VEM AÍ A 2ª EDIÇÃO

Bienal da Gastronomia de BH retorna com programação mais plural e saborosa

Evento expande para outras regiões da cidade e, ao longo de duas semanas, convida o público a discutir temas relevantes e – por que não – comer

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Há quase seis anos, Belo Horizonte recebia o reconhecimento que mudaria o cenário de sua cultura alimentar: o título de “Cidade Criativa da Gastronomia”, concedido pela Organização das Nações Unidas para a Educação, Ciência e Cultura (Unesco), em 2019. Uma das grandes ações do poder público para ressaltar essa conquista é a Bienal da Gastronomia de Belo Horizonte, que chega à segunda edição a partir desta quarta-feira (15/10).


Realizado pela primeira vez em 2023, o evento evidencia as diversas faces da culinária de Minas Gerais, com uma programação que vai muito além da comida propriamente dita. O objetivo continua a ser o mesmo, mas a programação foi modificada para que seja ainda mais democrática e saborosa. Entre as novidades, estão atividades que convidam o público a experimentar pratos e a expansão para a Região Norte, em um movimento de descentralização da gastronomia.


Bárbara Menucci, presidente da Belotur, realizadora da Bienal, diz que a iniciativa aponta para três pontos-chave. “Precisamos destacar nosso trabalho com a segurança alimentar, com os restaurantes populares; a própria cultura alimentar da cidade, os encontros à mesa, o afeto, a nossa mistura de sabores; e precisamos pensar ainda na gastronomia como forma de promoção turística da cidade.”


Como ela destaca, o evento não se restringe ao que conhecemos por “gastronomia”, como o uso mais “pomposo” dos alimentos. “Usamos o termo ‘gastronomia’ por ele ser universalmente conhecido e utilizado por cidades mundo afora, mas, na verdade, falamos de cultura alimentar. Inclusive, o reconhecimento da Unesco não vem pelo prato refinado, vem pela estrutura de políticas públicas da cidade”, explica Bárbara.


No fim das contas, ela pondera, a nossa base, nossa comida e nosso jeito de fazer são muito importantes para – aí sim – a gastronomia contemporânea que vem surgindo com força na cidade.

Mais atividades


A próxima edição da Bienal promete mudanças e incrementos na programação. O Fórum da Gastronomia deste ano, que é uma das principais atrações, vai contar com novas vozes, temas e atividades. “Queremos que ele seja um lugar de trocas, de discussões, mas também que as pessoas se sintam envolvidas de fato, que elas possam experimentar a comida”, explica Bárbara.


Em cada painel, um tema é debatido por profissionais inseridos no contexto gastronômico, tendo em vista o objetivo de democratizar o debate. “Convidamos chefs, cozinheiros e cozinheiras, aqueles que se dizem ‘fazedores’, produtores…”, destaca a presidente da Belotur.

Sem geladeira


O painel “Raízes na panela: a força da tradição” vai reunir nomes importantes para a construção da nossa cozinha. Cidinha Santiago está entre eles. Culinarista nascida em Minas, ela leva tão à sério a tradição que vive até sem geladeira. “Tenho linguiça, torresmo e outras carnes na banha, todos os tipos de conservas e geleias que você imaginar, tudo debaixo da minha pia”, conta ela, exalando sabedoria.

Representante da cozinha mineira raiz, Cidinha Santiago tem no livro de receitas a picanha suína com geleia de ipê amarelo e compota de laranja kinkan
Representante da cozinha mineira raiz, Cidinha Santiago tem no livro de receitas a picanha suína com geleia de ipê amarelo e compota de laranja kinkan Cidinha Santiago/Divulgação


Essa cozinha de raiz, como ela mesmo diz, será o principal tópico da sua apresentação na Bienal. “Vamos falar das nossas raízes, dos nossos ancestrais, da cozinha dos orixás. Fico muito feliz de passar isso para os jovens”, diz Cidinha, reforçando a importância do resgate daquela matriz culinária que foi, de certa forma, apagada ou “embranquecida”: a negra.


Referência lisboeta


Por falar em memória e apagamento, o painel “Do prato à memória: comida como patrimônio cultural” vai reforçar o valor identitário, nutricional e sensorial da nossa cozinha.


