Brasileiros fizeram Fernanda Torres chegar ao Oscar, diz o presidente da Academia
Indicada ao troféu de melhor atriz, Torres perdeu para Mikey Madison, de 'Anora'; entretanto, 'Ainda Estou Aqui' venceu a categoria de filme internacional
Fernanda Torres ganhou projeção internacional recentemente. No dia 05/01, ela conquistou um feito inédito para o Brasil ao vencer o prêmio de Melhor Atriz em Filme de Drama no Globo de Ouro 2025.
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A campanha barulhenta dos brasileiros nas redes sociais pelo filme "Ainda Estou Aqui" ajudou mesmo Fernanda Torres a chegar ao Oscar este ano, diz Bill Kramer, presidente da Academia de Artes e Ciências Cinematográficas, entidade que elege os indicados e vencedores da premiação mais importante do cinema.
"O movimento certamente fez os votantes prestarem atenção no filme e na atuação dela", afirma ele ao receber a reportagem no enorme quarto do hotel de luxo onde está hospedado no Rio de Janeiro, à beira da praia de Copacabana. O americano veio ao país para participar do Festival do Rio, que exibe mais de 300 filmes na capital fluminense entre esta semana e a próxima.
Uma das sessões, na terça-feira, será de "O Agente Secreto", o filme escolhido pelo Brasil para tentar a sorte no Oscar do ano que vem. Dirigido por Kleber Mendonça Filho, o longa tem tido traçado boa trajetória nos festivais internacionais, mais ou menos como fez "Ainda Estou Aqui" - em Cannes, "O Agente Secreto" levou os prêmios de direção e de ator, para o protagonista Wagner Moura.
Kramer, porém, diz não poder comentar o filme nem qualquer outro que tenta uma vaga na corrida pelo troféu. Os indicados devem ser anunciados em janeiro.
Mas ele quis elogiar outra produção nacional. "'Ainda Estou Aqui' é uma obra-prima, lindo, cheio de coração. O tema do filme é relevante hoje para o mundo hoje. Fernanda é uma atriz excepcional, um ser humano adorável. Pude sentar com ela no último Oscar, foi uma noite maravilhosa."
Indicada ao troféu de melhor atriz, Torres perdeu para Mikey Madison, de "Anora". "Ainda Estou Aqui", entretanto, venceu a categoria de filme internacional, feito inédito para o Brasil, e rendeu ao país uma indicação ao troféu principal, de melhor filme, também pela primeira vez na história.
As conquistas foram celebradas pelos brasileiros, que enchiam as redes sociais da Academia do Oscar diariamente com pedidos pelas indicações, e depois, pelos prêmios.
"Ficamos sem entender o que estava acontecendo. Todos aqueles comentários em português, foi fantástico. Pensamos: 'é, estamos mesmo globais'", ele diz sobre a vez em que a Academia publicou uma foto de Torres no Instagram e recebeu 3 milhões de curtidas em poucos dias, muito mais que as imagens de celebridades como Demi Moore e Andrew Garfield.
O perfil da premiação aproveitou para fazer graça e comentou na postagem que Torres "é mãe", um jargão de internet usado para elogiar artistas mulheres.
A brincadeira ilustra uma vontade profunda da Academia - a globalização. Hoje formado por mais de 11 mil membros, o grupo de votantes tem cerca de 20% de pessoas fora dos Estados Unidos, número que aumenta todo ano, numa tentativa de aumentar as chances de vitória para filmes internacionais. Esse movimento ganhou força com a consagração do sul-coreano "Parasita" em 2020.
É o oposto do que almeja o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump. Ele anunciou, na última semana, que vai impor tarifa de 100% para filmes feitos fora do país que queiram ser exibidos por lá. "A nossa indústria de cinema foi roubada por outros países, como quem rouba 'doce de criança'", escreveu em sua rede social, a Truth Social.
Questionado sobre o movimento, Kramer diz que "a forma como as pessoas estão fazendo filmes é de natureza global, isso não vai mudar, só aumentar", sem citar o nome do presidente.
