Depois de suspender temporariamente os atendimentos a pacientes não críticos por causa da superlotação, o Hospital Risoleta Tolentino Neves retomou gradualmente os atendimentos no pronto-socorro. No entanto, a unidade ainda opera bem acima da capacidade, o que pode resultar em tempo de espera prolongado nesta terça-feira (15/7)  para os casos classificados como menos graves. 

Nesta manhã, 141 pacientes estavam em atendimento no setor de pronto-atendimento, número 56% superior à capacidade máxima, que é de 90 pacientes simultâneos. Na véspera, o hospital chegou a 181 pessoas sendo assistidas no local, o que motivou a suspensão parcial e o atendimento restrito apenas a situações de emergência. Os atendimentos foram retomados gradualmente ao longo da noite, segundo a instituição. 

A unidade, na Região Norte de Belo Horizonte (MG), é referência para casos de alta complexidade para a capital e municípios da Região Metropolitana. A demanda crescente, associada a problemas estruturais e de financiamento, tem agravado o cenário de colapso nos últimos anos. A superlotação, como mostrou reportagem do Estado de Minas em maio, tem se tornado um problema crônico, agravado pela sobrecarga regional. 

Essa foi a terceira vez, apenas em 2025, que o Risoleta precisou interromper parcialmente os atendimentos por não conseguir dar conta da demanda. Em janeiro, a suspensão foi determinada após o pronto-socorro atingir 171 pacientes, quase o dobro da capacidade. Mesmo no dia seguinte, o hospital ainda contabilizava 124 pessoas em atendimento. Foram três dias sem conseguir absorver novos casos. Em abril, o problema se repetiu

Diante da pressão crescente, o Risoleta tem adotado medidas internas de mitigação. Entre elas, a contratação de médicos emergencistas, o remanejamento de equipes conforme a demanda, a reorganização dos espaços no pronto-socorro e a realização de reuniões multidisciplinares para ajustar os fluxos de atendimento. 

Crise estrutural e financeira 

Por ser o único hospital da Regional Venda Nova com portas abertas 24 horas para urgência e emergência, o Risoleta virou a principal referência para dezenas de bairros e ainda absorve parte da demanda de municípios da Grande BH. Dos atendimentos prestados, 42,5% são destinados a pacientes de fora de Belo Horizonte, segundo dados da instituição. 

Em reportagem publicada no Estado de Minas em maio deste ano, a administração do hospital atribui parte da sobrecarga à função regional que o Risoleta cumpre. “Devido ao vazio assistencial nessas cidades e às dificuldades de acesso à saúde, a população tem o Risoleta como principal referência, o que sobrecarrega ainda mais a assistência”, pontuou a administração. 

À época, sobre o risco de novas suspensões ao longo do ano, a instituição admitiu que não há como prever. “Tudo depende do cenário. Por isso, temos mantido diálogo constante com os gestores estadual e municipal de saúde, em busca de soluções conjuntas para lidar com essa pressão”, afirmam. 

Inaugurado em 1998 como pronto-socorro da região de Venda Nova, o Risoleta ficou mais de uma década com obras inacabadas. Só foi efetivamente aberto ao público anos depois, com a proposta de se tornar o “João 23 do Norte”, em alusão ao Hospital de Pronto-Socorro da Região Centro-Sul de BH. Desde 2006, a gestão passou a ser responsabilidade da UFMG (Universidade Federal de Minas Gerais), por meio da Fundep, em um convênio tripartite entre União, estado e município. 

No início da nova fase, o hospital viveu um momento de excelência. Os recursos garantiam a contratação de professores e ex-alunos da UFMG, com salários um pouco acima da média do SUS, o que formou um corpo clínico altamente qualificado. Mas esse cenário de estabilidade se deteriorou com o tempo. 

Segundo o endocrinologista pediátrico e diretor do Sindicato dos Médicos de Minas Gerais (Sinmed-MG), Cristiano Túlio Maciel Albuquerque, o modelo de sucesso foi corroído pela estagnação dos repasses. “Os investimentos iniciais não foram atualizados”, afirma o médico. Hoje, mesmo sendo a unidade que mais recebe verba do governo estadual, o hospital enfrenta um déficit mensal superior a R$ 2 milhões. A conta só fecha com emendas parlamentares e aportes esporádicos, medidas que, na prática, não garantem estabilidade. 

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Cristiano ressalta que a defasagem salarial também contribuiu para a perda de bons profissionais. “Ou os reajustes são abaixo da inflação, ou só cobrem a inflação. Assim, o hospital vai perdendo gente qualificada e não consegue repor.” A estrutura física, por sua vez, também sofre com a falta de investimentos duradouros. Obras pontuais até foram realizadas com verbas parlamentares, mas a organização das equipes e o espaço físico seguem comprometidos.

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