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Estado de Minas

Pesquisa de mestrado mostra a umbanda sob uma �tica social

Doutrina que traz do candombl� o culto aos orix�s tem fortes liga��es com a hist�ria cultural do pa�s, indica estudo desenvolvido em Ribeir�o Preto. Religi�o organiza por categorias os esp�ritos incorporados pelos m�diuns


postado em 19/12/2011 10:07 / atualizado em 19/12/2011 10:16

Durante dois anos e oito meses, o pesquisador Rafael de Nuzzi Dias, cat�lico, despiu-se de preconceitos e visitou quatro segmentos de terreiros de umbanda em Ribeir�o Preto, no interior de S�o Paulo, para desenvolver um estudo. A experi�ncia resultou na disserta��o de mestrado Correntes ancestrais: os pretos-velhos do Ros�rio, que buscou compreender a doutrina sob a �tica social. Uma das mais importantes reflex�es que podem ser apreendidas com a pesquisa � que o umbandismo est� intimamente ligado � hist�ria cultural do Brasil.

Negros, europeus e �ndios formaram o pa�s. Bebendo das caracter�sticas religiosas dessa fonte, surgiu em 1908, no estado do Rio de Janeiro, a umbanda em todo o seu sincretismo. A religi�o orgulha-se em afirmar que � genuinamente brasileira. Segundo a Federa��o Brasileira de Umbanda, s�o cerca de 5,3 mil terreiros afiliados no pa�s atualmente.

Mestre em psicologia pela Universidade de S�o Paulo (USP), Rafael faz parte do grupo que integra o Laborat�rio de Etnopsicologia da Faculdade de Filosofia, Ci�ncias e Letras da USP em Ribeir�o Preto (FFCLRP/USP), coordenado pelo professor Jos� F. Miguel H. Bairr�o. O objetivo do seu trabalho foi tentar entender como a cultura, s�mbolos e dispositivos que comp�em os saberes s�o usados para elaborar quest�es que podiam ser chamadas de psicol�gicas. Com a aplica��o da etnopsicologia, relativa �s ra�as, procurou-se compreender como a cultura religiosa modela o lado psicol�gico do indiv�duo.


A umbanda, que traz do candombl� o culto aos orix�s, � uma religi�o de possess�o que organiza por categorias os esp�ritos incorporados pelos m�diuns. Seu fundamento � a caridade, ajudar o pr�ximo, premissa encontrada tanto no espiritismo, quanto no catolicismo. “Os pretos-velhos se apresentam como escravos, mas no sentido amplo, n�o s� do personagem hist�rico colonial. Ele tenta mostrar que existe na vida uma dimens�o de opress�o. A reden��o se obt�m pelo sofrimento, assim como em Cristo. Experi�ncia que propicia desenvolvimento, aproxima de Deus”, esclarece Rafael Dias.

O pesquisador conta que � poss�vel tamb�m perceber a presen�a dos ensinamentos ind�genas por meio da entidade cabocla e pelo valor que os umbandistas d�o �s ervas. “No terreiro � comum as pessoas que v�o se consultar, gratuitamente, sa�rem com receitas de banhos ou ch�s. Boldo, guin�, arruda, alecrim... O �ndio trouxe a sabedoria desse conhecimento org�nico da natureza”, ressalta o psic�logo.

Carma

Da concep��o esp�rita vem a ideia de encarna��o e do carma. Os seguidores da umbanda acreditam que todos j� tiveram v�rias vidas na Terra e que voltam a ela para uma evolu��o espiritual. J� em refer�ncia ao catolicismo, todos os terreiros t�m a imagem de Jesus Cristo em posi��o de destaque, mas dificilmente se v� a representa��o do Cristo na cruz. “A �nfase � no Jesus da sabedoria”, justifica Dias.

Para escolher os terreiros que seriam estudados, o psic�logo fez um trabalho-piloto de campo e por quest�es subjetivas, como receptividade, determinou os lugares. No grupo havia algumas comunidades mais esot�ricas e outras mais voltadas para as ra�zes africanas. Segundo ele, os terreiros podem ser pequenos (15 a 20 m�diuns e at� 20 pessoas na assist�ncia) ou bem maiores (150 m�diuns).

Essa parte inicial do projeto foi essencial para determinar que os pretos-velhos seriam as divindades a serem analisadas. “Eles me chamaram a aten��o por serem s�bios e terem posi��o de destaque entre as entidades. (...) Percebi tamb�m o quanto s�o importantes para a organiza��o do terreiro e que s�o refer�ncia de ancestralidade, embora os seguidores n�o confirmem essa liga��o, porque, para eles, o esp�rito perde esse direito”, explica. Dias participou de v�rias giras (ritual de umbanda) p�blicas, pelo menos uma vez por semana, em hor�rio alternados. “Acabei desenvolvendo uma rela��o de confian�a m�tua. Muitos dados foram coletados em conversas informais”, explica Rafael, acrescentando que o terreiro Padre Jos� Ros�rio foi eleito como caso-modelo para apresenta��o dos resultados e an�lises.