No entanto, somente "Young Americans" (1967) foi desclassificado após vencer o Oscar. A estatueta já havia sido entregue à direção do documentário quando este tornou-se inelegível.
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Ao longo da história centenária do Oscar, alguns filmes tiveram suas indicações revogadas por diversos motivos e em diferentes. "Stout hearts and willing hands" (1931), "Demônios do céu" (1941), "Caminhos ásperos" (1953) e "Alta sociedade" (1955) foram alguns deles.
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O grupo fez um trabalho pioneiro em psicoterapia de grupo sem liderança, produzindo um documentário vencedor do Oscar (Jornada em direção ao self) e em criminologia, empregando ex-infratores. Eram pesquisadores em estudos que levaram a grandes reduções na criminalidade em lojas de conveniência.
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Richard Farson foi um dos destaques do filme. Ele foi psicólogo, educador e presidente do Western Behavioral Sciences Institute, conhecido por seu trabalho inovador em diversas áreas como psicoterapia de grupo, direitos das crianças, liderança organizacional, educação a distância e design.
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O filme retrata uma sessão de terapia em grupo de 16 horas para oito pessoas bem ajustadas que nunca haviam se conhecido antes. A sessão foi liderada pelos psicólogos Carl Rogers e Richard Farson . Os participantes incluíram um caixa, um estudante de teologia, um professor, um diretor, uma dona de casa e três empresários.
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Quem recebeu a estatueta depois da desqualificação de 'Young Americans' foi o filme “Journey into self”, dirigido por Bill McGraw (“Fortaleza Proibida”), que ficou com o prêmio e está nos registros do Oscar.
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Young Americans’ entrou para a história como o único ganhador do Oscar que precisou restituí-lo, deixando uma marca curiosa e inusitada na trajetória do prêmio mais prestigiado do cinema mundial.
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A notícia da desqualificação de 'Young Americans' foi entregue de forma direta por Gregory Peck, o então presidente da Academia, que fez uma ligação para Grasshoff e Cohn, solicitando a restituição da estatueta.
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Alto, elegante, discreto e sumamente decente, Peck, que aprendeu a gostar de cinema com a avó, parecia ter herdado a aura dos heróis clássicos hollywoodianos que tanto admirava na infância. Ele morreu Los Angeles no dia 12 de junho de 2003, aos 87 anos. Segundo sua mulher Veronique, que estava ao seu lado, "ela estava segurando sua mão, ele fechou os olhos, dormiu e se foi".
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O jovem padre idealista de "As Chaves do Reino" (1944) e o repórter exemplar de "A Luz É para Todos" (1947), em sua denúncia do antissemitismo, também foram trabalhos reconhecidos com indicações ao prêmio da Academia.
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Gregory Peck era um daqueles atores cuja voz marcante, elegância e autenticidade parecem hoje um segredo que morreu com a grande era clássica do cinema. Ele protagonizou diversas adaptações cinematográficas realizadas a partir de grandes obras literárias, nas quais encarnou personagens heroicas, demonstrativas de seu valor na superação de sentimentos e incertezas.
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Além disso, presidiu a Academy de 1967 a 1970. Ele representava o último dos homens de bem numa época em que o bom-mocismo havia se tornado, em Hollywood, algo meio démodé. Logo se firmou como guardião dos ideais (perdidos) do "american way" e, à medida que pôde começar a escolher os filmes que iria protagonizar, passou a se ater cada vez mais a papéis edificantes
Reprodução do filme The Snows of Kilimanjaro / Domínio Público / commons wikimedia
O ator Gregory Peck nasceu em San Diego, no dia 5 de abril de 1916, e interpretou personagens de caráter nobre e corajoso, que lutam contra injustiças. O mais famoso destes é o advogado Atticus Finch do filme O Sol é Para Todos de 1962, que lhe deu o Oscar de melhor ator e que foi escolhido como o maior herói das telas pelo American Film Institute em maio de 2003
Domínio público
Gregory Peck foi o presidente da Academia de Artes e Ciências Cinematográficas em 1967. Dois anos depois, recebeu em 1969 a Medalha Presidencial da Liberdade, a maior homenagem a ser prestada pelo Governo dos Estados Unidos a um civil. Além disso, possui uma estrela na Calçada da Fama, localizada em 6100 Hollywood Boulevard.
