
A influ�ncia norte-americana no Brasil vai muito al�m da ocupa��o quase integral de filmes nas salas de cinema, do vestu�rio ou da verticaliza��o das cidades. Os h�bitos alimentares dos brasileiros tamb�m est�o sendo constru�dos dentro do fracassado modelo da terra de Tio Sam, que levou milhares de pessoas � obesidade naquele pa�s. Instigados pela ado��o da alimenta��o estrangeira por aqui, os professores Rubens Feferbaum, do Departamento de Pediatria da Faculdade de Medicina da Universidade de S�o Paulo (USP), e Luiz Carlos de Abreu, do Departamento de Sa�de Materno-Infantil da Faculdade de Sa�de P�blica da USP, se debru�aram sobre os reflexos do aumento do consumo de refrigerantes, sucos de caixinha e outras bebidas altamente cal�ricas entre as crian�as e adolescentes de cinco capitais brasileiras.
O estudo “Padr�es de ingest�o de fluidos: um estudo epidemiol�gico de crian�as e adolescentes no Brasil” acompanhou 831 meninos e meninas entre 3 e 17 anos, para avaliar a evolu��o do consumo dessas bebidas ao longo dos anos. Os pesquisadores buscaram descobrir quantas calorias di�rias s�o consumidas com esses l�quidos, comparando os resultados com as recomenda��es da Ag�ncia Nacional de Vigil�ncia Sanit�ria (Anvisa).
� medida que as crian�as crescem, o consumo de leite cai, abrindo espa�o para o aumento da ingest�o de sucos e refrigerantes. Os resultados mostraram que entre os adolescentes de 11 a 17 anos, a maior parte das calorias consumidas vem de refrigerantes ou sucos de caixinha, que representaram uma m�dia di�ria de 207 quilocalorias (kcal), ou 42% do total de calorias obtidas apenas pelo consumo de l�quidos. Bebidas a�ucaradas ficam em segundo lugar, com �ndices entre 37% e 45% de calorias nos grupos de 3 a 6 anos, e de 7 a 10 anos, respectivamente. Entre crian�as de 3 a 10 anos, o estudo levantou que leite e derivados est�o entre os l�quidos mais consumidos.
“A substitui��o do leite e da �gua por sucos artificiais e refrigerantes � uma cat�strofe. Os pais n�o devem nunca oferecer essas bebidas com calorias vazias. Isso pode at� causar defici�ncia de prote�nas que afeta n�o s� o crescimento como tamb�m o desenvolvimento do c�rebro. Ou ainda altera��es na s�ntese dos neurotransmissores (mol�culas qu�micas produzidas dentro do neur�nio) que podem afetar o funcionamento dos neur�nios e causar doen�as de altera��o do comportamento social, entre v�rias outras”, alerta Luiz Carlos de Abreu.
Para Rubens Feferbaum, “os profissionais de sa�de devem estar atentos ao consumo excessivo de bebidas ado�adas entre as crian�as e adolescentes. Padr�es alimentares saud�veis podem ajudar a melhorar os programas de preven��o de sobrepeso e obesidade”, afirma. Em todas as faixas et�rias o consumo de �gua entre os l�quidos se manteve em 30%, quando deveria ser de pelo menos 60%. As bebidas doces aumentam sua participa��o nos h�bitos di�rios � medida que a crian�a cresce, chegando a representar, sozinhas, 15% de toda a demanda cal�rica di�ria do organismo, no caso dos adolescentes, caindo para 12% entre aqueles de 7 a 10 anos e 8% de 3 a 6 anos.
D�bora Fernandes da Silva, de 15 anos, chegou a pesar pr�ximo de 90 quilos. A m�e, Luciana Fernandes Coelho, de 35, percebeu que precisava fazer algo e tem ajudado a filha na reeduca��o alimentar. “Antes ela tomava refrigerantes todos os dias. Sempre t�nhamos na geladeira. A solu��o foi parar de comprar. Hoje, s� suco, e preferencialmente natural. Mas a praticidade �s vezes nos leva aos sucos de caixinha. E tem dado resultado. Em pouco tempo ela j� chegou a 83 quilos e vai continuar nesse caminho. A alimenta��o, claro, tamb�m tem melhorado. Pizza e biscoitos recheados, antes frequentes, agora s�o raros na mesa”, garante Luciana.
