Com 21.133 incêndios em vegetação controlados pelo Corpo de Bombeiros até outubro de 2025, em comparação com 29 mil ocorrências registradas durante o ano de 2024, Minas Gerais pode viver um novo capítulo na prevenção e controle de queimadas.

O Protocolo de Intenções firmado entre o Corpo de Bombeiros Militar de Minas Gerais (CBMMG) e a Secretaria de Estado de Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Seapa) na manhã desta segunda-feira (13/10) pretende garantir um fortalecimento da articulação entre o governo e setor produtivo, que é o "carro-chefe" da economia estadual, além de estabelecer métodos de comunicação e treinamento para prevenção e primeiro combate às chamas.

A iniciativa envolve o Sistema Faemg Senar, a Secretaria de Estado de Agricultura, Pecuária e Abastecimento, a Associação Mineira da Indústria Florestal (Amif), o Sistema Ocemg, a Associação da Indústria da Bioenergia e do Açúcar de Minas Gerais (Siamig Bioenergia), e a Empresa de Assistência Técnica e Extensão Rural (Emater-MG). O acordo prevê ações conjuntas como a capacitação de brigadas rurais, troca de informações sobre focos de calor e promoção de educação ambiental.

Tecnologia na identificação e melhor resposta

Segundo a comandante-geral do Corpo de Bombeiros, coronel Jordana de Oliveira Filgueiras Daldegan, o protocolo vai garantir uma coordenação maior de resposta e capacitar o produtor rural a fazer frente aos incêndios florestais, cuidar do meio ambiente e das propriedades rurais.

“O protocolo vai garantir uma coordenação maior. Essas atividades já existiam em iniciativas isoladas. Hoje, já temos produtores rurais capacitados, tanto na prevenção com aceiros quanto primeiros combates”, contou.

“A assinatura deste protocolo representa um marco de maturidade institucional para o nosso estado. Trabalhar em parceria com o setor agropecuário é essencial, precisamos unir forças, compartilhar experiências e buscar soluções conjuntas. Temos tecnologia, conhecimento e, sobretudo, comprometimento para agir de forma coordenada, proteger o meio ambiente e garantir a sustentabilidade e o desenvolvimento de Minas Gerais. O fogo não reconhece fronteiras, mas, juntos, estaremos cada vez mais preparados para enfrentá-lo”, afirmou a comandante

De acordo com a Comandante, a assinatura dos protocolos entre diferentes órgãos garantirá uma otimização e compartilhamento de efetivo, maquinário e tecnologias em um período prévio à estiagem. “Ano passado [2025] foi um ano atípico em condições climáticas que assolaram não só Minas Gerais, mas o país inteiro. Neste ano, já viemos trabalhando e vimos que precisa ter uma coordenação disso tudo. Por que esperar o ano que vem? Podemos fazer agora, trabalhar durante o período chuvoso. Vamos ter estudos, fazer reuniões, entender a realidade de cada um e chegar no período de estiagem no ano que vem com resultados concretos e melhores condições”, explicou.

Tecnologia a favor do produtor

Para isso, uma das ferramentas usadas será a tecnologia. Com monitoramento via satélite e manutenção de mapas de calor, tanto as equipes militares podem ser lançadas em pontos diretos, como já funciona em bases do Norte e no Triângulo, quanto produtores rurais poderão ficar em alerta.

“Vamos ter a informação, disparamos o alerta e o produtor já fica atento. Neste momento, não será hora de usar fogo para limpeza de terreno. Serão instruídas práticas das mais simples às mais complexas que vão fazer a diferença”, afirmou a comandante.

"A gente sabe que a ação humana é o principal fator que dá início aos incêndios florestais. Quando a gente tem a população com essa consciência e denuncia, ela pensa duas vezes ao utilizar o fogo", completou a coronel.

A ideia é compartilhada pelo Thales Fernandes. "O problema do fogo não é só do bombeiro, muita gente pensa. É de todos nós. A solução nós temos que buscar juntos. E o produtor procurar a solução mais rápida e saber o que que ele tem que fazer a hora que começar o fogo, é também muito importante, porque prevenir é importante, mas depois que começa ele tem que saber como rapidamente revelar aí se conseguir chegar em alguém que possa ajudar", afirmou.

"Nós sabemos que em várias regiões do estado, nós temos já sindicatos rurais e produtores que já estão capacitados, que já fizeram treinamento e que tem dentro das suas propriedades equipamentos para poder ajudar nesse combate", afirmou.

Com o uso de tecnologia e novos treinamentos, que ainda serão definidos e datados, mais produtores rurais poderão se capacitar e promover práticas que podem prevenir e combater chamas em áreas remotas.

Equipe de resposta

Segundo a Amif, o protocolo visa a criação de um grupo de trabalho dividido em quatro equipes de trabalho. A primeira delas seria formada por especialistas em incêndios florestais, com experiência técnica e prática no combate; a segunda, por engenheiros e técnicos, com expertise em infraestrutura, equipamentos e tecnologias de monitoramento; a terceira, por especialistas em logística, que seriam responsáveis pela organização e coordenação de suprimentos, transporte e apoio logístico; e a quarta, por especialistas em comunicação e relações públicas, que garantirão a eficiência da comunicação interna e externa durante as operações.

