mãos segurando um recém nascido gritando

O beb� precisa de uma boa mobilidade de l�ngua para conseguir abocanhar corretamente o peito da m�e na hora da amamenta��o. Se o fr�nulo est� mais curto, ele fica mais baixo e mais "para dentro" da boca

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H� quase 10 anos, o Minist�rio da Sa�de criou um protocolo em que torna obrigat�ria a realiza��o do “teste da linguinha” nas maternidades em todos os rec�m-nascidos. O Protocolo de Avalia��o do Fr�nulo da L�ngua tem como objetivo identificar a presen�a da anquiloglossia – um problema cong�nito que causa altera��es no fr�nulo lingual do beb� e que, em alguns casos, podem interferir negativamente na amamenta��o. 

O fr�nulo � uma membrana localizada debaixo da l�ngua, que funciona como uma esp�cie de “ligamento” com a cavidade inferior da sua boca, auxiliando na mobilidade da l�ngua. Nos casos de altera��es no fr�nulo, pode haver um impacto na amamenta��o do beb� que pode levar � anemia, baixo peso, irritabilidade, esgotamento, sess�es longas de lact�ncia, entre outros. 

“O beb� precisa de uma boa mobilidade de l�ngua para conseguir abocanhar corretamente o peito da m�e na hora da amamenta��o. Se o fr�nulo est� mais curto, ele fica mais baixo e mais “para dentro” da boca. Com isso, a l�ngua do nen�m n�o tem mobilidade suficiente para alcan�ar o seio da m�e e extrair completamente o leite”, explicou Nat�lia Oliveira de Jesus, fonoaudi�loga da Unidade de Terapia Intensiva (UTI) neonatal, maternidade e pediatria do Hospital Israelita Albert Einstein.

Segundo Oliveira, a partir do momento que o beb� sente dificuldade na amamenta��o, ele perde a for�a de suc��o e cria mecanismos de compensa��o em outras estruturas, como bochechas e gengiva, para conseguir mamar. Para a m�e, isso pode causar dores, aumento da sensibilidade nos seios, escoria��es e les�es durante a amamenta��o. 



“Com a altera��o, o beb� cria compensa��es nos movimentos para tentar extrair a quantidade de leite suficiente para se alimentar. Ele come�a a morder o seio da m�e com a gengiva porque a l�ngua n�o consegue alcan�ar a mama e fazer o movimento correto. Ele tamb�m come�a a fazer uma press�o com a bochecha ao contr�rio do que a gente quer: em vez de encher de leite, essa bochecha afunda, fazendo covinhas”, explicou.

De acordo com Oliveira, as les�es causadas no seio da m�e s�o muito caracter�sticas do fr�nulo mais curto: costumam aparecer na linha horizontal, no centro do mamilo e com escoria��es na ar�ola. “A gente bate o olho e j� identifica como poss�vel altera��o de fr�nulo”, diz, ao destacar que esses mecanismos de compensa��o da mamada surgem muito r�pido por causa da “pega” errada do seio. Assim, as les�es costumam aparecer logo nas primeiras 24 horas ap�s o nascimento. 

Como corrigir o fr�nulo?

As altera��es no fr�nulo podem ser corrigidas com uma cirurgia simples e eficaz, mas somente quando corretamente indicada – os especialistas alertam que h� um exagero na indica��o do procedimento. 

Segundo Oliveira, o diagn�stico geralmente acontece logo ap�s o parto, quando a equipe de enfermagem e o pediatra aplicam um protocolo chamado Bristol, que classifica numa escala de um a 7 a estrutura do fr�nulo. A an�lise inclui, entre outras coisas, a avalia��o de onde est� a posi��o da l�ngua quando o beb� chora e se ele coloca a l�ngua para fora ou n�o. Quanto menor a classifica��o na escala, maior a altera��o do fr�nulo.

A partir da identifica��o dessa altera��o, a equipe de fonoaudiologia � acionada para avaliar se a mamada do beb� est� funcional ou n�o e, somente a partir da�, avaliar se � caso de cirurgia. “Se a mamada do beb� est� funcional, e o rec�m-nascido consegue extrair o leite da m�e mesmo com o fr�nulo alterado, a gente monitora esse aleitamento. Se n�o h� les�o para a m�e e o beb� consegue mamar, a orienta��o � acompanhar com o pediatra para monitorar a produ��o de leite, o ganho de peso e o desenvolvimento do beb�”, disse a fonoaudi�loga. 

Caso a m�e apresente les�es e dores para amamentar, o caso � reavaliado para a necessidade ou n�o da corre��o do fr�nulo. “A gente evita indicar uma cirurgia sem necessidade, mesmo sendo um procedimento simples”, explicou a fonoaudi�loga.

