
Ainda na fam�lia, muitos anos depois do fato relatado acima, minha m�e desenvolveu a doen�a de Alzheimer e morreu h� dois, aos 79, depois de 10 anos de muito sofrimento. Acredito ser dispens�vel falar do meu interesse em compreender a velhice e tentar n�o somente estud�-la e pesquis�-la, mas, principalmente, perceb�-la e senti-la. Foi o que tentei fazer por minha m�e in�meras vezes, quando ela n�o mais podia: sentia frio por ela, calor, fome e tudo o mais poss�vel por ela. Penso que apenas quando nos abrimos para a percep��o e para o sentimento do outro � que podemos come�ar a elaborar alguma a��o transformadora para colaborar em seu benef�cio.
A velhice, at� muito pouco tempo, era tida como algo humilhante e vergonhoso, um tabu que se tentava n�o falar, nem comentar. A escritora Simone de Beauvoir comenta em seu livro A velhice, escrito em 1970, que quando dizia que estava desenvolvendo um ensaio sobre a velhice quase sempre as pessoas exclamavam: ‘Que ideia! Mas voc� n�o � velha!. Que tema triste...’” Ela diz em seguida: “A� est� justamente por que escrevo: para quebrar a conspira��o do sil�ncio”.
Esse � o texto de introdu��o da disserta��o de mestrado em ci�ncias da religi�o da PUC Minas de Anna Cristina Pegoraro de Freitas, de 54 anos, sobre Espiritualidade e sentido de vida na velhice tardia . Em quase 200 p�ginas, ela mostra o sentido de espiritualidade adotado pela Organiza��o Mundial de Sa�de (OMS). “Espiritualidade � o conjunto de todas as emo��es e convic��es de natureza n�o material que pressup�em que h� mais no viver do que pode ser percebido ou plenamente compreendido, remetendo o indiv�duo a quest�es como o significado e o sentido da vida, n�o necessariamente a partir de uma cren�a ou pr�tica religiosa. Reconhecendo sua import�nica para a qualidade de vida, a OMS incluiu a espiritualidade no �mbito dos dom�nios que devem ser levados em conta na avalia��o e promo��o de sa�de em todas as idades”, diz.
O interesse pelo envelhecimento da popula��o sempre esteve presente na vida da psic�loga, mas aumentou com a doen�a da m�e. Professora da disciplina Psicologia da vida adulta � velhice nas quatro unidades da PUC Minas (Cora��o Eucar�stico, Betim, Barreiro e Contagem), Anna Cristina coordena o projeto Mais idade com idosos, da Pr�-reitoria de Extens�o, e representa a universidade no Conselho Municipal do Idoso, da Secretaria Municipal de Sa�de.
Viv�ncia Convivendo com idosos tanto em casa como na PUC Minas, Anna Cristina come�ou a pesquisar at� chegar � disserta��o, que teve como objetivo principal “compreender como a viv�ncia da espiritualidade influencia na elabora��o do sentido de vida na velhice, utilizando-se de uma pesquisa de abordagem qualitativa. Para embasar a an�lise, a revis�o da literatura abordou os conceitos de velhice em diferentes momentos da hist�ria – e a velhice como um est�gio do desenvolvimento humano.”
Na pesquisa emp�rica, os dados foram coletados por meio da hist�ria oral com oito mulheres entre 80 e 100 anos. “As narrativas geraram tr�s temas principais: velhice, espiritualidade e sentido de vida, que foram desdobrados em categorias. A an�lise permitiu, em s�ntese, concluir que a espiritualidade se mostrou um fator fundamental para a elabora��o do sentido de vida na velhice tardia. Sempre, em todas as dificuldades, a espiritualidade est� presente como fator indispens�vel n�o s� no enfrentamento das mesmas, como tamb�m – e principalmente – como colaboradora de sentido para suas vidas.”
Segundo ela, o grupo pesquisado tamb�m demonstrou que se pode viver uma velhice tardia com qualidade de vida, dependendo do estilo de cada um, da pr�tica espiritual e da consci�ncia temporal, ou seja, � poss�vel manter uma vida com sentido.