Além disso, a intenção é a criação de unidades de resposta rápida. De acordo com a Associação, as unidades poderão garantir uma mobilização ágil e eficiente a situações emergenciais. O protocolo também visa o desenvolvimento de um sistema de comunicação de emergência, com tecnologias de rádio, telefonia e aplicativos móveis, além de sistemas de alertas e notificação para a população com recomendações de evacuação e progressos de operações.

Custo do fogo

Dados do CBMMG indicam que, no acumulado deste ano, 1.773 focos foram registrados em área rural não protegida, 468 em propriedade rural particular e 116 em órgãos públicos e privados. Essa grande incidência de queimadas causa um impacto financeiro para pequenos, médios e grandes produtores rurais.

“Nós sabemos quanto os incêndios causam danos às nossas florestas, às áreas plantadas e às propriedades rurais. Precisamos cuidar com atenção desse ativo valioso, fortalecer a prevenção e investir em capacitação, como já fizemos ao treinar mais de 5.000 pessoas nos últimos anos. É hora de agir de forma conjunta, planejada e preventiva. O fogo não é prática do produtor rural moderno, e sim um risco que precisa ser combatido com orientação e união. Contem conosco para seguir juntos nesse esforço por uma Minas mais segura, produtiva e em paz”, comentou o presidente do Sistema Faemg Senar, Antônio de Salvo.

Conforme levantamento da Emater-MG, as chamas que atingiram imóveis do estado no período de estiagem entre os meses de julho e setembro de 2024 atingiram mais de 305 mil hectares, com um impacto financeiro de aproximadamente R$ 1,2 bilhão.

Neste viés, o prejuízo foi de R$ 554 milhão nas pastagens, R$ 178 milhões em culturas perenes e semiperenes e R$ 71 milhões em florestas plantadas. A produção da cana-de-açúcar teve prejuízo de R$ 317 milhões e os incêndios causaram queda de 30% na produtividade, além de prejuízos na geração de energia e aumento nos custos com adubação.

No caso de plantações perenes, como o café, as queimadas provocam a inviabilização e exigem replantio. Já no caso de pastagens e forrageiras, as chamas causam perda de pasto, exigem retirada do rebanho e suplementação alimentar, além de danos ao solo.

Segundo a Seapa, florestas plantadas perdem a capacidade produtiva e de rebrota, também necessitando replantio. Já nas matas nativas e áreas de agroextrativismo, os prejuízos à fauna, flora e qualidade do ar comprometem a saúde humana e inviabilizam a produção sustentável.

Fauna e vida humana em perigo

Conforme o professor Bernardo Machado Gontijo, do Instituto de Geociências da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), o impacto dos incêndios florestais vai além do prejuízo econômico. “Se a fauna não conseguir fugir, não sobrevive. Um inseto, ave, mamífero… ele tem que ter capacidade para fugir desse fogo. Caso não consiga, ele vai ser pego. Ele tem que se proteger numa toca, voar ou correr pra longe. Mas não tem como se adaptar ao fogo”, explicou.

De acordo com o professor, a recuperação do solo queimado depende do tipo de solo e volume do incêndio, em uma diferença em relação à queima controlada. "Há a queima intencional no Cerrado para tornar o solo menos ácido e melhorar a produtividade de um solo que, no dia-a-dia, não é o ideal para a prática agrícola. Na Mata Atlântica, por outro lado, a queima é usada para liberar carbono", contou.

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Segundo ele, na queima controlada, não adianta nada liberar o carbono e não deixar protegido o solo. "Sem a cobertura, a queima pode causar a erosão, ravinamento e prejudicar corpos hídricos. Às vezes o produtor queima uma área que ele nem vai usar para plantar, mas a retirada da vegetação faz com que a água diminua no sistema. E aí, ele fica sem água, o rio seca e atrapalha não apenas aquela região, mas também a bacia, o entorno", explicou.

No cenário do Cerrado, que abrange o Triângulo, Alto Paranaíba e Noroeste mineiro, mecanismos naturais protegem o solo e permitem a rebrota até a próxima estação chuvosa. "Se o fogo aconteceu em uma área protegida em junho, julho, só depois de novembro que podem surgir brotinhos novamente. Mas retornar ao tamanho original é uma questão de quatro, cinco anos", afirmou o professor.

A fauna nativa não é a única que pode ser prejudicada com as queimadas. Segundo a pneumologista e broncoscopista da Hapvida NotreDame Intermédica, Bianca Fidelix Espindula, inalar a fumaça de incêndios, algo comum para comunidades que vivem próximas a áreas vulneráveis às queimadas, traz um grande risco à saúde. “A fumaça é uma mistura de gases com partículas finas que podem causar sintomas desde irritação nos olhos, nariz e garganta, até tosse seca. Ela também pode causar dor de cabeça, tontura e náusea devido à inalação de substâncias tóxicas como monóxido de carbono, entre outras”, explica a médica.

Com informações de Joana Gontijo

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