A segunda etapa do acompanhamento do fr�nulo desse beb� ocorre durante a introdu��o alimentar – a partir dos seis meses de vida. Em alguns casos, explica Oliveira, pela pouca mobilidade da l�ngua, o beb� sente dificuldade para mastigar alguns alimentos e de manipular esse alimento na cavidade oral. “Nesses casos, a gente cogita corrigir cirurgicamente. Mas, de novo: se o beb� passou tranquilamente pela amamenta��o e pela introdu��o alimentar, n�o temos motivo para indicar cirurgia”, disse.

A terceira etapa � o momento que o beb� come�a a falar – e essa � uma das preocupa��es dos pais, que temem que a crian�a tenha dificuldades de fala por causa do fr�nulo encurtado. “Muitas crian�as desenvolvem a fala normalmente mesmo com o fr�nulo alterado. S� v�o se preocupar com o problema na idade adulta, quando percebem alguma distor��o na fala, alguma dificuldade em apresenta��es orais, ou em relacionamentos. Ele pode ter tido um fr�nulo funcional a vida toda, mas na vida adulta passa a incomodar”, explica Oliveira.

N�o h� dados sobre o percentual de beb�s que t�m altera��es no fr�nulo, nem quantos passam por cirurgia. Um estudo brasileiro, realizado em 2009, acompanhou 260 crian�as em idade escolar (6 a 12 anos) e identificou que 18% delas tinham altera��es de fr�nulo e, destas, 75% apresentavam altera��es na fala. Na �poca, a orienta��o era: na d�vida, corrijam todos (cirurgicamente). 

Mas, segundo Oliveira, o estudo foi feito desconsiderando fatores externos, como condi��es socioecon�micas, escolaridade dos pais e condi��es de sa�de da crian�a, que tamb�m podem levar a altera��es do desenvolvimento da fala e da linguagem. N�o existem estudos mais atuais e mais amplos que confirmem essa necessidade cir�rgica para desenvolvimento adequado da fala. “Somente os beb�s que realmente n�o conseguem mamar e que possuem uma altera��o significativa s�o encaminhados para a corre��o cir�rgica. O que a gente avalia � a fun��o de suc��o para ver se ela est� nutritiva ou n�o”, disse.

Tipos de cirurgias

Existem dois procedimentos cir�rgicos diferentes: a frenotomia, que � a retirada parcial do fr�nulo, quando o profissional faz a “soltura” da membrana (o famoso “pick”); e a frenectomia, que � a retirada total do fr�nulo. As cirurgias podem ser realizadas pelo cirurgi�o pedi�trico, pelo otorrino ou pelo odontopediatra, com poucos riscos para o beb�. 

“Em geral, ela acontece dentro do ber��rio e at� mesmo no consult�rio, com anestesia local. O procedimento dura poucos segundos e imediatamente o beb� pode ir direto para o seio da m�e e j� fazer a pr�xima mamada tranquilamente”, disse Oliveira, ao ressaltar que o p�s-operat�rio ï¿½ mais tranquilo quando a cirurgia � feita em beb�s.

Oliveira diz que � preciso sempre avaliar os riscos e benef�cios e, por isso, � importante que as fam�lias sejam bem orientadas sobre a necessidade ou n�o da cirurgia, mesmo quando a mamada est� classificada como funcional. Por se tratar de uma estrutura f�sica embaixo da l�ngua, ela explica que n�o h� exerc�cios que possam ajudar a soltar o fr�nulo espontaneamente.

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“N�o conseguimos alongar, esticar ou soltar o fr�nulo com exerc�cios. O que a gente faz em casos que n�o recomendamos a cirurgia � trabalhar para fortalecer as outras estruturas da boca do beb�, como bochechas e a pr�pria l�ngua para que ele melhore sua mobilidade e aprenda a mamar adequadamente."

A Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP) � contra a obrigatoriedade do exame nas maternidades e ressalta a import�ncia desse diagn�stico ser feito por profissional capacitado. Em um posicionamento oficial publicado em seu site, a entidade diz que “um exame cl�nico bem realizado e uma observa��o completa de uma mamada podem ser suficientes para o diagn�stico da anquiloglossia, n�o sendo necess�rio um protocolo espec�fico para esta avalia��o e, menos ainda, a necessidade de uma lei que obrigue sua realiza��o.”

Para a SBP, � preciso estabelecer crit�rios rigorosos e de avalia��o de seguran�a e efic�cia de cirurgias para corre��o da anquiloglossia, bem como discutir mais detalhadamente o fluxo de seguimento das crian�as com diagn�stico dessa condi��o, principalmente no �mbito do Sistema �nico de Sa�de (SUS), garantindo a interven��o quando necess�ria. “Todo e qualquer procedimento que tenha como meta intervir na din�mica e no sucesso do aleitamento materno deve ter crit�rios muito bem embasados, estabelecidos e analisados criteriosamente por todos os setores profissionais envolvidos em quest�o."