O Festival Artes Vertentes, em curso desde o último dia 11 nas cidades de Tiradentes, São João Del-Rei e Bichinho, promove neste sábado (20/9) a estreia de “O boi voador”, composição encomendada a André Mehmari, que será apresentada pelos pianistas Cristian Budu e Gustavo Carvalho. O recital será realizado às 11h, no Largo de Sant'Ana, no Centro histórico de Tiradentes.
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A obra comissionada se constitui como uma resposta brasileira à célebre “O boi no telhado”, do francês Darius Milhaud (1892-1974), que criou a peça a partir da escuta do choro, do maxixe e da música popular carioca durante sua passagem pelo Brasil, entre 1917 e 1919. Mehmari propôs um caminho inverso, partindo de temas franceses para produzir uma peça que atravessa linguagens e reinterpreta os cruzamentos do modernismo franco-brasileiro.
O pianista Gustavo Carvalho, curador do Artes Vertentes, diz que a encomenda a Mehmari foi motivada pelo fato de este ano o Festival estar integrado à programação oficial da Temporada Cultural França-Brasil. “Quisemos convidar um compositor brasileiro para estabelecer essa ponte com Milhaud. André Mehmari me pareceu um excelente nome. Ele criou uma resposta para 'O boi no telhado' que chega 100 anos depois”, diz.
A peça de Mehmari inclui uma série de citações, desde o “Bolero”, de Ravel, até canções populares francesas. “Isso é algo que faz muito parte da linguagem do André”, comenta Carvalho. O pianista, compositor e arranjador paulista assente que, ao longo de sua trajetória, sempre compôs muito em diálogo com outras obras e momentos da história da música. “Recentemente, recebi uma encomenda de musicar os sonetos de Vivaldi para as 'Quatro estações', feita pela Orquestra Ouro Preto”, conta.
Mehmari conta também que acaba de registrar uma ópera, intitulada “Machete”, que contém citações a pelo menos outras 10 óperas. “Acho que quando as pessoas me procuram para isso, elas já sabem que tenho essa aptidão, esse apetite natural por criar pontes musicais. É uma característica da minha escrita, essa metalinguagem”, afirma.
Segundo ele, compor à luz de outras obras pode ser mais libertador do que limitador. “Stravinsky costumava dizer que quanto mais limites você estabelece para sua criação, mais livre ela será. É uma frase muito forte, mas que acaba fazendo algum sentido. Essas limitações, entre aspas, que me foram dadas para compor 'O boi voador' acabaram, justamente, me fazendo voar musicalmente, com mais liberdades”, diz.
A encomenda lhe interessou desde o primeiro momento, conforme afirma. “Se Milhaud partiu do Brasil para compor 'O boi no telhado', eu quis inverter esse movimento, partir da França e de sua tradição musical para responder, do nosso tempo, àquele gesto modernista. Usei o piano a quatro mãos como símbolo dessa travessia conjunta, dialogando com o espírito boêmio e cosmopolita que unia artistas, gêneros e territórios no início do século 20”, conta.
A apresentação de “O boi voador” se dá em um programa que inclui “O boi no telhado” e “Le grand tango”, de Piazzolla. As obras de Mehmari e de Milhaud, ambas para piano a quatro mãos, serão executadas por Gustavo Carvalho e Cristian Budu, ao passo que a de Piazzolla fica a cargo do violoncelista Guillaume Martigné. “O público vai poder ouvir as duas peças para piano juntas. Fazer essa confrontação me pareceu muito interessante”, diz Carvalho.
“BOI DE LÁ, BOI DE CÁ: UM TELHADO REIMAGINADO”
Recital com Gustavo Carvalho, Cristian Budu e Guillaume Martigné executando obras de André Mehmari, Darius Milhaud e Astor Piazzolla, neste sábado (20/9), às 11h, no Largo de Sant'Ana, Centro histórico de Tiradentes. Acesso gratuito.
