
Ap�s viagens por pa�ses como Argentina, Uruguai, Estados Unidos, China, Portugal, Espanha e Reino Unido e de participar do G7 no Jap�o no pr�ximo dia 20, o presidente Luiz In�cio Lula da Silva (PT) dar� continuidade � agenda internacional. Dessa vez, o chefe do Executivo dever� visitar a �frica em ao menos duas ocasi�es com o objetivo de estreitar as rela��es Sul-Sul. Em julho, participar� da Comunidade dos Pa�ses de L�ngua Portuguesa (CPLP), em S�o Tom� e Pr�ncipe, e em agosto, dos Brics, grupo de pa�ses que re�ne Brasil, R�ssia, �ndia, China e �frica do Sul. Lula deve ainda visitar outros pa�ses africanos, como Angola e Mo�ambique, mas o roteiro ainda n�o est� fechado, segundo interlocutores palacianos.
A inten��o do petista era visitar a regi�o j� no come�o de maio, o que acabou adiado por conta da agenda apertada. No come�o do m�s, ao receber a visita do primeiro-ministro de Cabo Verde, Jos� Ulisses Correia e Silva, o chefe do Executivo destacou que a �frica, com 1,2 bilh�es de habitantes, voltar� a ser uma prioridade para o pa�s. No governo do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), a regi�o foi desprezada e chegou a fechar postos de embaixadas. Nos dois primeiros mandatos, Lula foi ao continente africano em 12 ocasi�es e passou por 21 pa�ses.
“Em meus dois primeiros mandatos, promovemos o reencontro do Brasil com o continente africano. Visitei a �frica 12 vezes, fui a 21 pa�ses e visitei Cabo Verde em duas ocasi�es. Agora a �frica voltar� a ser uma prioridade para o Brasil, sobretudo o relacionamento com os pa�ses africanos lus�fonos”, declarou na data da visita de Correia e Silva ao Brasil. Em fevereiro, em visita a Washington, o presidente citou que a visita ao continente � uma “repara��o hist�rica e obriga��o humanit�ria”. O Brasil possui coopera��o com a �frica em �reas como educa��o, agropecu�ria e sa�de.
“O Brasil deve muito da sua cultura ao continente africano. � uma d�vida que n�o pode ser paga em dinheiro, ela tem que ser paga em troca de ci�ncia e tecnologia”. Na �ltima semana, em fala semelhante, disse que “o Brasil deve muito para a �frica, n�o em dinheiro. O Brasil deve 300 anos de escravid�o. A gente n�o pode pagar em dinheiro, a gente paga em gratid�o, com transfer�ncia de tecnologia”.
Segundo a Secretaria de Com�rcio Exterior (SECEX) do Minist�rio da Economia, o saldo de com�rcio entre Brasil e do continente africano foi de US$ 15,911 bilh�es, cerca de R$ 80 bilh�es em 2021. De janeiro a outubro de 2022, o saldo havia sido de US$ 17,254 bilh�es, com uma alta de 36,9% comparativamente com o mesmo per�odo do ano anterior. A��cares e mela�os lideraram a pauta exportadora para o continente africano, al�m de milho, �leos combust�veis, soja, carnes de aves, ve�culos rodovi�rios e m�quinas agr�colas.
Mariana Cofferri, analista de Rela��es Internacionais, destaca que entre as principais vantagens da retomada de Lula na agenda de rela��es Sul-Sul est� a de atrair um maior investimento econ�mico do continente. Outro ponto vantajoso, relata, � a retomada do protagonismo brasileiro nas mesas de decis�es. “� uma �rdua tentativa de reviver a era de ouro da coopera��o Sul-Sul e a ascens�o brasileira na comunidade internacional. Por�m, � preciso que Lula busque a contrapartida e a reciprocidade em cada uma dessas visitas, desvinculando o car�ter meramente ideol�gico. � salutar levar uma agenda, principalmente econ�mica e de investimentos bem consolidada para ser debatida”, destaca.
“Lula dever� se atentar a manter o hist�rico do pragmatismo pol�tico e diplom�tico brasileiro, sem excluir a possibilidade de realiza��o de acordos multilaterais e bilaterais, independente dos alinhamentos pol�ticos assegurando a pluralidade da agenda comercial e econ�mica, principalmente ao que se refere � retomada dos debates e negocia��es de Acordos ainda pendentes, como o Mercosul-Uni�o Europeia”.