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“Eu não sei porque eles [os produtores do documentário] não lutaram contra isso, porque o filme não tinha sido lançado.”, acrescentou.
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“O que aconteceu foi, era uma prévia de teste em uma cidade pequena tipo, na Carolinad o Norte”, explicou Madilyn Clark Grasshoff, esposa do diretor, em entrevista de 2008 para o Los Angeles Times.
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Já o “Young americans” acompanha um coro musical de Los Angeles enquanto os jovens se preparam para a turnê de outono pelos Estados Unidos.
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No dia seguinte, o Oscar mudou de dono e foi entregue aos produtores de “Journey into self”, dirigido por Bill McGraw (“Fortaleza Proibida”), que passou a constar nos registros oficiais como o vencedor daquele ano. O filme retrata uma sessão de terapia de grupo de 16 horas para oito pessoas bem ajustadas que nunca haviam se conhecido antes.
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“Young americans” recebeu a estatueta, na cerimônia realizada no dia 14 de abril. No dia 7 de maio, porém, o filme foi declarado inelegível ao ficar comprovado que ele havia sido exibido pela primeira vez em outubro de 1967.
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Contudo, poucas semanas depois que o longa dirigido por Alexander Grasshoff levou a estatueta para casa, a Academia descobriu que o documentário fora exibido em um cinema em 1967. Diante disso, Gregory Peck, o então presidente da Academia na época, fez uma ligação para o diretor e o produtor Robert Cohn, pedindo para que eles devolvessem o prêmio (via Collider).
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Para que um filme esteja apto para disputar um Oscar, a Academia exige que ele tenha sido comercializado nos cinemas no ano anterior ao da cerimônia. Young Americans precisaria, portanto, ter uma data de lançamento marcada em 1968.
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O fato aconteceu na edição de 1969 quando Young Americans, um longa sobre um grupo de coral formado por jovens que viajavam pelos EUA, ganhou a disputa na categoria de Melhor Documentário. Embora estivesse concorrendo ao prêmio naquele ano, a produção não havia sido lançada em 1968.
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Desde 1929, uma premiação anual da Academia de Artes e Ciências Cinematográficas é cobiçada por atores, diretores e produtores de Hollywood. A estatueta do Oscar é sempre um sonho para quem trabalha com cinema, porém um caso marcante e curioso fez um produtor devolver às pressas a premiação nos anos 60.
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Há cinco anos, o Oscar anunciou uma espécie de sistema de cotas para garantir que mais artistas não brancos, mulheres, LGBTQIA+, latinos e pessoas com deficiência estejam presentes em vários estágios de um filme que tenta concorrer ao prêmio, diante ou atrás das câmeras. As regras passaram a valer no ano passado.
Kramer veio ao Brasil com Meredith Shea, executiva que chefia essas iniciativas de diversidade da Academia. Perguntada sobre os efeitos das mudanças, ela foi positiva. "Estamos entusiasmados com a ampliação da nossa organização. É ótimo, por exemplo, estar um dia falando com um líder de festival de cinema brasileiro, que depois pode conversar com um editor de filmes de Nova York". Na sexta-feira (3/10), a dupla deu uma palestra no Rio sobre as ações de globalização e de atualização do Oscar.
Neste ano, a Academia criou uma regra que permite que cineastas refugiados, ou perseguidos politicamente, inscrevam seus filmes por meio de outro país sem perder a autoria ou identidade da obra.
Isso surgiu após o caso do diretor iraniano Mohammad Rasoulof, que fugiu do Irã e teve que inscrever "A Semente do Fruto Sagrado" como produção da Alemanha para concorrer ao Oscar de filme internacional. Mas o controle criativo ainda tem de estar nas mãos dos refugiados, a regra reforça.
Como checar isso na prática? "Estamos entendendo isso", diz Kramer. "Mas essa é uma alteração que vai ajudar quem está sob refúgio político, e queremos que as histórias deles sejam contadas."