O Sindifisco-MG (Sindicato dos Auditores Fiscais da Receita Estadual de Minas Gerais) denunciou um mecanismo de sonegação fiscal no setor minerário que tem causado perdas bilionárias ao estado. Conforme dossiê divulgado pelo sindicato, Minas Gerais perde anualmente ao menos R$ 2,2 bilhões em CFEM (Compensação Financeira pela Exploração de Recursos Minerais).

 

As principais estratégias identificadas para a sonegação fiscal na mineração são o subfaturamento das exportações e a omissão da produção. Esse primeiro mecanismo consiste em uma triangulação de documentos onde a mineradora vende seu produto abaixo do valor de mercado para uma subsidiária baseada em um paraíso fiscal. Essa subsidiária revende esse minério com preço real para o cliente final, reduzindo os royalties a serem pagos no Brasil.

De acordo com o Sindifisco-MG, esse artifício foi identificado em exportações de minério de ferro, causando um prejuízo estimado de R$ 3,29 bilhões entre 2009 e 2015 e entre 2017 e 2020. O estudo do sindicato ilustra esta prática ao constatar que, embora os principais destinos físicos do minério de ferro brasileiro entre 2017 e 2020 tenham sido a China, a Malásia e o Japão, quase 90% do valor exportado foi adquirido por empresas sediadas na Suíça, país utilizado como intermediário financeiro.

Já na omissão de produção, as mineradoras se aproveitam do benefício da autodeclaração, tanto no valor quanto no volume do produto, proporcionado pela falta de fiscalização dessas empresas, e vendem seu minério "por fora”, sem o recolhimento da CFEM e outros impostos. Outra forma de sonegar é fazer a mistura de minério ilegal com o de produção legal, estratégia muito utilizada com o ouro extraído clandestinamente, que é "esquentado" com notas fiscais de lavras legalizadas, evitando os impostos devidos sobre o ouro ilegal.

As grandes mineradoras ainda sonegam impostos utilizando engenharia societária e contábil para diluir lucros e contornar a incidência de tributos, assim como disputas jurídicas protelatórias para postergar pagamentos devidos. Na análise do Sindifisco-MG, todas as faixas de empresa praticam a sonegação. As pequenas mineradoras muitas vezes não pagam nada, enquanto as médias recolhem apenas parte do que devem, e as grandes utilizam brechas legais e recursos administrativos para reduzir ou adiar ao máximo o pagamento.

Entre os fatores apontados pelo Sindifisco MG para contribuir para tamanha sonegação fiscal na atividade minerária estão o “desmonte” da Secretaria de Estado da Fazenda de Minas Gerais (SEF-MG) pelo governo estadual e a estrutura precária da Agência Nacional de Mineração (ANM), que não dispõe de sistemas automatizados para cruzar os dados de produção declarados com informações de outros órgãos, como relatórios de lavra, notas fiscais ou registros aduaneiros. Com isso, as empresas aproveitam a falta de integração das bases de dados para declarar valores incorretos sem serem detectados.

Auditorias do Tribunal de Contas da União (TCU) e da Controladoria-Geral da União (CGU) indicam que 40% do valor devido de CFEM não é recolhido, percentual que pode chegar a 50% no período mais recente, entre 2019 e 2023, quando foram arrecadados R$ 35 bilhões em royalties da mineração, sendo que o mesmo valor deixou de ser recolhido.

Entre os anos de 2014 e 2021, aponta o TCU, a subdeclaração de valores levou à sonegação em CFEM de cifras entre R$ 9,4 bilhões e R$ 12,4 bilhões. Neste mesmo período, R$ 4 bilhões em CFEM foram perdidos por prescrição de débitos. Se levar em consideração todos os tributos e royalties que deixaram de ser arrecadados entre 2013 e 2020, a soma alcança R$ 16,4 bilhões. Esses valores também são do TCU.

O mesmo TCU apurou que quase 70% dos entes que possuem o direito de explorar recursos minerais no Brasil entre 2017 e 2022 não pagaram espontaneamente a CFEM. Nas poucas fiscalizações que ocorreram, apenas 40% dos empreendimentos auditados de fato recolheram os tributos após a autuação.

Além de uma melhoria na fiscalização, o Sindifisco-MG propõe a criação da CIDE Mineral, uma Contribuição de Intervenção no Domínio Econômico nos moldes da CIDE do Petróleo, moldada nos princípios constitucionais e inspirada em práticas internacionais, para reformar profundamente a tributação do setor de mineração.

A CIDE Mineral incidiria sobre a receita bruta da produção mineral beneficiada, com alíquotas diferenciadas por tipo de minério (7% para minério de ferro, 6% para a maioria dos outros, 2% para ouro), de forma a elevar significativamente a arrecadação do setor. A estimativa é uma receita de aproximadamente R$ 16,3 bilhões anuais, mais que dobrando os atuais níveis de royalties da mineração. Esse recurso seria repartido majoritariamente (95%) entre estados (70%) e municípios produtores e afetados (25%), aliviando as perdas com a Lei Kandir (que isenta o ICMS das exportações) e fomentando investimentos locais em diversificação econômica e reparação de danos ambientais.

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De acordo com a deputada estadual Bella Gonçalves (PSOL), a denúncia do Sindifisco-MG será levada para o TCU: “É absurdo que a gente tenha uma ANM tão desestruturada, com apenas quatro fiscais para cuidar de todo o processo de pagamento de tributos das mineradoras”.

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