
O mundo mudou e o Oscar, ainda que a passos lentos, vem aprendendo isso. Os quatro pr�mios que o sul-coreano Parasita recebeu na 92ª edi��o da cerim�nia da Academia de Ci�ncias Cinematogr�ficas de Hollywood, na noite do �ltimo domingo (9), em especial o trof�u principal, de melhor filme, celebram n�o somente os m�ritos (que s�o muitos) do longa-metragem de Bong Joon Ho, como tamb�m a diversidade que a sociedade atual tanto preconiza.
Nos �ltimos cinco anos, mesmo que a f�rceps – vide a campanha #OscarsSoWhite e o movimento #MeToo, desencadeado ap�s o esc�ndalo envolvendo as acusa��es de abuso sexual contra o produtor superpoderoso Harvey Weinstein, atualmente em julgamento – a Academia vem convidando novos integrantes. Hoje, s�o 8 mil e tantos membros – atores, diretores, produtores, toda a cadeia cinematogr�fica n�o apenas dos Estados Unidos, mas com participa��o, crescente, de profissionais do mundo inteiro.
“Sinto que um momento muito oportuno da hist�ria est� acontecendo agora”, afirmou a produtora de Parasita, Kwak Sin-ae. A vota��o que elegeu pela primeira vez desde 1929 uma produ��o n�o falada em ingl�s como a melhor do ano � tamb�m um reflexo disso. E os trof�us de melhor filme internacional, dire��o e roteiro original s� corroboram uma trajet�ria vencedora.
Em maio de 2019, Parasita recebeu seu primeiro pr�mio: o j�ri do Festival de Cannes o elegeu, por unanimidade, vencedor da Palma de Ouro. O filme virou um fen�meno pop – vai, inclusive, virar s�rie da HBO. O pr�mio de melhor elenco que o Sindicato dos Atores (SAG Awards) delegou � produ��o j� era um indicativo de sua prefer�ncia neste Oscar – os atores s�o o maior n�mero de votantes da Academia.
Taika Waititi, pelo roteiro adaptado de Jojo Rabbit, se tornou o primeiro maori (popula��o original da Nova Zel�ndia) a receber um Oscar. Mais uma bola dentro, j� que a hist�ria de um menino que se acha um nazista empedernido e tem Hitler como seu amigo (imagin�rio) � de uma delicadeza e intelig�ncia em sua s�tira que desmonta qualquer espectador mais reativo.
REPRESENTATIVIDADE
Mas o perfil americano branco – que pode afastar um p�blico jovem, que finca p� na inclus�o – ainda assombra a meca do cinema. A aus�ncia de representatividade feminina na categoria de dire��o e a p�fia participa��o negra entre os int�rpretes (apenas a atriz Cynthia Erivo, do filme Harriet, no qual interpreta uma escrava foi indicada), suscitaram cr�ticas desde o an�ncio dos indicados. E essa foi uma pauta importante da cerim�nia de premia��o.
“Celebramos todas as mulheres que dirigiram filmes fenomenais”, disparou Janelle Mon�e, em seu (fant�stico) n�mero de abertura, com m�sica e dan�a baseados em sua can��o Come alive, que, reescrita, fez refer�ncia a alguns dos filmes do ano. “Tenho orgulho de estar aqui como uma artista negra queer, contando hist�rias”, acrescentou ela.
Primeira mulher a vencer na categoria trilha sonora, a islandesa Hildur Guonad�ttir, que garantiu um dos dois pr�mios de Coringa, dedicou o trof�u “�s meninas, mulheres, m�es e filhas”. “Por favor, falem, precisamos ouvir suas vozes”, acrescentou a compositora. “Queremos ter mais representatividade na anima��o. Precisamos normalizar o cabelo dos negros”, destacou a diretora Karen Rupert Toliver, vencedora do curta de anima��o Hair love, sobre um pai que arruma, pela primeira vez, o cabelo crespo de sua filha.
Racismo, desigualdade de g�nero e direitos dos animais foram a t�nica de um dos discursos apaixonados da noite. Joaquin Phoenix expandiu a pr�pria fala no Bafta, que ele tamb�m venceu, uma semana antes, na qual criticou o “racismo sist�mico” e reconheceu ser “parte do problema”. “Acho que ficamos muito desconectados do mundo natural e muitos de n�s somos culpados de uma vis�o egoc�ntrica do mundo, da cren�a de que somos o centro do universo.” Ao final de seu discurso, ele personalizou a fala, fazendo seu mea-culpa (“Sou ego�sta, cruel, �s vezes dif�cil de trabalhar”) para homenagear seu irm�o, River Phoenix (1970-1993), morto os 23 anos, de overdose. “Quando ele tinha 17 anos, escreveu esta letra: 'Corra para o resgate do amor e a paz te seguir�'.”
