todas as regi�es do estado. N�s tivemos uma das menores renova��es da hist�ria da ALMG nesta elei��o, o que indica que h� muita consist�ncia no trabalho dos deputados reeleitos e os contatos ser�o importantes”, avalia.
AN�LISE
Mesmo que os parlamentares apontem o desejo de legislar de forma homog�nea para todo o estado e o interesse de diversificar suas bases eleitorais, o cen�rio de concentra��o dos votos � considerado comum. Para professor da Universidade Federal de Alfenas (Unifal) e pesquisador do Centro de Estudos Legislativos da UFMG Thiago Rodrigues Silame, o cen�rio da atual legislatura repete um padr�o observado sobre o tema da distribui��o geogr�fica dos votos. Ele aponta fatores que contribuem para a concentra��o espacial de votos para parlamentares eleitos.
“Existem estudos na ci�ncia pol�tica brasileira que mostram como se d� essa concentra��o de votos. A gente v� a confirma��o de um padr�o de um tipo de voto concentrado dominante. Em alguns munic�pios ou regi�es, isso se d� muito pela trajet�ria dos pol�ticos. Alguns foram vereadores, secret�rios ou prefeitos. Al�m disso, h� uma quest�o estrat�gica, do ponto de vista do custo de campanha: o parlamentar fazer uma campanha no estado todo � muito mais caro do que focar em uma regi�o onde ele j� tenha influ�ncia”, explica.
Na Assembleia e na C�mara: os parlamentares mineiros que mais concentram votos em uma �nica regi�o (foto: Arte/EM)
Pesquisador explica padr�es geogr�ficos de vota��o
O professor da Universidade Federal de Alfenas (Unifal) e pesquisador do Centro de Estudos Legislativos da UFMG Thiago Rodrigues Silame explica que existem modelos de classifica��o para entender a disposi��o geogr�fica dos votos. Ele cita o modelo elaborado pelo pesquisador americano Barry Ames, que apresenta quatro padr�es estaduais de distribui��o espacial do voto.
Um desses padr�es � chamado de ‘disperso-compartilhado’, caracterizado por uma vota��o pequena e espalhada, geralmente obtida por um candidato com bandeiras tem�ticas que garantem um n�mero moderado de eleitores independentemente da localiza��o. Outro padr�o de vota��o � a ‘dispersa-dominante’, caracterizada por uma alta vota��o espalhada em todo o territ�rio.
Os padr�es de vota��es centralizadas geograficamente s�o chamadas de ‘concentrada-compartilhada’, as mais comuns nas elei��es legislativas e caracterizadas por vota��o aglutinada em munic�pios cont�guos, como em regi�es metropolitanas. Existe ainda a ‘concentrada-dominante’, quando os votos v�m, em ampla maioria, de um ou poucos munic�pios cont�guos. � o caso dos deputados Ione Barbosa (Avante) e Dr. Maur�cio (Novo).
H� tamb�m os parlamentares que almejam descentralizar a vota��o a partir da pr�pria atividade parlamentar, com o conhecimento do estado a partir da atua��o como representante eleito e das rela��es com outros deputados que tamb�m apresentam caracter�sticas de vota��o regionalizadas.
Plen�rio da C�mara dos Deputados: percentual de parlamentares que concentram vota��o em poucas regi�es � menor do que na Assembleia (foto: pablo valaares/c�mara dos deputados)
"A representa��o sofre preju�zos de diversas ordens, como racial e de g�nero, inclusive regional. Essas regi�es mais ao Norte de Minas integram, por exemplo, a Sudene. Podem se organizar com parlamentares do Nordeste"
Thiago Silame, professor da Universidade Federal de Alfenas (Unifal) e pesquisador do Centro Legislativo de Estudos da UFMG
O desafio de ter apoio em todas as regi�es do estado
Os mandatos com votos pulverizados s�o minoria no Poder Legislativo. Os parlamentares que t�m essa caracter�stica eleitoral elencam diferentes raz�es para tal e enxergam benef�cios e desafios tanto nos pleitos como na atua��o legislativa advindos de um eleitorado mais disperso dentro do estado. Para o deputado estadual Gustavo Valadares (PMN), espalhar a influ�ncia pelo estado e descentralizar sua base eleitoral foi fruto do trabalho de mandatos pregressos na Assembleia Legislativa. Em seu quarto mandato, ele teve a maior parte da vota��o dividida entre a Regi�o Metropolitana de Belo Horizonte (29,2%), Vale do Rio Doce (27,4%) e Jequitinhonha (13,4%).
“Eu acho que � natural que, depois que o deputado chega � Casa, consiga expandir os trabalhos para al�m das regi�es em que foi votado. Pela estrutura que ele passa a ter, isso naturalmente permite que ele amplie a base. Em estrat�gia eleitoral, ficar preso a uma �nica regi�o, � mais arriscado. Vamos supor que numa pr�xima elei��o, saia dali (da sua base) um candidato que consiga aglutinar muitos votos: quando se tem votos em mais regi�es, voc� consegue compensar essa perda eventual”, analisa.
A l�gica de estrat�gia eleitoral � assentida pelo deputado estadual Cristiano Silveira (PT), que teve a maior parte dos votos que o levaram para seu terceiro mandato oriundos da Zona da Mata (21,6%); Campo das Vertentes (19,8%); Regi�o Metropolitana de Belo Horizonte (14,7%); e Vale do Rio Doce (10,5%). Ele diz que fez a op��o por um mandato mais pulverizado, aliando pautas como a inclus�o de pessoas com autismo e a defesa dos direitos humanos a causas localizadas, como o acesso � �gua nas regi�es mais ao norte do estado. Ele avalia que dispersar as bases eleitorais � uma escolha que exige muito dos parlamentares e que � um esfor�o cont�nuo, al�m dos per�odos de pleito.