Um dos convidados para falar sobre o assunto é o chef Vítor Sobral, referência na culinária portuguesa e dono de três restaurantes. Um deles, a Tasca da Esquina, tem uma unidade em São Paulo, o que faz com que ele venha com frequência ao Brasil – cerca de cinco vezes ao ano.

'Quem vai à Belo Horizonte não quer comer o que se come em Lisboa ou em Paris' - Vítor Sobral, chef de Lisboa
'Quem vai à Belo Horizonte não quer comer o que se come em Lisboa ou em Paris' - Vítor Sobral, chef de Lisboa Carvoaria/Divulgação


No restaurante, o chef trabalha com pratos que mesclam a tradição de Portugal com um toque contemporâneo. O robalo marinado com tomate assado, cebola roxa e mirtilos é um dos preparos servidos por lá. Quem gosta mais dos clássicos pode ser atendido pelo tradicional bacalhau à brás, com batata-palha, cebola, ovos e azeitonas pretas.


Sua outra casa, a Carvoaria, em Lisboa, opta pelo mais tradicional. O frango na púcura (preparado em uma panela de barro que leva este nome), típico lusitano, é uma das iguarias. A Taberna da Esquina, outro restaurante na capital portuguesa, é especializado em petiscos, como as clássicas pataniscas de bacalhau (espécie de bolinhos fritos de bacalhau desfiado, comumente servidos com arroz).

Cozinha “maravilhosa”


Vítor conta que faz tempo que não pisa em BH, mas não se esquece da qualidade da comida regional de Minas. “Vocês brasileiros têm o hábito de valorizar aquilo que vem de fora e não valorizar o que vocês têm. E essa cozinha original e regional é maravilhosa, uma das melhores coisas que o Brasil têm”, destaca.

O frango na púcura, nome da panela de barro onde chega à mesa, é uma das iguarias lusitanas do restaurante Carvoaria
O frango na púcura, nome da panela de barro onde chega à mesa, é uma das iguarias lusitanas do restaurante Carvoaria Carvoaria/Divulgação
 


O chef adianta que vai levar essa provocação para a sua fala. “Quem vai à Belo Horizonte não quer comer o que se come em Lisboa ou em Paris. É claro que restaurantes internacionais devem existir, mas a maioria deveria valorizar o que é regional.”


Depois completa: “É isso que vou tentar levar como mensagem à Bienal: temos que comer aquilo que os avós, as mães, as tias faziam. Hoje temos conhecimento técnico e informação que elas não tinham, mas esse conhecimento técnico não pode substituir, ele tem que valorizar o que já era feito. A matriz é fundamental.”

Receitas criativas


Profissionais que utilizam novas técnicas e dão novos traços ao regional vão compor o painel “Receitas em revolução: cozinhas criativas”. O chef e cozinheiro Gui Poulain é um dos nomes escalados para a conversa e reflete sobre o trabalho de outras participantes, a exemplo de Isabela Rocha, a Rochinha, que representa o Bar Pirex, e Ana Clara Valadares, à frente do Tom, ambos no Centro de BH.

Em seu blog, Gui Poulain apresenta receitas criativas que cabem no dia a dia das pessoas, como sopa de macarrão e missô
Em seu blog, Gui Poulain apresenta receitas criativas que cabem no dia a dia das pessoas, como sopa de macarrão e missô Gui Poulain/Divulgação


“Hoje é difícil usarmos o termo ‘comida afetiva’, mas sinto que isso está de fato muito presente na culinária mineira. Nesse painel, quero falar sobre uma comida que conforte, que lembre a infância, mas que seja nova”, revela.


Gui tem um blog de receitas e diz que vai expor também aquilo que se tornou uma premissa sua. “Meu trabalho é levar ideias de receitas mais criativas para as pessoas, mas com utensílios que elas tenham em casa. Apresentar receitas novas que caibam no dia a dia delas, que não gastem muito tempo, não sujem muito…”, destaca. Bolo de limão com mirtilo e sopa de macarrão e missô são alguns exemplos.

Descentralização


Em meio à vasta programação da Bienal, também se destaca o esforço de englobar outros pontos da cidade, descentralizando o gastronômico belo-horizontino.


A Regional Norte vai receber a programação “Sabores da Norte”, com um dia inteiro de música, brincadeiras e, claro, delícias. Três chefs vão participar de cozinhas-show, momento em que ensinam uma receita para o público, que depois pode degustá-la. Caio Roger é um deles e vai levar para o evento o carro-chefe do seu delivery: banoffee.

