A recente denúncia do influenciador e humorista Felipe Bressanim Pereira, conhecido como Felca, gerou uma série de debates sobre a responsabilidade das plataformas digitais na proteção de crianças e adolescentes.

No vídeo publicado em 6/8, Felca expõe casos de suposta exploração infantil, incluindo a "adultização" de menores nas redes sociais, e cita diretamente o influenciador paraibano Hytalo Santos. A publicação viralizou, acumulando mais de 25 milhões de visualizações em apenas alguns dias, ao mesmo tempo em que ganha força a decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) que amplia a responsabilidade das big techs na remoção de conteúdos ilegais, inclusive sem necessidade de ordem judicial.

A polêmica evidenciada por Felca e a nova jurisprudência do STF colocam as plataformas digitais diante de um impasse: agir de forma mais ativa e preventiva na moderação de conteúdos ou enfrentar riscos jurídicos e sociais cada vez maiores.

Um "circo macabro" na internet

No vídeo de 50 minutos, Felca acusa Hytalo Santos de explorar e expor menores de idade de forma sexualizada em suas redes sociais. Um dos principais casos apresentados é o da influenciadora Kamyla Santos que, segundo o youtuber, começou a aparecer nos conteúdos de Hytalo aos 12 anos e passou a ser "adultizada" ao longo dos anos, com postagens e interações que apelariam sexualmente a parte do público adulto.

Ele descreve a situação como um "circo macabro" movido por interesses comerciais, citando inclusive o uso de publicidade vinculada a jogos de apostas. "É dinheiro feito às custas da exposição de menores, e isso não é entretenimento, é exploração", afirmou.

O youtuber também rebateu críticas por ter "curtido" postagens de menores ao investigar os casos e afirmou que processou mais de 200 pessoas por difamação, oferecendo a possibilidade de encerrar as ações mediante doação de R$ 250 a instituições de caridade e um pedido público de desculpas.

Dois dias após a publicação do vídeo, os perfis de Hytalo Santos e Kamyla Santos foram retirados do ar no Instagram no Brasil. O Ministério Público da Paraíba (MPPB) confirmou que existe, desde 2024, um inquérito criminal em andamento contra Hytalo por suspeita de exploração de menores. O órgão, no entanto, não solicitou a retirada dos perfis, mas informou que as investigações continuam.

STF amplia dever das plataformas

O caso se desenrola poucos meses após uma decisão histórica do Supremo Tribunal Federal, que reformulou a interpretação do artigo 19 do Marco Civil da Internet. Segundo o STF, as plataformas digitais podem ser responsabilizadas civilmente mesmo sem decisão judicial, desde que notificadas extrajudicialmente sobre conteúdos considerados ilícitos.

Em crimes graves, como exploração sexual infantil e incitação ao ódio, a responsabilização pode ocorrer mesmo sem qualquer notificação prévia.

"Essa decisão muda profundamente o papel das plataformas. Agora, elas precisam ser muito mais proativas na moderação de conteúdo", afirma o advogado Aloísio Costa Jr., especialista em Direito Digital.

Segundo ele, a exigência vai além da simples retirada de postagens. "Os provedores devem estabelecer mecanismos internos para identificar conteúdos potencialmente criminosos, mesmo antes de serem denunciados".

Costa Jr. destaca que a insegurança jurídica também é um dos desafios do novo cenário. "As plataformas se veem diante da necessidade de decidir se um conteúdo é ou não ilícito. Se errarem para qualquer um dos lados, podem ser responsabilizadas, seja por manter um conteúdo ilegal, seja por retirar um conteúdo legítimo".

Autorregulação e impacto coletivo

Com a decisão do STF, as plataformas também passam a ter a obrigação de editar normas de autorregulação claras, incluindo regras explícitas nos termos de uso sobre o que pode ou não ser postado - uma exigência que vale tanto para grandes empresas quanto para pequenos produtores de conteúdo.

"O contrato firmado entre plataforma e usuário, por meio dos termos de uso, deve agora conter mecanismos específicos para moderação de conteúdos potencialmente ilícitos. Isso traz mais transparência e segurança jurídica para todos os envolvidos", afirma o advogado.

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Além das possíveis indenizações individuais às vítimas, a decisão também abre espaço para ações coletivas. "Estamos falando de danos morais coletivos, quando o impacto vai além dos indivíduos diretamente envolvidos e afeta toda a coletividade. O Ministério Público pode atuar para buscar reparação financeira e moral da plataforma responsável", explica.

"A sociedade espera que as plataformas ajam com responsabilidade, não apenas cumprindo ordens judiciais, mas se antecipando ao risco. A proteção da infância não pode ser secundária. Deve estar no centro da estratégia digital", conclui Costa Jr.

*Estagiária sob supervisão do subeditor Gabriel Felice

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