ALEIJADINHO DO RJ

Mestre Valentim: um mineiro iluminado

Mineiro do Serro, o escultor, entalhador, arquiteto e urbanista merece todas as homenagens nos 280 anos do seu nascimento

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Nossa história ainda tem muitos artistas desconhecidos da maioria da população. Grandes nomes, dignos de toda reverência. Entre eles, Valentim da Fonseca e Silva (1745-1813), natural do Serro, antiga Vila do Príncipe. Estudiosos da arte colonial brasileira consideram Mestre Valentim, que viveu na cidade natal até os três anos, morou em Portugal e depois se estabeleceu na capital fluminense, o “Aleijadinho do Rio de Janeiro”, com trabalhos em pedra (mármore e granito), metal e madeira, alguns de destaque no Jardim Botânico da antiga capital do Brasil.


No próximo dia 12, o autor de obras públicas e religiosas será lembrado durante as atividades da Noite Mineira de Museus e Bibliotecas. A programação, parte do “Agosto das Artes”, será na sede do Instituto Estadual do Patrimônio Histórico e Artístico de Minas Gerais (Iepha-MG), em Belo Horizonte.


No Brasil, Valentim atuou especificamente no Rio, trabalhando com um Barroco tardio, o rococó e o clássico (o classicismo, que chegou oficialmente ao Brasil com a missão francesa, em 1816, se caracterizava pela harmonia, simetria, serenidade das expressões, sequência rítmica e valores greco-romanos). O artista teve formação portuguesa e clientela no Rio, onde foi autor do projeto original do Passeio Público, primeiro jardim aberto à população da cidade que guarda o busto do artista em bronze.


Recentemente, visitei o espaço e pesquisei mais sobre o legado do mestre. Mais do que curioso, fui conhecer outras obras. Ele construiu chafarizes e fontes para abastecimento da população e das embarcações que ancoravam no porto, e trabalhou nas igrejas São Francisco de Paula, Santa Cruz dos Militares, Nossa Senhora da Conceição e Boa Morte, Mosteiro de São Bento e Ordem Terceira do Carmo.


Terra natal

Minas não tem obras do artista, apenas uma cópia em bronze (feita do molde original). A peça original – Ave pernalta –, esteve inicialmente no Convento das Clarissas, no Rio, depois na Praça Cardeal Arcoverde e no Passeio Público até ser transferida para o Jardim Botânico, na mesma cidade. A cópia da escultura de uma garça foi feita na década de 1960 pelo fundidor Zani, tendo sido adquirida pelo Instituto Brasileiro de Museus (Ibram), com o patrocínio da CBMM, e instalada no jardim do Museu Casa dos Ottoni, no Serro, em 2014.


Também na cidade da Região Central de Minas está a casa (imóvel particular), onde o artista nasceu. Já a unidade do Centro de Atendimento Psicossocial (Caps) recebeu o nome de Mestre Valentim.


Vida e obra


Filho de um português contratador de diamantes e de uma negra, Valentim foi levado pelo pai, em 1748, a Portugal, onde ficou até os 25 anos. Em terras lusitanas, aprendeu o ofício de escultor e entalhador. O nome do artista aparece pela primeira vez como entalhador na obra de decoração da Igreja da Ordem Terceira do Carmo, em 1772, como discípulo de Luís da Fonseca Rosa. A talha dourada sobre fundo claro do retábulo-mor é amplamente decorada com motivos rococós como guirlandas, buquês de flores, laços e cabeças de querubins. Os anjos-meninos se caracterizam pelo rosto arredondado, feições levemente amulatadas, bochechas e olheiras marcadas, lábios com contornos definidos, pescoço grosso e curto, olhos saltados e caídos, cabelos abundantes e fios marcados.


Na capela do noviciado da Ordem, cuja decoração foi executada entre 1773 e 1780, Valentim apresenta todos os elementos de seu estilo. Trata-se de um salão de planta retangular e teto abobadado revestido de talha dourada sobre fundo branco, formando uma unidade decorativa ímpar. No âmbito da arte civil, foi responsável tanto por obras de embelezamento público quanto de saneamento e abastecimento de água. Os estudiosos ressaltam que, de todos os projetos, o mais marcante é o conjunto formado pelo Passeio Público, além do Chafariz das Marrecas, de 1785 e destruído em 1896. Nesse, ele se reportou às ideias iluministas de bem-estar, civilidade, higienização e progresso. Em 1789, Valentim trabalhou na reconstrução do prédio do Recolhimento do Parto, que sofrera um grande incêndio.


Quatro esculturas de autoria de mestre Valentim – as primeiras obras de arte fundidas no Brasil – se encontram no Jardim Botânico do Rio. São elas: Eco, Narciso e duas aves pernaltas, esculturas originalmente projetadas para o Chafariz das Marrecas e o Chafariz do Jacaré. No Século 19, as fontes serviram para abastecer a cidade de água e embelezar o Passeio Público.

Dom Viçoso, sétimo bispo de Mariana e nome de destaque na educação em Minas,
Dom Viçoso, sétimo bispo de Mariana e nome de destaque na educação em Minas, BETO MATEUS/ESP. EM


Primeira cidade de Minas celebra...

