Auditores defendem adesão de Minas ao Propag sem se desfazer de estatais
Nos cálculos do Sindifisco, renegociar a dívida sem amortizar parte do valor com Cemig, Codemig e Copasa simboliza uma economia de quase R$ 100 bilhões
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Siga noO Sindicato dos Auditores-Fiscais da Receita Estadual de Minas Gerais (Sindifisco-MG) quer ampliar a discussão sobre o ingresso no Programa de Pleno Pagamento de Dívidas dos Estados (Propag). Estudo feito pela instituição defende que não é necessário envolver estatais, como Cemig, Copasa e Codemig, na negociação para refinanciar o débito de quase R$ 170 bilhões com a União e, para isso, acionou o Tribunal de Contas do Estado (TCE-MG) e deputados da Assembleia Legislativa (ALMG).
O estudo em questão, feito em parceria com a entidade congregadora e representativa da classe de Auditores-Fiscais da Receita Estadual de Minas Gerais, ativos e aposentados (Affemg), defende que a adesão ao Propag seja feita reduzindo juros a partir de uma contribuição mais alta com o Fundo de Equalização Federativa (FEF) e nos investimentos em serviços essenciais do estado.
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Segundo o Sindifisco, ao manter as companhias sob domínio estatal, seria possível chegar ao fim dos 30 anos de vigência do Propag com um saldo positivo de quase R$ 100 bilhões em comparação com a hipótese de aderir ao programa a partir da federalização ou privatização das empresas. Essa variação é explicada com o uso dos dividendos oriundos das empresas na conta.
Regulamentado em abril de 2025 após mais de um ano de costuras capitaneadas pelo senador Rodrigo Pacheco (PSD-MG), o Propag prevê o refinanciamento das dívidas dos estados em até 30 anos com a possibilidade de redução dos juros, hoje fixados pelo Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), que mede a inflação, mais 4% ao ano. A maneira de redução da cobrança adicional é o alvo da discussão dos auditores-fiscais.
A discussão feita entre o governo de Romeu Zema (Novo) e a Assembleia para definir os parâmetros de ingresso no Propag leva, desde abril, quase exclusivamente em consideração uma única maneira de adesão. Ela seria feita a partir da redução de dois pontos percentuais de juros com a amortização de 20% do estoque da dívida (cerca de R$ 34 bilhões); outro ponto a partir do repasse de 1% do valor devido ao FEF; e o último ponto a partir de investimento em serviços como educação profissionalizante, infraestrutura e segurança pública de 1% do total devido.
Para amortizar 20% do estoque da dívida, o governo estadual trabalha com a hipótese de federalizar a Codemig e privatizar Cemig e Copasa. O primeiro passo já foi aprovado na Assembleia com a autorização para entregar a empresa mineradora ao governo federal. Os dois seguintes ainda não foram votados pelos deputados.
A alternativa
O Sindifisco defende que a adesão ao Propag seja feita a partir do modelo apresentado na alínea C do inciso II, artigo 5º da lei que regulamenta o programa. Desta maneira, os quatro pontos percentuais cobrados como juros além da inflação seriam abatidos sem a necessidade de amortizar parte do estoque da dívida e, por conseguinte, sem se desfazer das estatais.
Esse trecho do Propag permite que dois pontos percentuais dos juros sejam retirados com o investimento de 2% do estoque da dívida em serviços essenciais; e outros dois pontos suprimidos com o repasse de 2% do valor devido ao FEF.
O Fundo de Equalização Financeira foi criado durante a tramitação do Propag no Congresso para ser uma forma de não penalizar os estados que não têm dívidas com a União e garantir votos de seus parlamentares para aprovar a medida. No caso dos investimentos em áreas essenciais da gestão pública, existe a prerrogativa de que o governo federal faça a gestão do alocamento dos recursos.
No cenário em que se vende as estatais, o cálculo do Sindifisco chega aos seguintes resultados em uma projeção de 30 anos: Minas gastaria R$ 264 bilhões com as parcelas da dívida; R$ 27 bilhões em aportes ao FEF; e deixaria de receber R$ 197,76 sem os dividendos das empresas. O saldo negativo final seria de R$ 488,76 bilhões.
Sem a venda das estatais os dividendos são mantidos, o valor pago da dívida sobe para R$ 323 bilhões, e o aporte ao FEF, para R$ 66,6 bilhões. O gasto final após 30 anos seria de R$ 389,6 bilhões, ou seja, R$ 99,16 bilhões a menos do que no primeiro cenário.
“Quando se pega os dividendos de Cemig, Copasa e da Codemig, há valores de cerca de R$ 3,2 bilhões entrando por ano para o estado. A grosso modo, só os dividendos da Codemig seriam suficientes para cobrir a diferença, sem ter uma economia líquida”, aponta o presidente do Sindifisco, Matias Bakir, à reportagem.
Discussão não foi aberta
Bakir critica a forma como a adesão ao Propag foi debatida em Minas Gerais com foco praticamente exclusivo no modelo que envolve as estatais na negociação. Ele lembra que o Propag permite três formas de ingresso.
“Acho um negócio do outro mundo ter três formas de agir, e o governo escolher só uma e dizer: ‘É nessa que vamos aderir’. Existe o princípio da administração pública, tanto que existem as licitações, que determinam que se escolha a melhor proposta. O gestor público não tem essa liberdade de uma opção tão grande, ele tem que agir da maneira mais favorável ao erário”, comenta o presidente do Sindifisco-MG.
Nas figuras de Zema, do vice-governador Mateus Simões (Novo) e do secretário de Governo, Marcelo Aro (PP), o Executivo mineiro defendeu pública e reiteradamente que sem conseguir abater os 20% do estoque da dívida, não haveria adesão ao Propag.
Mesmo entre a oposição, a alternativa favorita não exclui que estatais mineiras saiam do controle do estado. A defesa do Bloco Democracia & Luta é de que apenas a Codemig seja considerada suficiente para atingir os 20% do estoque da dívida, de forma que Cemig e Copasa não entrem na mesa de negociação.
A expectativa dos auditores é que os cálculos motivem uma nova rodada de discussões na Assembleia. À reportagem, o deputado estadual Lucas Lasmar (Rede) disse que pretende avançar no tema em agosto e já protocolou uma audiência pública para discutir o assunto. O Sindifisco também aguarda uma resposta do TCE-MG em cobrança de um posicionamento do Governo de Minas sobre os cálculos.
Tabela
Transação | Cenário A | Cenário B |
Gasto com parcelas da dívida | R$ 264 bi | R$ 323 bi |
Aporte ao FEF | R$ 27 bi | R$ 66,6 bi |
Dividendos das empresas | R$ 0 | R$ 197,76 bi |
Impacto final no orçamento | - R$ 488,76 bi | - R$ 389,6 bi |
* No primeiro cenário, com as estatais participando do ingresso no programa de refinanciamento, há um balanço final projetado para 30 anos com saldo negativo de R$ 488,76 bilhões
** No segundo cenário, com o estado mantendo as companhias, o déficit é de R$ 389,6 bilhões, R$ 99,16 de saldo positivo em relação à primeira hipótese.