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Estado de Minas UMA AN�LISE DO REALITY SHOW

BBB21, economia da aten��o e as armadilhas do ego-ativismo

O que era a chance de discutir temas relevantes na TV virou espetaculariza��o da humilha��o e do julgamento impiedoso de uns participantes sobre os outros


10/02/2021 06:00

Lucas saiu do programa alegando que não suportava mais as humilhações na casa(foto: Reprodução/TV Globo)
Lucas saiu do programa alegando que n�o suportava mais as humilha��es na casa (foto: Reprodu��o/TV Globo)


A vig�sima primeira temporada do Big Brother Brasil, que estreou no dia 25 de janeiro, prometia repetir a f�rmula de sucesso da edi��o anterior ao reunir um elenco de subcelebridades e an�nimos em busca de um pr�mio milion�rio.

Al�m disso, o reality � not�rio por, ano ap�s ano, incorporar debates controversos com o objetivo de prender o p�blico jovem, que divide sua aten��o em m�ltiplas plataformas digitais e envereda por longos devaneios ativistas nas redes sociais. 

Ao divulgar um elenco composto por um n�mero expressivo de participantes negros, LGBTs e artistas aparentemente engajados em temas sociais, estava claro que o programa tinha inten��o de surfar na onda das discuss�es sobre racismo e lgbtfobia que tomaram as redes sociais de assalto em anos recentes, mas especialmente em 2020. 

O que parecia ser a chance de levar discuss�es sobre temas relevantes para os telespectadores do reality se revelou, j� nos primeiros dias da atra��o, uma exibi��o horr�vel de espetaculariza��o da humilha��o e do julgamento impiedoso de alguns participantes sobre os outros. Importante notar que tal espetaculariza��o � a mat�ria prima desse tipo de programa televisivo, n�o um fato isolado. Por isso, personagens com hist�rias de supera��o ocupam uma posi��o central nas narrativas constru�das em diferentes edi��es do BBB.

A novidade desta edi��o, que tem causado grande como��o p�blica e mantido a audi�ncia do programa elevada, � que os perpetradores dos atos de viol�ncia psicol�gica e humilha��o pertencem ao grupo de pessoas consideradas “militantes”. O alvo preferencial desse grupo, jocosamente chamado de “gabinete do �dio” nas redes sociais, foi o participante Lucas Penteado, um jovem negro da periferia de S�o Paulo que se revelou bissexual no �ltimo final de semana, ao protagonizar a primeira cena de beijo entre dois homens em todas as edi��es do BBB. A constante persegui��o e a falta de apoio ao sair do arm�rio em rede nacional, levaram Lucas a abandonar o programa.

Mas, o que a atual  edi��o do BBB tem a nos dizer sobre os dilemas de novos formatos de ativismo surgidos, ou potencializados, nas redes sociais? Em primeiro lugar, destaco que o BBB opera a partir da l�gica da “economia da aten��o”, um modelo de neg�cios baseado em ganhar dinheiro chamando a nossa aten��o. Por isso o programa tem como base a espetaculariza��o da humilha��o e a divis�o dos participantes em subgrupos, de modo a que pessoas desconhecidas se tornem advers�rias ou at� mesmo inimigas, tudo para garantir que o espectador passe o maior tempo poss�vel acompanhando e comentando sobre o programa em todas as plataformas sociais. As pessoas se viciam no reality e criam a falsa impress�o de que, ao demonstrar sua indigna��o com o mesmo nas redes sociais, podem influir nos rumos da atra��o. Est�o, na verdade, usando seu tempo (nosso recurso mais precioso) e energia para financiar aquilo que lhes causa indigna��o. 

Em certa medida, a economia da aten��o se imiscuiu em praticamente todas as dimens�es das nossas vidas nos �ltimos anos. A prolifera��o de diferentes redes sociais que mediam e valoram as intera��es humanas a partir de m�tricas como engajamento e n�mero de curtidas � o maior exemplo desse fen�meno. Nessas redes sociais nos tornamos empreendedores de n�s mesmos, presos em nossas bolhas e sedentos por capitalizar – material e figurativamente – a aten��o alheia. Em sua �ltima edi��o, a revista GQ traz como  chamada de capa a mensagem “a transforma��o da influ�ncia”, acompanhada de entrevistas com alguns profissionais e ativistas que se utilizam das redes para ampliar sua influ�ncia. Diante desse cen�rio, o espraiamento do modelo de influenciador-ativista parece um caminho sem volta.

Por essa raz�o, a combina��o entre entretenimento de massa e a ascens�o do que estou chamando aqui de ego-ativista, ou seja, aquela pessoa que parece defender causas justas mas est� “militando” essencialmente em benef�cio pr�prio, � inevit�vel. E, ao mesmo tempo, perigosa.

A confus�o entre milit�ncia e auto-interesse sempre existiu e n�o � exclusividade apenas de um campo pol�tico-ideol�gico. Por�m, � fundamental termos em mente o quanto a individualiza��o e a personaliza��o do ativismo contribu� para o ethos capitalista neoliberal e esvazia o potencial pol�tico das causas que defende.  Ao elevar pessoas, e n�o projetos coletivos, � condi��o de porta-vozes dessas causas abre-se espa�o para essencialismos e autoritarismos de toda sorte. Al�m disso, o modelo institucional de media��o e legitima��o pol�tica, seja atrav�s de movimentos sociais organizados, ONGs ou partidos pol�ticos � obliterado diante do imp�rio do ego-ativismo.

Ademais, a associa��o entre ego-ativismo, economia da aten��o e entretenimento de massa inviabiliza o di�logo e a busca pela agrega��o de interesses privados para a conforma��o de uma posi��o majorit�ria, ainda que tempor�ria e contingente. Na aus�ncia do di�logo e da media��o institucional, determinadas cren�as n�o s�o alteradas no curso da intera��o pol�tica e pode haver maior polariza��o entre grupos, sendo que argumentos altamente persuasivos para um grupo de “like-minded people” (grupo de indiv�duos que partilha uma s�rie de concep��es sobre um dado fato e reafirma suas cren�as a respeito de tal fato em espa�os pr�-deliberativos)  n�o ser�o persuasivos para outros.

O que a pol�mica do BBB revela � que as pessoas atuam a partir da necessidade de manter sua reputa��o e autoconceito intactos. Dessa forma, em espa�os nos quais participem grupos com perspectivas distintas, as pessoas tendem a agir mais de acordo com sua lealdade ao grupo do que na busca de uma solu��o justa ou consensual, podendo, inclusive, muitas vezes tomar decis�es mais extremadas exatamente para sustentar sua fidelidade grupal. 

Acredito que a pol�mica em torno da atua��o dos ego-ativistas no BBB21 pode ter efeito pedag�gico. Est� claro que o padr�o egocentrado de ativismo potencializado nas redes sociais � constitutivamente ambivalente: contribui para a populariza��o de determinados debates mas o faz com excessiva simplifica��o e esvaziamento de seu potencial pol�tico. A solu��o para essa ambival�ncia est� em revigorar projetos pol�ticos coletivos, estabelecer pontes entre lutas por identidade e suas dimens�es estruturais, promover di�logos pol�ticos que enfoquem as comunalidades, em vez dos diferencialismos sect�rios, em prol de uma sociedade mais justa e solid�ria.

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