O policial penal escalado para fazer dupla com Euler Pereira da Rocha, de 42 anos, que morreu em serviço durante escolta a um detento em tratamento de saúde na madrugada de domingo (3/8), está sendo formalmente investigado pela Corregedoria da Secretaria de Estado de Justiça e Segurança Pública de Minas Gerais (Sejusp). Até o fim da tarde de ontem, ele não havia retornado ao trabalho nem se apresentado para prestar esclarecimentos, informou a Sejusp. 

Pai de três filhos, de 5, 13 e 18 anos, Euler foi assassinado com dois tiros no Hospital Luxemburgo, localizado no bairro de mesmo nome, na Região Centro-Sul de Belo Horizonte. 

Ainda segundo a nota da Sejusp, no sábado, por duas vezes, a equipe de fiscalização do Departamento Penitenciário (Depem-MG) esteve no Hospital Luxemburgo e confirmou a presença de dois servidores escalados para a escolta do preso Shaylom Cristian Ferreira Moreira, de 24 anos, “conforme preconiza o protocolo”.

O texto detalha que essas fiscalizações ocorreram às 8h50 e às 20h30 e reforça o compromisso da Sejusp “com a integridade dos policiais penais, além da responsabilidade com a condução transparente e firme de todos os procedimentos relacionados ao caso”.

Os disparos que mataram Euler, já na madrugada de domingo, teriam sido feitos pelo detento que ele escoltava, Shaylom Cristian Ferreira Moreira, de 24 anos, que deixou a instituição usando a farda do agente de segurança antes de ser preso em um carro de aplicativo. As investigações criminais do caso estão sob responsabilidade da Polícia Civil. 

O detento, que cumpria pena no Presídio Inspetor José Martinho Drumond, em Ribeirão das Neves, na Grande BH, foi transferido ainda no domingo para a Penitenciária de Francisco Sá, no Norte de Minas, após rápida passagem pelo Pronto-Socorro João XXIII, devido a um corte na testa.

Segundo uma fonte ligada à Polícia Penal, apurações iniciais indicam que o policial penal que atuava com Euler na escolta teria ido para casa em horário de serviço, o que não é permitido. O suposto abandono do posto pode acarretar sua incriminação por coautoria de homicídio, disse outra fonte, da Corregedoria.

Dor e revolta


O corpo de Euler foi velado e sepultado ontem, às 11h, no Cemitério Municipal Nossa Senhora da Piedade, em Justinópolis, na Região Metropolitana de Belo Horizonte, em clima de dor e revolta. A família está inconformada com a morte e com a maneira como ela aconteceu. 

Uma sobrinha de Euler, Thais Maford, lembra que, no sábado, o tio ligou para ela do trabalho pedindo ajuda para levar a avó, que estava passando mal, a um hospital. "Eu atendi. Socorri minha avó. A levei para o Hospital Municipal, aqui de Ibirité, onde ela permanece internada. Contamos sobre a morte do meu tio, mas ela não está processando as informações", disse.

Irmão de Euler, Fernando Alves da Silva pede justiça: "A gente sabia que era uma profissão de risco. Ele também, mas não se importava. A gente nunca pensou que fosse acontecer alguma coisa. E aconteceu. Estamos revoltados e o que esperamos é que a justiça seja feita", destaca.

Fernando descreveu o irmão como uma pessoa amorosa e cuidadosa com a família. Ele integrava a Polícia Penal desde 2009 e investia na construção de uma pousada em Ribeirão das Neves, no Bairro Tony, e em Ibirité, ambas na Região Metropolitana de Belo Horizonte.

Presidente do Sindicato dos Policiais Penais do Estado de Minas Gerais (Sindppen-MG), Jean Otoni informa que a última morte de policial penal em serviço havia sido registrada em 2023, quando um agente foi atacado em uma guarita em presídio de Ribeirão das Neves. Para Jean, a morte de Euler revela “o descaso” para com o policial penal que participa de escoltas.

"No caso da Polícia Militar, o revezamento é feito de quatro em quatro horas. Uma viatura chega para render a outra. No nosso caso, não. Geralmente, o período de trabalho é de 12 horas. E, muitas vezes, o policial penal vai em seu carro particular. Além disso, o ideal é que fossem três policiais na escolta, por conta das necessidades dos envolvidos. No caso de mulheres, é ainda mais grave, pois elas menstruam."

O dirigente sindical diz que há muito o que se discutir e que um dos maiores problemas é a falta de contingente, hoje muito inferior ao necessário. "Há muito tempo não é feito um concurso."

Entenda o caso 

Câmeras de segurança do Hospital Luxemburgo registraram toda a movimentação do detento suspeito de ter matado um policial penal na madrugada de domingo. As imagens mostram o preso andando pelos corredores da unidade de saúde vestindo a farda do policial penal Euler, que, momentos antes, acabara de ser assassinado dentro de um dos quartos. Já do lado de fora do hospital, o detento embarcou em um carro de aplicativo, sendo preso pouco depois, durante a corrida. 

Segundo o presidente do Sindppen-MG, que acompanhou os trabalhos da investigação no hospital, o ataque aconteceu quando o detento pediu para ir ao banheiro. Sozinho com o policial penal, o preso entrou em luta corporal com o agente e tomou suas armas. Na sequência, deu dois tiros — um na nuca e outro no tórax. 

O detento era interno da Penitenciária José Martinho Drumond desde 14 de julho. Com passagens pelo sistema prisional desde 2018, ele responde a diversos inquéritos por crimes como tráfico de drogas, furto, posse ilegal de arma de fogo e homicídio. 

Tiros na noite


Conforme consta no boletim de ocorrências do caso, ao qual o Estado de Minas teve acesso, uma integrante da equipe de enfermagem do hospital ouviu, do corredor, gritos de “Perdeu! Perdeu!”, seguidos por dois estampidos semelhantes a disparos de arma de fogo. A profissional contou que tentou abrir a porta do quarto, mas alguém do lado de dentro a impediu e disse para aguardar. Na sequência, o detento abriu a porta e afirmou estar “tudo tranquilo”. 

A testemunha relatou ter visto respingos de sangue no chão, assim como observou o detento lavando as mãos ensanguentadas na pia. Logo após, o homem deixou o quarto com pressa, vestido com o uniforme do policial penal. A equipe de enfermagem percebeu que se tratava do detento e não do policial, que foi encontrado caído no chão do quarto. Os profissionais tentaram reanimá-lo, sem sucesso. 

 Siga nosso canal no WhatsApp e receba notícias relevantes para o seu dia  

Ainda segundo o B.O., o detento pediu a uma mulher que chamasse um carro de aplicativo, dizendo que a mãe estava passando mal e que ele não tinha telefone. A mulher pediu o veículo acreditando que o homem, vestido com a farda, fosse realmente um policial. O detento foi capturado dentro do carro de aplicativo, a poucos quilômetros do hospital.

compartilhe