A banoffee de Caio Roger, carro-chefe do seu delivery, será um dos destaques da cozinha-show na Região Norte de BH
A banoffee de Caio Roger, carro-chefe do seu delivery, será um dos destaques da cozinha-show na Região Norte de BH Caio Roger/Divulgação


A torta com base de biscoito, recheio de doce de leite, rodelas de banana e coberta com chantili de Leite Ninho apareceu na vida do chef em 2020 e o ajudou, no momento da pandemia, a conseguir uma renda extra. “Vou preparar essa receita porque ela me fez entrar no mundo da gastronomia, foi com ela que tudo começou”, diz Caio, que hoje trabalha com outras variações da torta, além de outras sobremesas, incluindo pudim e fatias de bolos limão siciliano e nozes com chocolate, entre outros.


“A nossa ideia é trabalhar na questão imersiva, sensorial, descentralizada, valorizando cultura popular e o encontro das regionais”, comenta Bárbara Menucci, presidente da Belotur, reforçando o compromisso de levar a gastronomia de outros lugares para um espaço de protagonismo.


Intercâmbio de sabores


É por meio do diálogo e das trocas que se avança. Pensando nisso, a Belotur propõe o intercâmbio da capital mineira com outros municípios brasileiros detentores do título de “Cidade Criativa da Gastronomia”. Este encontro é parte da programação da Bienal da Gastronomia.


O Edifício Central, ao lado da Praça da Estação, no Centro, será palco do encontro de quatro chefs, cada um representando a sua cidade: além de BH, Florianópolis (SC), Belém (PA) e Paraty (RJ).

'Muitos restaurantes usam produtos locais, nós valorizamos o que é nosso' - Eduardo Diniz, chef de Paraty
'Muitos restaurantes usam produtos locais, nós valorizamos o que é nosso' - Eduardo Diniz, chef de Paraty Nina Capovilla/Divulgação


Eduardo Diniz é sócio e chef do restaurante de culinária japonesa Fugu, em Paraty. “Sou de São Paulo, mas moro em Paraty desde os meus 20 anos. Com 14, comecei a trabalhar como ajudante de um senhor que trabalhava com culinária japonesa ao lado da peixaria que meu pai era dono”, destaca o chef, que sempre se dedicou à comida do Japão.


Lá, ele serve apenas pescados locais, com exceção do atum. “Acho que isso é uma forma de Paraty se posicionar. Muitos restaurantes usam produtos locais, nós valorizamos o que é nosso”, destaca.


Segundo Eduardo, o Festival Gastronômico de Paraty, que acabou de ser realizado, chamou a atenção para o diálogo entre Cidades Criativas da Gastronomia. “Essa união é fundamental. Sabemos que a alimentação é um setor que precisa muito do turismo, é uma luta diária.”


A presidente da Belotur, Bárbara Menucci, destaca, inclusive, a importância da ligação entre os municípios. “Nesse intercâmbio, temos uma troca de políticas públicas, vemos o que funciona em cada cidade”, diz, destacando que muitos projetos de BH podem ser referência para outras cidades.

Niguiri de milho


Paraty será representada pela culinária japonesa de Eduardo. Ele vai trazer uma oficina de temakis (cones de alga recheados com arroz e peixes) de atum com maionese kewpie (japonesa) e pimenta sriracha. Também vai participar de uma cozinha-show preparando niguiri (peça com base de arroz) de milho com manteiga e flor de sal, o “xodó do Fugu”.


Quem vai representar Belém no evento é a chef Fernanda Souza, com o prato Maniçoba, ensopado típico do Pará feito com mandioca-brava. Janete Borges, por sua vez, apresentará Florianópolis com o Vichyssoise (creme francês à base de cebola, batata e alho-poró) do mar, preparado com ostras e azeite de ostra defumado.


Já os sabores de BH serão servidos pela chef Yasmin Santos, que vai fazer um pernil cozido no vinho com compota de jabuticaba, angu cremoso, couve refogada e farofa de torresmo.

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Os pratos poderão ser degustados pelo público em pequenas porções. Não é preciso retirar ingresso, mas o evento estará sujeito à lotação.

*Estagiária sob supervisão da subeditora Celina Aquino

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