Ela recorda ainda os servi�os de empreiteiras brasileiras no continente africano com esc�ndalos da Lava-Jato. “A retomada da agenda, em especial com Mo�ambique e Angola, traz � tona os esc�ndalos de corrup��o que deram origem � Opera��o Lava-Jato, decorrente dos investimentos brasileiros da Odebrecht ocorridos durante os primeiros governos Lula. � preciso que o governo crie mecanismos e fomente pol�ticas anticorrup��o, no plano nacional e internacional, para se desvincular desse cen�rio”.
Pa�ses n�o-alinhados
Wagner Parente, consultor em rela��es internacionais e colunista do Estado de Minas, refor�a que, nas antigas gest�es do petista, a parceria Sul-Sul contribuiu para o Brasil ganhar proemin�ncia em influ�ncia no continente africano e em foros internacionais. Por�m, destaca, a conjuntura internacional � diferente.
“No passado, essa aproxima��o foi muito baseada no financiamento �s exporta��es de servi�os, ou seja, ao financiamento das construtoras no continente africano principalmente da Odebrecht. Agora n�o. N�s n�o temos mais esse instrumento, pode ser que volte. Principalmente um pa�s como Mo�ambique e Angola que falam portugu�s tamb�m, mas a gente precisa ver exatamente como ser� essa aproxima��o. Porque pode ser s� discursiva. Mas pode ser tamb�m que tenha algumas implica��es mais pr�ticas, por exemplo, como o retorno ao financiamento dessa exporta��o de servi�os e a�, evidentemente, isso tem um impacto muito maior do que s� o discurso”.
“Existe sim, ao que parece, no governo brasileiro, a inten��o de voltar com o financiamento a exporta��o de servi�os, mas n�o tem nenhuma medida concreta ainda nessa dire��o”, acrescenta Parente. Como ponto negativo, ele aponta a dispers�o do foco da pol�tica externa tamb�m em rela��o a acordos como Mercosul e Uni�o Europeia.
Ricardo Mendes, s�cio da Prospectiva e respons�vel pelas opera��es internacionais da consultoria, analisa que a agenda faz parte da estrat�gia do assessor especial internacional de Lula, Celso Amorim, em recriar um movimento de pa�ses n�o alinhados. “Desde a Dilma, o Brasil deixou qualquer tipo de lideran�a internacional em segundo plano. Lula tenta resgatar isso buscando f�runs onde o pa�s possa efetivamente ter voz, como na CPLP. Amorim gostaria de ampliar o grupo dos Brics e transform�-lo em um novo G7. Mas precisa alinhar com os chineses que t�m outros planos para o bloco, at� porque conseguem projetar poder unilateralmente. Em compara��o, o Brics tem uma import�ncia geopol�tica e econ�mica grande. J� com a CPLP � mais uma agenda diplom�tica. O Brasil tem pouco a oferecer para esses pa�ses. N�o v�o conseguir fazer muita coisa. N�o estamos mais em 2002”, critica.
O cientista pol�tico Rodrigo Prando, professor da Universidade Presbiteriana Mackenzie, corrobora que a viagem � uma continuidade das gest�es anteriores do chefe do Executivo, com enfoque na Am�rica Latina e nos pa�ses da �frica. Mas rebate que o presidente enfrenta crises internas ainda n�o resolvidas, como a falta de uma base s�lida no Congresso.
“Temos liga��es hist�ricas com a �frica por conta dos seus povos que foram escravizados. Mesmo que S�o Tom� e Pr�ncipe n�o seja um pa�s t�o relevante economicamente, h� que se levar em considera��o as dimens�es culturais e de parcerias no campo da ci�ncia, tecnologia e educa��o. Al�m disso, Lula, ao viajar, sai do foco de um governo com dificuldades no plano interno, no Congresso. A cr�tica � que ele pode estar viajando muito e, ainda, sem uma base s�lida que garanta governabilidade interna”.
O que � a CPLP
A Comunidade dos Pa�ses de L�ngua Portuguesa (CPLP) foi criada em 1996 e conta atualmente com nove estados membros: Brasil, Angola, Cabo Verde, Guin�-Bissau, Guin� Equatorial, Mo�ambique, Portugal, S�o Tom� e Pr�ncipe e Timor-Leste e tem como objetivos centrais a concerta��o pol�tico-diplom�tica, a coopera��o em todos os dom�nios e a promo��o e difus�o da l�ngua portuguesa. A CPLP est� erguida sobre princ�pios que, na perspectiva brasileira, s�o essenciais. Em primeiro lugar, as decis�es s�o tomadas por consenso, o que lhes confere legitimidade inquestion�vel. Em decorr�ncia disso, o di�logo entre os membros se d� de forma horizontal e democr�tica, com reconhecimento e respeito �s assimetrias existentes.