Atleticano exilado, estava de passagem por Belo Horizonte na noite da �ltima quarta-feira. Havia algo de estranho no ar. Tr�s carros passaram buzinando. Dois foguetes explodiram. Depois, o sil�ncio.
Fiquei a matutar sobre o ocorrido: seria o caso de um efusivo anivers�rio? Uma boda a que se chegou com esfor�o herc�leo? O Ciro que largou o osso, afinal sempre haver� Paris?
Vai ver � o futebol, pensei com os meus dedicados bot�es. Mas, n�o sendo mais esta mobilidade praticada pelo Clube Atl�tico Mineiro, como poderia haver tr�s buzinas e dois foguetes dedicados a Cruzeiro ou a Am�rica? Imposs�vel: n�o se celebra 1000 dias na s�rie B, e o americano, na melhor idade, dormira com as galinhas.
Acordo e abro os jornais. Veja a foto do rei careca a ostentar vasta cabeleira. Sou informado da volta dos que n�o foram. E no p� da p�gina, a elucida��o do mist�rio: na noite anterior, parem as m�quinas!, o inca�vel subiu.
A alvissareira not�cia me suga para a espiral do tempo. Estou na Bahia quando cai o inca�vel. No bar que n�o existe mais, a atleticanada se contorce em espasmos de uma alegria delirante. “S�rie bi, s�rie bi”, cantava no r�dio o Paul McCartney, praticamente sa�do da adolesc�ncia em Liverpool. Sobre a cabe�a os avi�es — e nenhum cabelo branco. Ah, tempo rei.
Um amigo querido me ajuda a lembrar como era o mundo quando da queda do inqued�vel — um outro mundo. “N�o havia a Covid. N�o havia 5G. O Terreir�o do Galo, tamb�m conhecido por Arena MRV, era mato, nascente de �gua e o capacetinho, aquele p�ssaro em extin��o. Lula estava preso, babaca. Gugu Liberato tinha programa na Record (ou seja, j� tinha morrido). A embaixada da Ucr�nia funcionava na R�ssia. Z� do Caix�o fazia um longa. Luva de pedreiro era s� um item na loja de material de constru��o.”
Dragado pela nostalgia da minha juventude, a subida do indesc�vel me parece o divisor de �guas entre o passado distante e o resto de nossas vidas. Sou tomado pelo amargor dos velhos, agora que sou grisalho e tomo rem�dio pra colesterol. Quem vem me salvar � o Fael, com sua an�lise precisa a respeito da volta dos que n�o foram: “N�o � um adeus, � um at� logo”. Ufa!
A cidade amanhece cheia de camisas azuis: s�o os gerentes de banco, os corretores de im�veis, os motoristas e trocadores a caminho do trabalho, com suas cal�as beges e mangas de camisa. Em meio � massa prolet�ria, conto dois adeptos trajados com a farda do inca�vel — um cabo e um soldado.
Penso em cumpriment�-los pelo resultado da guerra contra Oper�rios, Londrinas e Brusques. Mas, como agulhas no palheiro, somem por entre os transeuntes, aquela multid�o a ostentar a carranca de quem n�o ganha mais nem par ou �mpar — a Massa atleticana, 90% da cidade segundo o DataFred, a Paran� Pesquisas e as enquetes da Jovem Klan.
Subiu o inca�vel e n�is igual o Bolsonaro parado na tabela, s� os advers�rios crescendo e o desastre se consumando. No caso do Bozo, o inexplic�vel j� explica a situa��o: como pode existir 33% de gente disposta a votar nessa Besta? Mas, a respeito do Galo, t� realmente dif�cil de entender. Parece o Gr�mio de 21, toc toc toc, bate na madeira, que n�s tamo cagado demais.
O caso � grave. O neg�cio � mirar os 45 pontos. Como ensinou a Dilma, quando alcan�ar a meta, a gente dobra ela. Por enquanto esta � a dura e incompreens�vel realidade: o melhor time do Brasil em 21 �, menos de um ano depois, e com praticamente o mesmo elenco (sen�o melhor), um dos piores de 22. Corre que o Ameriquinha t� chegando, sai que l� vem o Goi�s! Assim como o outro l�, o Gr�mio era inca�vel. O Galo tamb�m. Deus que nos livre e guarde.