Representação de inteligência artifical

Representa��o de intelig�ncia artifical

Getty Images

Uma campanha publicit�ria que mostra a falecida Elis Regina e sua filha Maria Rita fazendo um dueto provocou rea��es antag�nicas nas redes sociais.


Na pe�a da montadora Volkswagen, a cantora que morreu na d�cada de 1980 foi trazida de volta � vida usando Intelig�ncia Artificial (IA). Ela aparece dirigindo uma Kombi e cantando Como Nossos Pais, de Belchior.


Enquanto muitos f�s e internautas elogiaram e se emocionaram com a propaganda, outros questionaram se � �tico usar a imagem de uma pessoa que n�o est� mais viva em um contexto fict�cio.


� BBC News Brasil, o soci�logo e coordenador de impacto do Centro de Intelig�ncia Artificial da Universidade de S�o Paulo (USP) Glauco Arbix afirmou que o assunto � de fato controverso, seja porque suscita debates sobre os efeitos psicol�gicos de trazer pessoas mortas � vida usando tecnologia ou porque toca em quest�es como consentimento, veracidade e finitude da vida.


Para Arbix, h� muitos riscos em usar IA de forma n�o transparente, informada ou consciente, especialmente quando h� um deslocamento espacial ou atribui��o de declara��es inver�dicas � pessoa retratada.


"N�o � porque voc� pode fazer que deve fazer", diz. "Uma coisa � voc� guardar na sua gaveta um filme de algu�m que morreu para assistir algumas vezes, outra coisa � recriar (a imagem dela) em condi��es novas, como se ela ainda estivesse viva."


Segundo o professor da USP, nossa sociedade n�o est� pronta para lidar com esse deslocamento espacial e circunstancial de figuras j� falecidas e fazer isso pode ser "perturbador" para algumas pessoas.


"A finitude da vida est� sedimentada na hist�ria social. Mesmo para aqueles que creem em vida ap�s a morte, � algo sempre mais inacess�vel e distinto do que vemos agora, para o que n�o estamos prontos como sociedade."


A BBC Brasil procurou a Volkswagen para um posicionamento sobre o tema, mas n�o obteve resposta at� o fechamento desta reportagem.

'Pode destruir nome e reputa��o'

A campanha da Volkswagen n�o foi a primeira a usar a intelig�ncia artificial para encenar realidades com pessoas j� mortas.


No filme Rogue One: Uma Hist�ria Star Wars, a atriz Carrie Fisher tamb�m foi recriada digitalmente para aparecer como a jovem Princesa Leia.


Trecho da propaganda da Volkswagen

Propaganda da Volkswagen trouxe Elis Regina e Maria Rita cantando juntas

Divulga��o

Em junho, o m�sico Paul McCartney disse que a intelig�ncia artificial havia sido usada para que a voz de John Lennon - morto em 1980 e de quem ele foi parceiro na banda Os Beatles - pudesse ser usada numa nova m�sica.


A tecnologia, tamb�m conhecida como deepfake, � usada com frequ�ncia ainda para criar v�deos falsos envolvendo celebridades e figuras pol�ticas.


No caso da propaganda da montadora, a intelig�ncia artificial foi treinada especificamente para reconhecimento facial de Elis Regina, diferentemente do que � feito em projetos de IA que utilizam tecnologia pr�-treinada a partir de dados gen�ricos.


Segundo a empresa, a IA recebeu extensivos treinamentos com diferentes tecnologias, combinando a atua��o da dubl� com os movimentos e imagens de Elis, para chegar ao resultado do rosto da cantora na propaganda.


Para Arbix, apesar do v�deo da Volkswagen ter sido feito com autoriza��o e participa��o da filha de Elis Regina, essa tecnologia tamb�m pode ser usada para fins perigosos, distorcendo fatos, e at� na ind�stria da pornografia ou pedofilia.


"A pessoa pode ficar sujeita a uma recria��o que pode acabar destruindo o seu nome e sua reputa��o", diz. "Mas tamb�m suscita quest�es do ponto de vista da integridade da vida familiar."


Segundo o soci�logo, ainda n�o h� um consenso entre a comunidade m�dica sobre os efeitos psicol�gicos de ver ou at� conversar por meio da IA com entes queridos que j� faleceram.


Diversas empresas de tecnologia, entre elas a americana HereAfter AI, t�m desenvolvido tecnologias para cria��o de uma vers�o digital de algu�m. Dessa forma, seria poss�vel criar um di�logo artificial com uma pessoa falecida usando informa��es pessoais, ferramentas de voz e intelig�ncia artificial avan�ada.


"Do ponto de vista da psicologia, h� quem diga que pode ajudar a manter a mem�ria e trazer conforto para a fam�lia. Mas h� tamb�m quem seja totalmente contra", diz Glauco Arbix.


E h� at� quem j� esteja tentando se proteger disso. O ator Robin Williams, que morreu em 2014, imp�s uma restri��o ao uso de sua imagem por 25 anos ap�s seu falecimento em seu testamento.


Segundo as informa��es divulgadas, o americano queria evitar que sua figura fosse reproduzida por meio de hologramas ou outras tecnologias para fins comerciais.

Direito de imagem e consentimento

Quando se trata do direito de imagem ou do consentimento, o soci�logo Glauco Arbix afirma acreditar que a lei brasileira j� tem todos os conflitos bem resolvidos.


"A legisla��o e a maneira como nossa sociedade v� isso atualmente j� d�o conta do dilema. As fam�lias t�m os direitos autorais", afirma.


"Discutir se, por exemplo, a Elis Regina autorizaria o uso da imagem dela nessa propaganda � ing�nuo, porque ela tamb�m n�o autorizou a divulga��o de fotos, mas essa quest�o est� prevista na legisla��o."


J� para Sara Su�rez-Gonzalo, professora da Universidade Aberta da Catalunha e pesquisadora do tema, o debate deve ir mais al�m. Para ela, o consentimento de familiares n�o � suficiente em casos como esse.


"Mesmo quando morrem, as pessoas n�o s�o meras coisas com as quais os outros podem fazer o que quiserem. � por isso que nossas sociedades consideram errado profanar ou desrespeitar a mem�ria dos mortos. Em outras palavras, temos certas obriga��es morais para com os mortos, na medida em que a morte n�o implica necessariamente que as pessoas deixem de existir de forma moralmente relevante", afirmou em um artigo publicado no site The Conversation.


Mulher triste olhando pela janela

N�o h� um consenso entre a comunidade m�dica sobre os efeitos psicol�gicos de ver ou at� conversar por meio da IA com entes queridos que j� faleceram

Getty Images

Segundo Su�rez-Gonzalo, o debate � ainda mais complexo quando envolve bots que coletam dados pessoais para reproduzir conversar com pessoas falecidas, pois replicar a personalidade de algu�m "requer grandes quantidades de informa��es pessoais, como dados de redes sociais que revelam caracter�sticas altamente sens�veis".


A pesquisadora afirma ainda que outra quest�o �tica envolvida no uso da IA � a responsabiliza��o pelos resultados da tecnologia, especialmente no caso de efeitos nocivos.


Se um bot, v�deo ou imagem criado com a tecnologia, por exemplo, causar danos � sa�de mental de um familiar, quem se responsabiliza?


"� essencial abrir um debate p�blico que possa informar melhor os cidad�os e nos ajudar a desenvolver medidas pol�ticas para tornar os sistemas de IA mais abertos, socialmente justos e compat�veis com os direitos fundamentais", diz no artigo.