Em uma encruzilhada – afinal, o streaming vai ou n�o dominar o cinema? –, a Hollywood dos dias de hoje entendeu, com as premia��es de 2020, que as mudan�as s�o irrevers�veis. O caminho � longo, mas o recado dado com os vencedores da 92ª edi��o mostrou que a ind�stria cinematogr�fica compreendeu o recado. (MP)
Divis�o social � o tema de Parasita
Em cartaz no Brasil desde 7 de novembro passado, Parasita se divide entre dois n�cleos – uma fam�lia muito rica e outra muito pobre, com a futura interven��o de um casal que seria a “classe m�dia” entre esses dois extremos. Inteligentes e habilidosos, os pobres deste roteiro original de Bong Joon Ho (premiado com o Oscar) v�o armando estratagemas para se empregar na casa dos ricos.
No momento em que seus artif�cios incluem substituir empregados da fam�lia, fica claro que Parasita encenar� um conflito em cascata – os desfavorecidos tentam chamar para si um pouco do conforto de que os privilegiados desfrutam, mas tamb�m se engalfinham com quem est� mais pr�ximo deles na pir�mide social, enquanto tentam escalar os degraus.
O maior predicado de Parasita talvez seja a habilidade com que Bong Joon Ho reveste a seriedade de seu tema, pr�pria dos filmes de autor, com a capa do cinema de g�nero. Mais precisamente, de g�neros, alternando entre os vocabul�rios da com�dia, do drama, do romance e do terror, sempre com grande desenvoltura.
Com uma assinatura pessoal no encadeamento dessa narrativa, o diretor demonstra, no entanto, que sabe rezar pela cartilha de Hollywood, como deixou claro em seu discurso de agradecimento pelo Oscar de dire��o, no qual homenageou Martin Scorsese como um mestre.
Muito se comentou sobre o fato de um filme t�o evidentemente apreciado pelos membros da Academia de Artes e Ci�ncias Cinematogr�ficas de Hollywood n�o ter obtido nenhuma indica��o nas categorias de interpreta��o. E a explica��o mais plaus�vel � que o elenco do longa n�o tem propriamente um protagonista, mas um conjunto extraordin�rio de atores, reconhecidos com o pr�mio de melhor elenco pelo Sindicato dos Atores norte-americano.
Se o resultado do Oscar 2020 pegou muita gente de surpresa, talvez tenha sido por falta de aten��o ao ano anterior. Roma, em que o mexicano Alfonso Cu�ron volta �s suas mem�rias de inf�ncia com foco na empregada ind�gena de sua fam�lia, levou os trof�us de melhor dire��o, fotografia e filme estrangeiro (categoria agora rebatizada como filme internacional). Entre suas sete indica��es, estava tamb�m a de melhor filme. Mas, diferentemente de Parasita, Roma conquistou seus admiradores mais pela raz�o do que pela emo��o. E, como o Oscar de 2020 assinalou, � no amor que somos todos iguais. (SA)
92º OSCAR
Confira a lista dos vencedores da edi��o 2020 do pr�mio da academia de artes e ci�ncias cinematogr�ficas de hollywood
Filme
Parasita
Dire��o
Bong Joon-ho (Parasita)

Ator
Joaquin Phoenix (Coringa)

Atriz
Ren�e Zellweger (Judy)

Ator coadjuvante
Brad Pitt (Era uma vez em... Hollywood)

Atriz coadjuvante
Laura Dern (Hist�ria de um casamento
Anima��o
Toy story 4
Fotografia
Roger Deakins (1917)
Document�rio
Ind�stria americana
Document�rio em curta-metragem
Learning to skateboard in a warzone
Filme internacional
Parasita (Coreia do Sul)
Cabelo e maquiagem
O esc�ndalo
Efeitos visuais
1917

Roteiro adaptado
Taika Waititi (Jojo Rabbit)
Roteiro original
Bong Joon Ho (Parasita)

Can��o
(I’m gonna) love me again (Rocketman)
Dire��o de arte
Era uma vez... em Hollywood
Figurino
Ador�veis mulheres
Montagem
Ford vs Ferrari
Trilha original
Hildur Gudnad�ttir (Coringa)
Curta de anima��o
Hair love
Curta
The neighbors' window
Edi��o de som
Ford vs Ferrari
Mixagem de som
1917