Para Abreu, a quest�o virou um problema de sa�de p�blica. “A obesidade abre as portas para comorbidades (doen�as relacionadas) como a aterosclerose, infarto, hipertens�o, diabetes, d�ficit de aten��o e hiperatividade”, diz. O estudo mostra que todas as capitais avaliadas est�o no mesmo barco: a popula��o infantil e jovem tem tend�ncia � obesidade por uso dessas bebidas, registrando aumento de 62% no consumo. “Percebemos que h� um movimento uniforme em dire��o a padr�es alimentares alterados. � preciso agir desde as creches at� as universidades para reduzir esses �ndices de obesidade dentro dos pr�ximos 20 a 30 anos. Caso contr�rio, estaremos gerando uma bomba-rel�gio para o sistema p�blico de sa�de brasileiro e para a previd�ncia social, pois teremos uma pandemia de doen�as relacionadas ao excesso de peso que v�o superlotar os hospitais e afastar essas pessoas do trabalho”, conclui o pesquisador. 
A obesidade � considerada um problema de sa�de p�blica em pa�ses desenvolvidos e uma epidemia global, segundo a Organiza��o Mundial de Sa�de (OMS). Dados atuais mostram que a preval�ncia de sobrepeso entre crian�as e adolescentes � alta tamb�m nos pa�ses em desenvolvimento. Isso � reflexo de problemas nutricionais na inf�ncia. No Brasil, a Pesquisa de Or�amentos Familiares realizada no bi�nio 2008-2009 pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estat�stica (IBGE), indica que a propor��o de meninos entre 10 e 19 anos que est�o acima do peso aumentou de 3,7 % em 1974-75 para 21,7% em 2008-09. Entre as meninas na mesma faixa et�ria, a propor��o passou de 7,6% para 19,4% durante o mesmo per�odo. A pesquisa analisa os gastos das fam�lias e do consumo de acordo com a renda. O consumo regular de calorias na forma l�quida � tido como um dos principais respons�veis pelo ganho de peso, devido � sua baixa saciedade e alto teor de a��car adicionado. Com reflexos no aumento do risco cardiovascular e da diabetes mellitus tipo 2 em crian�as e adultos.
Para Rubens Feferbaum, “estudos epidemiol�gicos s�o geralmente projetados para avaliar a ingest�o de alimentos s�lidos. Mas as bebidas tamb�m devem ser consideradas na abordagem nutricional de indiv�duos e popula��es, especialmente em ambientes tropicais como o Brasil, onde a temperatura elevada pode contribuir para a desidrata��o”, sugere.
A metodologia do estudo
O estudo incluiu 831 crian�as e adolescentes de ambos os sexos, que variaram de 3 e 17 anos de idade, de Belo Horizonte, S�o Paulo, Porto Alegre, Rio de Janeiro e Recife. Os setores censit�rios s�o unidades territoriais definidas pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estat�stica (IBGE) para orientar a distribui��o espacial da popula��o, dados os crit�rios ap�s a coleta, em que apenas um pesquisador de recenseamento pode cobrir toda a �rea. A partir do universo de setores censit�rios nas principais �reas urbanas do Brasil, 90 setores censit�rios foram selecionados aleatoriamente de atingir o tamanho amostral calculado, afim de representar a diversidade socioecon�mica, de acordo com o �ndice de Desenvolvimento Humano (IDH).
Quando um l�quido foi ingerido, o tempo, tipo e volume da bebida foram registados utilizando as fotografias dos utens�lios e recipientes utilizados, o que aumentou a confiabilidade dos dados. Os l�quidos foram classificados em 11 grupos: �gua, �gua com sabor de leite e produtos l�cteos, bebidas quentes (incluindo caf� e ch�), bebidas carbonatadas (refrigerantes), sucos naturais (sucos de frutas sem adi��o de a��car), bebidas artificiais (contendo alimentos corantes, aromatizantes e adi��o de a��car), n�ctares (polpa de frutas com adi��o de a��car), bebidas funcionais (energia e bebidas isot�nicas), �lcool e outros, que inclu�am bebidas � base de soja e sopas instant�neas. Para avaliar a contribui��o de energia di�ria de cada tipo de bebida, o n�mero m�dio de kcal foi determinado com base nos r�tulos.
