
S� quando as restri��es batem em nossos relacionamentos e no amor de fam�lia � que sentimos a dureza das novas leis de comportamento criadas pela necessidade de isolamento provocada pela COVID-19. Renitente por natureza, n�o entendo muito bem algumas restri��es que tomaram conta de nossa vida e de nosso comportamento. Como poder ir � praia, mas n�o tomar banho de sol na areia. Enquanto isso, os clubes abrem suas piscinas e os s�cios podem frequentar dentro de certas restri��es. Mas tomando o sol que quiserem.
As leis atuais pro�bem at� reuni�es dom�sticas e fico imaginando que, se voc� recebe familiares em casa, � porque todos sabem que est�o “limpos” da nova praga e que n�o correm risco ao se reunir. Fico pensando logo no Natal que � realizado em minha casa, todos os anos, e que soma perto de 60 presen�as – s� da fam�lia. Como � que ser� neste ano? Passo o Dia de Finados em Santa Luzia, indo ao cemit�rio e ao almo�o farto e concorrido na casa da minha prima Beata. Este ano n�o ser� poss�vel – e meu sobrinho que vem do Rio pelo mesmo motivo s� vai poder aproveitar minha hospedagem. “Neca” de Santa Luzia.
H� duas semanas, passei por um sofrimento que se tornou comum entre as fam�lias: os falecimentos n�o podem mais ter despedidas de todos; � preciso restringir as presen�as. O vel�rio tem tempo marcado, n�mero de presen�as previamente estipulado e estamos resolvidos assim.
Para deixar minha revolta bem expl�cita, j� brinquei que, se eu morrer nesse tempo de pandemia, o que a fam�lia deve fazer � cavar uma sepultura em meu jardim e me deixar l�. Acho muito mais digno e mais confort�vel do que n�o poder receber as despedidas e homenagens de meus parentes e amigos. � claro que � uma brincadeira sem nenhuma gra�a, mas o que se sente hoje no falecimento de uma pessoa pr�xima fica bem perto da revolta, de quebrar essas restri��es e esperar para ver se a pol�cia tem a for�a de interromper um vel�rio familiar. S� que a maioria das pessoas est� t�o condicionada pelo medo de adoecer que prefere obedecer cegamente. O que me faz pensar que o terror da COVID faz tanto mal para as pessoas quanto a pr�pria doen�a.
O que tenho escutado de rela��es terminadas, de segrega��o total e irracional, de falta de coragem de chegar at� a porta de entrada das casas n�o est� no gibi. E o que tenho visto de restri��es que n�o t�m muita base tamb�m n�o consigo entender. O normal, nos dias atuais, � que pessoas que t�m que ser hospitalizadas s�o imediatamente diagnosticadas como portadoras de COVID. S�o levadas imediatamente para os espa�os destinados � pandemia criados em todos os hospitais e ficam l� at� que o exame, feito na entrada, d� negativo para a doen�a. S� que, durante esse tempo de espera, o doente n�o pode ser visitado pela fam�lia – est� proibida a entrada em todos os hospitais, o que � outra medida traumatizante, porque todos os doentes querem ter ao lado uma pessoa amiga que os ajude a aguentar a doen�a.
O racioc�nio raso sobre uma doen�a, que, na realidade, ainda � desconhecida, nivela tudo pelo pior. Ent�o, junto com ela, � bom que todos sepultem n�o s� os mortos da fam�lia, mas tamb�m seus sentimentos, a dor, o cumprimento das mais antigas homenagens prestadas aos mortos. At� Cristo, quando foi baixado da cruz, recebeu o acompanhamento da m�e e das mulheres que a acompanhavam at� o sepulcro. Seus perseguidores abriram m�o das restri��es, diante da dor de sua morte. Atualmente, essa dor virou caso de restri��o policial.