“O mandato estadualizado d� mais trabalho, voc� tem que se fazer presente nas regi�es e isso tem um pre�o. Eu acho que s�o op��es que os deputados fazem. H� deputados que s�o eleitos realmente com esse apelo de uma representa��o regional. O meu perfil j� � diferente porque � um mandato com mais estadualiza��o � medida que encontro grupos que t�m identifica��o com minhas pautas. Eu, por exemplo, sou origin�rio do Campo das Vertentes, mas com o tempo voc� consegue angariar os votos de conceito, n�o s� relacionado a identidade territorial e emendas”, avalia.
Experi�ncia
Na C�mara dos Deputados, o percentual de parlamentares que concentram sua vota��o em poucas regi�es � menor que na Assembleia Legislativa de Minas, mas ainda assim expressivo. Um dos fatores que podem explicar esse cen�rio � uma hierarquiza��o dos cargos que leva a Bras�lia pol�ticos mais experientes e com mais tempo de representa��o estadual.
Um dos parlamentares com vota��o mais dispersa, por exemplo, � M�rio Heringer (PDT), que parte para seu sexto mandato com vota��o dividida entre a Zona da Mata (29,7%), Regi�o Metropolitana de Belo Horizonte (20,6%), Norte de Minas (17,1%) e Sul/Sudoeste (11,7%). Ele associa seu trabalho na capital federal ao conhecimento em mais pontos de Minas Gerais, inclusive pela natureza do trabalho na C�mara dos Deputados.
“Os temas tratados por um deputado federal o for�am a expandir sua base. N�o tem como deixar de tratar da quest�o das barragens em todo o estado ou da seca mais ao Norte, por exemplo. Com a sequ�ncia de elei��es, a gente vai naturalmente ampliando as bases. Na primeira elei��o, tive uma vota��o mais concentrada na Zona da Mata, mas voc� come�a a ter demandas em diversas cidades e eu entendo que a fun��o de um deputado federal precisa ser a mais diversa poss�vel”, comenta M�rio Heringer.
L�gica do sistema proporcional determina representa��o regional dos eleitos (foto: Arte/EM)
Representa��o � maior na regi�o metropolitana
Recorte feito pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estat�stica (IBGE) divide o estado de Minas Gerais em 12 macrorregi�es administrativas: Campo das Vertentes, Central, Jequitinhonha, Noroeste, Norte, Oeste, Regi�o Metropolitana de Belo Horizonte, Sul/Sudoeste, Tri�ngulo Mineiro/Alto Parana�ba, Vale do Mucuri, Vale do Rio Doce e Zona da Mata.
Pela quantidade de eleitores, algumas dessas regi�es s�o mais representadas que outras dentro do Parlamentos, o que � previsto pela ado��o do voto proporcional como sistema eleitoral. Considerando apenas os votos de candidatos eleitos � Assembleia Legislativa, por exemplo, 28,9% s�o oriundos da RMBH, 14,8% do Sul/Sudoeste e 11,9% da Zona da Mata. Enquanto isso, Jequitinhonha, Campo das Vertentes e Central, Noroeste e Vale do Mucuri, somadas, n�o chegam a 15%.
Esse cen�rio tamb�m significa que as regi�es com menos votos n�o s�o base eleitoral de parlamentares eleitos. Na C�mara dos Deputados, nenhum parlamentar tem mais da metade de seus votos concentrados nas regi�es Central, Jequitinhonha, Noroeste, Oeste e Vale do Mucuri. Na Assembleia, esse cen�rio se repete no Campo das Vertentes, Regi�o Central e Vale do Mucuri.
Para o professor da Unifal e pesquisador do Centro de Estudos Legislativos da UFMG, Thiago Silame, se n�o h� um descolamento entre o eleitorado dispon�vel e os votos dos eleitos, a representatividade est� de acordo com a l�gica proporcional. Ainda assim, ele destaca que h� formas n�o eleitorais de conseguir recursos e n�o ficar � merc� das emendas de parlamentares que priorizam suas bases.
“A representa��o sofre preju�zos de diversas ordens, como racial e de g�nero, inclusive regional. Essas regi�es mais ao norte de Minas integram, por exemplo, a Sudene (Superintend�ncia do Desenvolvimento do Nordeste). Podem se organizar com parlamentares do Nordeste para defenderem pautas relativas a isso”, explica.
PT e PL
Fora a concentra��o regional, a representa��o legislativa mineira tamb�m emula a polariza��o da �ltima disputa presidencial com Parlamentos liderados pelas antag�nicas bancadas do Partido dos Trabalhadores (PT) e Partido Liberal (PL).
Na Assembleia Legislativa de Minas, o PT tem 12 deputados e o PL, 9. O desempenho petista � mais descentralizado. A regi�o metropolitana, por exemplo, representa 26,13% da vota��o total do partido, enquanto concentra 36,92% dos votos do PL. Na C�mara, o cen�rio � o mesmo: a regi�o que inclui a Grande BH representa 36,3% dos votos do PL contra 22,78% dos petistas. Em Bras�lia, por�m, os petistas s�o minoria, com 10 parlamentares contra 11 do PL. (Com colabora��o de Guilherme Peixoto)
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