O ministro Luís Roberto Barroso, que presidiu o Supremo Tribunal Federal (STF) até o início da semana, anunciou nesta quinta-feira (9/10), durante sessão plenária, sua aposentadoria antecipada, encerrando um ciclo de 12 anos e três meses de atuação na Corte.
Em um discurso pontuado por pausas emocionadas e aplausos dos colegas da Corte, ele reforçou a defesa da democracia e da educação pública, temas que atravessaram sua trajetória. “O Brasil me deu tudo o que tenho, muito além do que sonhei quando tudo começou”, disse o ministro.
Barroso usou o tom sereno que sempre o caracterizou para fazer um balanço de sua passagem pelo Supremo. Falou sobre a importância da gentileza, da empatia e da civilidade em tempos de intolerância e ataques à democracia. E, sem citar nomes, fez um alerta sobre o avanço do extremismo.
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“O radicalismo é inimigo da verdade. A gente, na vida, deve ter cuidado para não se apaixonar pelas próprias razões”, afirmou. “Apesar da agressividade e da intolerância que ainda se vê aqui e acolá, reafirmo a minha fé nas pessoas, no bem, na boa-fé, no respeito ao próximo e na gentileza sempre que possível.”
O ministro também destacou o papel da imprensa na proteção da democracia, em tempos de desinformação e fake news. “Nunca precisamos tanto da imprensa, que se move pela ética e pela técnica jornalística, checa as notícias e distingue fato de opinião. Mentir precisa voltar a ser errado de novo”, disse.
A certa altura, Barroso citou o poeta Pablo Neruda para expressar seu apego à própria nação. “Mil vezes tivera que nascer, e eu queria nascer aqui. Mil vezes tivera que morrer, eu queria morrer aqui — mas não agora”, brincou, arrancando risos e aplausos dos colegas, mencionados individualmente no discurso.
“Hora de seguir outros rumos”
Barroso já havia sinalizado, em entrevistas, que pensava em deixar a Corte e buscar “um novo espaço fora da vida togada”. Na segunda-feira (6/10), ele havia transmitido a Presidência do Supremo ao ministro Edson Fachin.
“Sinto que agora é hora de seguir outros rumos. Nem sequer os tenho bem definidos, mas não tenho qualquer apego ao poder e gostaria de viver um pouco mais da vida que me resta”, afirmou. Disse ainda que pretende dedicar mais tempo à literatura, à espiritualidade e à poesia, e que quer retomar uma vida sem a exposição e o peso das decisões públicas.
Durante o pronunciamento, o ministro fez uma homenagem a Alexandre de Moraes, destacando o papel do colega na defesa das instituições democráticas. “Eu e todos nós somos testemunhas da sua dedicação ao trabalho, ao país e à causa da proteção das instituições. Somos solidários com os preços pessoais elevados que está tendo que pagar e que um dia a história há de reconhecer e reparar”, afirmou.
Legado
Indicado ao STF em 2013 pela então presidente Dilma Rousseff (PT), Barroso já era, à época, um dos mais respeitados constitucionalistas do país. Professor titular da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ), destacou-se como advogado em julgamentos históricos, como a defesa da Lei de Biossegurança, o reconhecimento das uniões homoafetivas e a autorização da interrupção da gestação em casos de feto anencéfalo.
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No Supremo, tornou-se um dos principais defensores dos direitos fundamentais, da transparência institucional e da modernização do Judiciário. Relatou processos de grande impacto social, entre eles a suspensão de despejos e desocupações durante a pandemia de COVID-19; a autorização do transporte público gratuito no segundo turno das eleições em 2023; e o reconhecimento da violação massiva de direitos humanos no sistema prisional brasileiro.