Morte de gari: Justiça nega pedido da defesa de Renê para anular provas
Advogados alegaram que confissão prestada durante oitiva para Polícia Civil de Minas Gerais seria ilegal por não haver presença de representação legal
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A juíza sumariante do 1º Tribunal do Júri de Belo Horizonte negou um pedido da defesa do empresário Renê da Silva Nogueira Júnior para anular provas e a confissão do acusado de matar o gari Laudemir de Souza Fernandes, em 11 de agosto, no Bairro Vista Alegre, na Região Oeste da capital. A decisão foi divulgada nesta quarta-feira (5/11) e também previu a retirada parcial do sigilo sobre o processo criminal.
De acordo com a denúncia do Ministério Público de Minas Gerais (MPMG), o servidor terceirizado da Prefeitura de Belo Horizonte (PBH) foi morto pelo empresário Renê da Silva Nogueira Júnior. Durante as investigações, a esposa dele, a delegada Ana Paula Lamego Balbino Nogueira, também foi indiciada por prevaricação - por ela saber que o marido cometeu o crime e não ter cumprido com os deveres da profissão - e porte ilegal de arma de fogo - por ter cedido ou emprestado sua arma de fogo pessoal.
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No documento, a magistrada Ana Carolina Rauen Lopes de Souza afirma que os advogados do empresário solicitaram que o depoimento prestado em 18 de agosto à Polícia Civil de Minas Gerais (PCMG) foi feito sem a presença de um representante legal.
Na oitiva, Renê confessou que atirou contra os garis que estavam no local do crime, mas negou ter conhecimento que teria atingido e matado Laudemir. O empresário também alegou que efetuou o disparo devido a uma discussão de trânsito e que sua esposa, delegada da PCMG, não tinha conhecimento que ele havia se apoderado da arma particular dela, uma pistola calibre .380.
Em relação ao pedido, a juíza afirmou que a fase incisional, ou seja, antes do processo ser remetido à Justiça, não incide plenamente os princípios da ampla defesa e do contraditório. Por isso, a confissão dada sem a presença de um advogado não seria causa plausível para anular o depoimento, “uma vez que não se mostra patente qualquer ilegalidade”.
“Além disso, não se trata o réu de indivíduo vulnerável ou sem discernimento como faz crer sua atual defesa, mas de empresário instruído e plenamente capaz de compreender as consequências de sua decisão e se opor a solicitação dos policiais”, ponderou.
Como o crime aconteceu?
- Equipe de coleta de lixo trabalhava na Rua Modestina de Souza, Bairro Vista Alegre, em BH, na manhã do dia 11 de agosto.
- Motorista do caminhão, Eledias Aparecida Rodrigues, de 42 anos, manobra para liberar passagem, após ver uma fila de carros se formar atrás dela.
- Eledias e os garis acenam para Renê da Silva, que dirigia um carro BYD, permitindo a passagem.
- O suspeito abaixa a janela e grita que, caso encostasse em seu veículo, ele iria "dar um tiro na cara" da condutora.
- Na sequência, ele segue adiante, estaciona, sai do carro armado; derruba o carregador, recolhe e engatilha pistola, segundo o registro policial.
- Ele faz um disparo que atinge Laudemir no abdômen.
- O gari é levado ao Hospital Santa Rita, em Contagem, na Grande BH, mas morre por hemorragia interna.
- No local, PM recolhe projétil intacto de munição calibre .380.
- Horas após o crime, a PM localiza e prende Renê no estacionamento de academia na Av. Raja Gabaglia.
- Flagrante convertido em prisão preventiva em audiência de custódia, no dia 13 de agosto, a pedido do Ministério Público de Minas Gerais
- Renê está preso no Presídio de Caeté, Grande BH
O que as investigações mostraram?
Em 29 de agosto, 18 dias após a morte de Laudemir, Renê da Silva Nogueira Júnior foi indiciado por homicídio qualificado - por motivo fútil e meio que dificultou a defesa da vítima, ameaça contra a motorista do caminhão de coleta de resíduos e porte ilegal de arma de fogo. A esposa dele, a delegada Ana Paula Lamego Balbino Nogueira, também foi responsabilizada e responderá por porte ilegal de arma de fogo, por ter emprestado sua arma de uso pessoal para o marido.