Outro personagem ilustre recebe reverência à memória, desta vez em Mariana, na passagem dos 150 anos do seu falecimento. Trata-se de dom Antônio José Ferreira Viçoso (1787-1875), o Dom Viçoso, sétimo bispo de Mariana e nome de destaque na educação em Minas, sendo diretor do antigo Colégio do Caraça. A reverência à memória incluiu a tradicional peregrinação ao Morro da Cartuxa, ponto distante seis quilômetros do Centro da primeira vila, diocese e cidade do estado. No local onde viveu e morreu Dom Viçoso, há uma modesta casa e um cruzeiro. O nome Cartuxa se refere à ordem religiosa (os monges cartuxos vivem em clausura) fundada por São Bruno, no Século 11, de quem dom Viçoso era devoto.

...o legado de Dom Viçoso

Bispo da diocese de Mariana (atual arquidiocese) de 1844 a 1875, o português Dom Viçoso ingressou no noviciado da Congregação da Missão, em Lisboa, em 1811, e foi ordenado padre lazarista sete anos depois. Veio de Portugal para fundar missões na então província de Mato Grosso, mais tarde dirigindo o Caraça (hoje Santuário do Caraça, em Catas Altas). Educação sempre esteve no seu foco. Em 1848, trouxe da França as irmãs vicentinas para criar, em Mariana, o Colégio Providência, primeira escola feminina de Minas. Em processo de canonização, Dom Viçoso recebeu, em 2014, o título de Venerável, em reconhecimento a suas virtudes heroicas.

Parede da memória

Na década de 1990, a comunidade de Itatiaia, em Ouro Branco, sofreu um violento baque no seu patrimônio cultural e espiritual. Foram furtadas mais de 20 peças, incluindo a imagem de Nossa Senhora do Rosário, mostrada na foto ao lado. Inconformados, mas sem perder a esperança, moradores fazem sucessivas campanhas para tentar resgatar os bens pertencentes à Matriz Santo Antônio, do Século 18, e fortalecer a educação patrimonial. A iniciativa mais recente, sob a liderança da Fomentarte, está no projeto “Mobilizados pelo Patrimônio – Educação Patrimonial”, aprovado pelo edital 01/2024 da Política Nacional Aldir Blanc de Fomento à Cultura (PNAB), com apoio do Ministério da Cultura, Prefeitura Municipal de Ouro Branco e Associação Sociocultural Os Bem-Te-Vis. Mais informações no site osbemtevis.org.br

Cores originais

No próximo dia 30, às 19h, no Museu Casa dos Contos, em Ouro Preto, haverá duplo lançamento: do livro e do documentário “As cores originais – Um estudo sobre Ouro Preto”. Ambos resultam do projeto “As cores originais – Estudo para identificação da paleta de cores das fachadas de Ouro Preto”, desenvolvido em 2024 e 2025 pelo instituto Ambiental Pesquisas e Projetos e pela empresa A Pique Arquitetura e Memória. A obra traz informações sobre a exploração e o uso da cal e de pigmentos minerais em OP, além de orientações para a escolha dos tons das fachadas de imóveis do Centro Histórico. Projeto realizado com apoio da Plataforma Semente, Coordenadoria de Patrimônio Cultural (CPPC) e Centro de Apoio Operacional de Defesa do Meio Ambiente (Caoma) do Ministério Público de Minas Gerais.

Preservação dos bens

Os presidentes da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), dom Jaime Spengler, e do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan), Leandro Grass, assinaram um Acordo de Cooperação Técnica. Trata-se da renovação de um documento já firmado entre as instituições, em 2021, para ações conjuntas de preservação e valorização do patrimônio cultural material da Igreja Católica. Segundo o presidente da Comissão Episcopal para a Cultura e Educação da CNBB, dom Gregório Paixão, o novo acordo trata de desafios e alternativas para recuperação e manutenção dos acervos, incluindo a possibilidade de um fundo nacional para preservação de prédios históricos, Igrejas e obras de arte.

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Arte em barro feita pelas mulheres do Vale do Jequitinhonha
Arte em barro feita pelas mulheres do Vale do Jequitinhonha STELLA FIGUEIREDO/ CAP/DIVULGAÇÃO

Patrimônio cultural

“Tramas de afeto” é o nome da mostra em cartaz, até 7 de setembro, no Centro de Arte Popular (CAP), na Praça da Liberdade, em BH. Em destaque, a arte em barro feita pelas mulheres do Vale do Jequitinhonha. Em 2018, a atividade se tornou Patrimônio Cultural Imaterial de Minas. Idealizada pelo coletivo de curadoras formado por Anna Carolina Oliveira, Bia Pimentel, Deise Joana Tomé da Silveira e Stella de Figueiredo Silveira, a exposição apresenta um conjunto de cerâmicas e destaca o protagonismo feminino e a tradição familiar. O visitante verá obras de Aneli, Glória Maria Andrade, Irene Gomes, Maria Lira, Mercinda S.B. e Amadeu S.B, Noemisa Batista dos Santos Placidina, Raimunda de Almeida Martins, Zezinha, Girlande Damásio Viana, João Alves, João Pereira de Andrada e Tunay Xavier. Entrada gratuita.

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