H� coisas que s� acontecem com o Botafogo, dizem as pessoas mal-informadas. H� coisas, muito mais coisas, bem mais estranhas e inexplic�veis, que s� acontecem com o Atl�tico. Creditamos isso ao azar, mas essas coisas insond�veis e de outro mundo tamb�m j� se mostraram em lances de sorte, como o escorreg�o de El Tanque Ferreyra na final da Libertadores de 2013, um rabo danado.
Da minha parte, esse estado de coisas levou ao mais absoluto ceticismo, embora tenha havido acontecimentos pra l� de transcendentais. Nos meus bot�es, a ideia de Deus pressupunha a no��o da justi�a divina, e eu me sentia injusti�ado, roubado pelo Wright, a carteira batida pelo Arag�o. E nada da repara��o hist�rica, pelo contr�rio, quanto mais passados para tr�s, mais fodidos �ramos, com o perd�o do voc�bulo, at� muito casto diante de tanta sacanagem. Como um padre Kelmon de festa junina, apenas me perguntava, farsante: o que ter� o atleticano feito em outras vidas?
A pergunta novamente me assombra diante da trag�dia que se desenha, improv�vel, estatisticamente pr�xima do imposs�vel, e por isso mesmo t�o razo�vel e poss�vel: a gente pode cair. � uma verdade cr�vel exatamente por ser inacredit�vel. � algo a que precisamos nos prevenir justamente por n�o exigir preven��o, tamanha sua improbabilidade. A vida, perd�o, gosta de foder o atleticano. E ela far� de tudo para alcan�ar seu objetivo com requintes de crueldade, o que torna o momento ainda mais grave – estamos a oferec�-la a faca e o melhor dos canastras.
Faltam cinco pontos para a t�bua de salva��o dos 45. Restam dez rodadas. O Galo n�o ganha nem par ou �mpar, pode observar quando da defini��o de quem sai com a bola e quem escolhe o lado do campo. No papel, o elenco � ainda melhor do que o supertime campe�o de 2021, dos melhores do mundo. Na pr�tica, n�o ganha sequer do Ava�, horroroso – nem empata, perde. N�o h�, por enquanto, qualquer pista sobre o que motivou ou ainda motiva a desgra�a que agora nos abate. Resta a explica��o que explica o inexplic�vel: h� coisas que s� acontecem com o Atl�tico.
A situa��o � ainda mais grave pelo conluio dos deuses contra a gente – deuses inexistentes, est� claro. Seja como for, o corvo abriu as asas sobre n�s. N�o � que estamos dando azar – n�s somos o azar em pessoa. De repente s� tem p� torto. Qualquer volante cabe�a-de-bagre, estando no time advers�rio, j� vira o Zidane. Goleiro ent�o, tudo Dasayev.
J� pensou sobre a improbabilidade de se acertar a trave? Em todos aqueles metros quadrados que comp�em o gol, a trave � uma diminuta moldura de uns poucos cent�metros. Mas, claro, somos os campe�es do desafio do travess�o. O que fizemos em outras vidas? Rachadinhas? Im�veis com dinheiro vivo? Relacionamentos suspeitos com milicianos e matadores de aluguel? Racismo? Homofobia? Misoginia? Loas a ditaduras e torturadores? N�o. Genoc�dios, s� pode.
Na quarta-feira passada, atleticano exilado, abandonei o barco (o sof�) aos 20 minutos do primeiro tempo. Achei manjado o roteiro e n�o quis me submeter ao filme repetido: joga melhor, desperdi�a um caminh�o de oportunidades, substitui tudo errado e perde no final. Decidi me poupar para o debate de quinta, pois sabia ser indigesta a peleja contra o padre Kelmon. Acordei pela manh� e n�o havia novidades: claro que hav�amos perdido.
S� estamos melhor do que o Bozo. Ele estacionado nos 33, a gente nos 40. Hoje tem o Diniz. P�ssima not�cia. Ele gosta de jogar com quem sai para o jogo. Se pelo menos a gente tivesse um padre Kelmon pra auxiliar na trapa�a e ver se arranca algum pontinho dos incautos. Mas o que temos � o padre Cuca completamente perdido, o nosso Ciro Gomes que podia desistir mas n�o larga o osso. Depois do Diniz tem o Santos na Vila. Ave Maria.
H� coisas que s� acontecem com o Atl�tico. Entre elas, 40 mil pessoas que pagam para testemunhar a trag�dia. S� n�is mesmo. Aconte�a o que acontecer entre n�is e o dinizismo, vamos acordar domingo ainda mais atleticanos, � o karma. Ent�o uma voz ir� sussurrar em nossos ouvidos: aperta o 13 e confirma, que 13 � Galo. S� assim pra gente ganhar.