Choque
A primeira experi�ncia em uma sess�o “foi um choque”, como relata. “Nunca tinha tido contato com religi�es medi�nicas. Voc� tem a sensa��o clara de que est� diante de outra pessoa”, explica. Apesar desse primeiro impacto, o psic�logo seguiu com seu objetivo e entrevistou n�o somente os m�diuns, como tamb�m os esp�ritos incorporados. Tudo est� registrado em �udio e fotos, com a autoriza��o dos participantes. Ele conta que as pessoas recorrem aos terreiros com as mais variadas demandas: irm�o desempregado, filho doente, problema amoroso etc. Algumas delas, ao frequentar o espa�o, sentem coisas diferentes e descobrem que t�m mediunidade.

“Os m�diuns s�o pessoas que come�am a ter algum tipo de contato com o sobrenatural. Eles t�m sensibilidade: ouvem vozes, sentem, sonham com frequ�ncia com figuras de escravos ou �ndios. E isso � interpretado como um chamado para prestar caridade no terreiro de umbanda”, descreve. Nesse ponto tamb�m podem ser percebidos sinais da concep��o kardecista, doutrina difundida pelo professor franc�s Hippolyte L�on Denizard Rivail (que usou o pseud�nimo Allan Kardec para divulgar o espiritismo) nos idos dos anos 1860. “Tanto o esp�rito quanto o m�dium estariam ali para evolu�rem”, relata.

Para Rafael Dias, assim como a psican�lise transforma a pessoa pela palavra, a rela��o preto-velho/indiv�duo (m�dium/esp�rito) faz com que o sujeito d� novos significados a sentimentos conflitantes e encontre a concilia��o com seu pr�prio inconsciente. “A mente � um mundo de ideias, quando elas entram em choque surgem doen�as mentais. Na terapia, com a conversa, voc� pode mudar a vida de um paciente. Essa media��o tamb�m se provou poss�vel por meio do universo simb�lico da umbanda”, afirma o pesquisador.

(foto: RAFAEL DE NUZZI DIAS/DIVULGAÇÃO)
(foto: RAFAEL DE NUZZI DIAS/DIVULGA��O)
Toler�ncia � diversidade
A rela��o da umbanda com outras cren�as � de pura toler�ncia, diz o diretor cultural da Federa��o Brasileira de Umbanda, Jos� Carlos Gentil da Silva. “Os terreiros s�o abertos � chegada de visitantes.” E faz quest�o de esclarecer a equ�voca associa��o da umbanda com pr�ticas do mal. “A palavra macumba refere-se a um instrumento musical africano e ganhou sentido pejorativo pela cultura popular. Os rituais para o mal, que sujam as cidades, s�o mesclados de magia comum que se utilizam do guarda-chuva da palavra para se resguardar. Existe uma doutrina��o na umbanda voltada para o bem”, afirma.


Antonio C�sar Perri de Carvalho, secret�rio-geral do Conselho Federativo Nacional da Federa��o Esp�rita Brasileira, ressalta a import�ncia do respeito � diversidade religiosa. “Deve haver somat�ria de esfor�os quando existe um objetivo em comum: a caridade.” S�o quatro tipos de giras (rituais) da umbanda: desenvolvimento (prepara��o de novos m�diuns), caridade, festiva e de estudo e doutrina��o de valores evang�licos.

 

Legaliza��o s� em 1940

A umbanda foi criada em Niter�i (RJ) em 1908, por Z�lio Fernandino de Morais,coment�o 17 anos de idade. Ele sofria de estranhos” ataques, que seriam manifesta��es do Caboclo das Sete Encruzilhadas, esp�rito antigo de homem mesti�o que libertava escravos no estado do Rio de Janeiro. Depois de procurar ajuda no espiritismo e a entidade ter sido considerada um esp�rito atrasado e n�o merecedor de continuar na sess�o, Z�lio organizou os rituais e estabeleceu o fundamento de uma nova cren�a que seria marcada pela caridade, por meio do aux�lio espiritual com consultas. Como n�o havia liberdade religiosa, muitos terreiros que tinham rituais afros foram destru�dos no Brasil. Em meados da d�cada de 1940, a pr�tica da umbanda foi legalizada.

 


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