Do bullying à aventura: estreia infantil de Morgana Kretzmann e Paulo Scott
Lançado na 13ª edição do Fliaraxá, ‘Clube Verde e a liga dos Solos’ traz heróis, ação e diversão para pré-adolescentes
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ARAXÁ (MG) – Morgana Kretzmann é uma autora visceral, que denuncia crimes ambientais sem cerimônia, com uma escrita densa e crua, indo direto ao ponto em temas dolorosos. Foi assim em “Ao pó” e “Água turva”. “Adoro escrever sobre crimes que têm tiros, facadas e sangue”, diz ela, bem-humorada.
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Já o marido, Paulo Scott, constrói narrativas com múltiplas camadas interpretativas, que pedem um mergulho mais paciente do leitor. Seus livros propõem reflexões sobre desigualdade social, violência de Estado, questões raciais, memória e história brasileira.
Da união dos dois escritores surgiu o improvável “Clube Verde e a Liga dos Solos”, estreia do casal na literatura infantil, lançado dentro da programação da 13ª edição do Festival Literário de Araxá (Fliaraxá). O livro sai pelo selo Escarlate, da Companhia das Letras.
Narrado pela protagonista Esperança, “Clube Verde e a Liga dos Solos” acompanha a história de um grupo de pré-adolescentes formado por ela, Clá, Nim e Joia. Rejeitados na escola, eles se unem para combater o bullying e decidem fundar o Clube Verde.
Como integrantes do clube, os quatro jovens conhecem os super-heróis da Liga dos Solos – Argipeso, Neosolo e Latosolo, todos inspirados em tipos de solo brasileiro – e são convocados a ajudá-los no resgate de um deles, sequestrado pelo terrível vilão Óculos Amarelo, fazendeiro que envenena suas plantações com agrotóxicos mortais.
Na tentativa de salvar o herói raptado, o Clube Verde e a Liga dos Solos enfrentam uma batalha contra os capatazes da fazenda antes de chegarem ao próprio vilão.
Amadurecendo a ideia
Morgana concebeu a ideia do livro em 2017. “É um assunto que eu já vinha tratando, mas queria escrever para pré-adolescentes”, contou em entrevista ao Estado de Minas, ao lado do marido, que complementou: “Afinal, nessa fase, a leitura pode reverberar até o fim da vida”.
O projeto, no entanto, só ganhou corpo quando a Companhia das Letras sugeriu que ela desenvolvesse algo voltado para o público infantojuvenil. Morgana resgatou a história que vinha elaborando e convidou Paulo para ser coautor. “Eu nunca tinha feito nada do gênero, só aceitei com a condição de escrever as cenas de ação”, revela o autor de “Marrom e amarelo”.
Por nunca terem trabalhado com literatura infantojuvenil, os dois reconheceram alguns tropeços durante a escrita. Em certos momentos, Morgana descrevia cenas excessivamente violentas; em outros, Paulo se alongava em reflexões sobre sentimentos e inseguranças da adolescência. Mas, juntos, identificavam os exageros e reescreviam a narrativa.
O casal participou de mesa-redonda no Fliaraxá, na tarde de quinta-feira (2/10), diante de um público formado majoritariamente por alunos da rede municipal, com cerca de 10 anos de idade. Entre brincadeiras e sorteios de brindes ligados a “Clube Verde e a Liga dos Solos”, o que mais chamou a atenção de Morgana e Paulo foi o número de crianças interessadas em escrever. Quando a escritora perguntou quem tinha o hábito de escrever, pelo menos 20 mãos se levantaram – havia cerca de 50 estudantes no auditório, cumpre dizer.
“O que mais me surpreendeu foram os temas que eles gostam de abordar: terror, ação, bullying. É fantástico. Principalmente levando em consideração que vivemos na era do TikTok, em que as coisas são cada vez mais rápidas e efêmeras”, concluiu Morgana.
* O jornalista viajou à convite do Fliaraxá