Os detalhes sobre o crime foram repassados pela Polícia Civil de Minas Gerais (PCMG) durante coletiva de imprensa. No dia seguinte aos fatos, em 12 de agosto, a corporação já havia afirmado que o depoimento das testemunhas, colegas de Laudemir, já indicavam que o empresário seria responsável pelo disparo.
Ao longo das investigações, ficou constatado que a arma usada no homicídio pertencia à companheira do suspeito. Na época, a balística comprovou que as duas munições encontradas na Rua Modestina de Souza, no Bairro Vista Alegre, na Região Oeste de Belo Horizonte, eram compatíveis com a pistola calibre .380 da delegada.
As dúvidas sobre a participação de Renê foram sanadas depois que a corporação obteve imagens de câmeras de segurança que mostram o homem guardando a arma em uma mochila, ao chegar em casa no dia do crime. As gravações reveladoras foram registradas pelo sistema interno do estacionamento do prédio em que Renê da Silva Nogueira mora, no Bairro Vila da Serra, em Nova Lima, na Região Metropolitana de Belo Horizonte.
De acordo com o delegado Evandro Radaelli, o indiciamento de Renê foi baseado nas informações repassadas em oitiva de testemunhas, no próprio interrogatório do investigado, análises das imagens colhidas no local dos fatos, na empresa em que o homem trabalhava e em sua casa. Além disso, a quebra do sigilo telefônico e telemático do aparelho celular e do carro que o empresário dirigia no dia, também forneceram dados para a conclusão do inquérito.
Além da comprovação do envolvimento do empresário na morte de Laudemir, as investigações indicaram que Renê tem "fascínio" por armas de fogo e o "poder" que o armamento o concedia. De acordo com o Radaelli, durante análises feitas no aparelho celular do investigado foram encontradas imagens em que ele exibe diversas armas. Em alguns vídeos, o homem aparece fazendo disparos. Ainda segundo o chefe da investigação, o artefato não é o mesmo usado no crime registrado no Bairro Vista Alegre. Além disso, o homem também demonstrava “interesse” pelo cargo ocupado pela esposa. Em uma das fotos, ele chegou a exibir o distintivo da mulher.
“Acreditamos que na situação em que ele disparou contra o laudemir ele estava sim demonstrando um poder, porque ele julgou que a pressa que ele tinha era mais importante que o trabalho que os garis realizavam na coleta de resíduo”, afirmou.
‘Tumulto processual’
Em 27 de outubro, Renê Júnior foi intimado pela Justiça a definir quem seria seu representante legal no inquérito policial. A decisão citou que a juntada de petições de dois advogados causou “tumulto processual”. Em 23 de agosto, o então investigado nomeou Bruno Silva Rodrigues seu novo defensor.
Em sua decisão, a juíza Ana Carolina Rauen Lopes de Souza, do Tribunal do Júri da comarca de Belo Horizonte, deu prazo de dois dias para que as informações sejam repassadas ao Ministério Público de Minas Gerais.
Dois dias antes, Renê, se viu incluído em um mal entendido entre dois advogados. A confusão começou depois que o antigo defensor, o mineiro Dracon Luiz Cavalcante Lima, percebeu que seu nome foi retirado do processo e deu lugar a um segundo advogado, do Rio de Janeiro.
Ao Estado de Minas, Dracon contou que se reuniu com o empresário no mesmo dia, no Presídio de Caeté, na Região Metropolitana de BH. Durante o encontro, o antigo cliente explicou ao criminalista que pediu ao colega fluminense para trabalhar em parceria com ele, o que não foi respeitado. Ainda segundo o mineiro, essa semana ele deverá se reunir com o novo representante legal de Renê para decidir se vai continuar no caso.
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“Não era para ele me tirar e sim para trabalharmos juntos. Agora eu vou conversar com o advogado e decidir se vou continuar ou não, porque aqui não é Rio de Janeiro, aqui é Belo Horizonte, Minas Gerais. Não prometo nada além de trabalho e o que está dentro da lei”, disse Dracon.
Após a divulgação do novo representante legal, em nota, o escritório de Bruno Silva Rodrigues, afirmou que só vai se pronunciar após a conclusão do inquérito, por meio da PCMG, e da denúncia à Justiça pelo Ministério Público de Minas Gerais (MPMG).