
O projeto de resgate de grandes telenovelas do Globoplay se iniciou h� mais de um ano e j� colocou quase 150 t�tulos � disposi��o no streaming. Entretanto, faltava uma convidada especial. Ou melhor, a anfitri�. Mas ela chegou. “Pai her�i”, escrita por Janete Clair (1925-1983) em 1979, entrou para o cat�logo da plataforma. � a primeira novela da autora a chegar ao Globoplay. Janete � considerada por muitos a maior autora brasileira de telenovelas. Chamada de "maga das oito", sempre com muito sucesso.
Do poeta Carlos Drummond de Andrade, ela ganhou o t�tulo de "usineira dos sonhos", em uma coluna que escreveu no Jornal do Brasil, ap�s o cap�tulo final de outro cl�ssico que criou, “O astro”, de 1977. Nele, Janete mobilizou o pa�s com o mist�rio sobre "quem matou Salom�o Hayalla?".
“Pai her�i” contou com nomes como Tony Ramos, Gl�ria Menezes, Paulo Autran, Elizabeth Savalla, Rosamaria Murtinho, Carlos Zara, Maria Fernanda, L�lia Abramo e Dion�sio Azevedo no elenco. A hist�ria girava em torno de Andr� Cajarana (Tony), um jovem que tentava a todo custo provar a inoc�ncia do pai falecido. Para isso, tinha que enfrentar o poderoso Bruno Baldaracci (Paulo Autran), uma esp�cie de mafioso – atualmente, um miliciano – da Baixada Fluminense.
Em entrevista por telefone, Tony Ramos relembra seu trabalho em “Pai her�i” e em outras duas outras novelas da autora – a quem ele chama carinhosamente de "dona Janete" –, “O astro” e “Selva de pedra”, esta �ltima, um remake exibido em 1986, ap�s a morte de sua criadora.
Queria que voc� contasse, talvez a gera��o atual n�o tenha essa compreens�o, o que era ser escalado para ser protagonista de uma novela de Janete Clair?
Comecei com TV ao vivo. Pude entender o que era a televis�o. Hoje, temos novas ferramentas. Quando voc� tinha s� a TV aberta, o r�dio e o cinema, uma novela como “Pai her�i”, de enorme sucesso, assim como foi a anterior, “O astro”, que eu tamb�m fiz e na qual o pa�s inteiro perguntava "quem matou Salom�o Hayalla?", era algo que tomava uma propor��o enorme. “Pai her�i” � uma novela muito boa, atual.
De que forma?
� uma hist�ria de um filho que tenta salvar a honra e a moral do pai. Essa nova gera��o poder� conhecer uma hist�ria de muita emo��o – e n�o s� a emo��o de chorar –, mas a pulsa��o de um conflito, isso �, o que toda boa dramaturgia tem que ter. H� conflitos em todos os n�cleos. Inclusive, h� 43 anos, dona Janete j� falava de uma riqueza emergente. J� falava de poderes paralelos existentes na sociedade por meio da personagem de Paulo Autran. � uma novela que poderia ser refeita pela TV Globo com tranquilidade, com suas devidas adapta��es, que n�o tenho a menor d�vida de que seria novamente um sucesso.
No caso de “Pai her�i”, a hist�ria era bastante centrada no Andr� Cajarana, seu personagem.
Ele � muito heroico. H� a cena do assalto – e a novela era muito bem filmada pelo (diretor) Roberto Talma – que eles colocaram uma c�mera de m�o dentro de uma ca�amba de uma caminhonete. Uma cena de persegui��o pelas ruas do Leblon, em uma �poca sem os recursos de hoje. E o Andr� acaba se escondendo na cobertura da Carina (Elizabeth Savalla). Muitos diziam: s� em novela mesmo. Lembro-me da dona Janete dizer: "N�o falem isso, gente. � tudo real. Tudo pode acontecer. O que a gente faz � adocicar a fantasia de um folhetim."
Os personagens de Janete, mesmo os mocinhos, eram muito complexos. M�rcio, de “O astro”, era assim. Andr� Cajarana tamb�m. Idem o Cristiano Vilhena de “Selva de pedra”. Como voc� os constru�a?
Ah, sempre tivemos grandes diretores ao lado de dona Janete. Daniel Filho, Gonzaga Blota, Roberto Vignatti, que era grande diretor de teatro, Walter Avancini, Roberto Talma, Paulo Ubiratan. Todos muito atentos ao folhetim e aquilo que n�o se pode ter ao fazer uma novela: um olhar blas�, superior. Aquela coisa de "ah, estou fazendo uma novela a�". Nunca. Uma hist�ria popular tem que ser respeitada. Essa cumplicidade do povo com a telenovela brasileira � uma manifesta��o cultural.
Em “O astro”, Janete te deu uma cena de nudez, muito bem contextualizada, de um filho que contesta a gan�ncia do pai, e sai de casa nu. O que voc� pode contar sobre essa cena?
Ela e os diretores conseguiram a libera��o na censura justamente com argumento de que n�o era um nu gratuito. Era um filho brigando com o pai, despindo-se da roupa que ele lhe dava. Fiquei nu mesmo. Fora da casa, o jardineiro da fam�lia coloca uma capa de chuva sob o corpo do filho. E o personagem sai caminhando como S�o Francisco de Assis. Um momento muito bonito. Essa cena rendeu cr�nicas, textos, mas, sobretudo, uma rela��o de carinho com o p�blico.
Em 1986, voc� fez o remake de “Selva de pedra”. Muita gente achou que n�o ia dar certo, mas foi outro grande sucesso. E Cristiano, mais uma vez, um personagem complexo, ambicioso, com cenas dif�ceis. Um desafio, n�o?
A vers�o cl�ssica de “Selva de pedra”, claro, � a primeira, com Francisco Cuoco e Regina Duarte. S� que era em preto e branco. E a empresa (TV Globo) n�o conseguia vender esse cl�ssico para o mundo por ele ser em preto e branco. Ent�o, o Daniel teve a ideia de refaz�-la. Para voc� ter uma ideia, foi de Israel a It�lia, dos Estados Unidos para todo o p�blico da Am�rica Latina. Cristiano era o m�ximo, del�cia de personagem. Contradit�rio, cheio de altos e baixos, de moral duvidosa. Adorei fazer. Posso apostar. Fa�a Selva de Pedra novamente nos dias de hoje. Pegue um bom elenco, com um grande ator jovem, como o Chay Suede. Vai ser sucesso novamente. (Estad�o Conte�do)