
O sonho de 99,9% dos jogadores de futebol � atuar na Europa – e essa estat�stica s� n�o chega aos 100% porque, segundo o mestre Nelson Rodrigues, toda unanimidade � burra, melhor n�o contrari�-lo. Do momento em que cal�a a primeira chuteira e pisa em um campinho de grama surrada, o ent�o projeto de atleta sonha com a passagem de avi�o que o levar� ao Velho Continente, de prefer�ncia para vestir a camisa de um grande clube e atuar nos mais sagrados palcos do esporte bret�o. Ent�o, por que muitos dos que conseguem essa travessia ficam t�o pouco tempo do lado de l� do Atl�ntico, apressando-se em voltar para o lado de c�? As respostas s�o variadas.
O lateral-esquerdo Guilherme Arana, em negocia��o com o Atl�tico, � um exemplo. Vendido pelo Corinthians no fim de 2017 ao Sevilla, disputou s� 25 partidas e fez apenas dois gols pelo time espanhol em 2018. No ano passado, emprestado � Atalanta, da It�lia, atuou menos ainda: quatro jogos e nenhum gol. Agora, est� prestes a retornar ao Brasil, segundo a imprensa da Andaluzia, para um contrato de cinco temporadas com o Galo.
Arana tem s� 22 anos. Um longo caminho nos gramados e ainda muito a crescer como jogador. Tem qualidade de sobra, e mostrou isso pelo Corinthians. Mas talvez falte a ele (e ao empres�rio dele) um pouquinho mais de paci�ncia, at� mesmo persist�ncia, para vingar na Europa. Resili�ncia, para usar a palavra da moda. A tal da intelig�ncia emocional.
A impress�o que fica � que esses jogadores que saem do Brasil muito cedo e j� idolatrados n�o conseguem lidar com o fato de que, l� fora, a princ�pio, ser�o mais um na multid�o. Por mais que sejam contratados pelo que j� mostraram por aqui, quando chegam ao estrangeiro precisam construir sua hist�ria praticamente do in�cio. E isso leva tempo. At� que consigam uma sequ�ncia convicente, n�o deixar�o o status de promessa. Esse per�odo talvez seja um dos mais importantes na carreira de um atleta – os momentos de adversidade, que ajudam inclusive a moldar a personalidade de muitos deles dentro das quatro linhas.
Arana � s� mais um nessa rela��o. Atualmente, h� um caso ainda mais emblem�tico, que denota essa intoler�ncia de alguns brasileiros na gringa: o atacante Pedro. Esse n�o ficou nem quatro meses na Europa. Foi negociado em setembro pelo Fluminense, com a Fiorentina, e ontem foi anunciado pelo arquirrival do tricolor carioca, o Flamengo. Pedro tamb�m tem 22 anos.
Do rubro-negro vem outro jogador que partiu recentemente como candidato a astro no exterior e logo voltou ao velho aconchego brasuca. Em meados de 2018, o atacante Felipe Vizeu deixou o Flamengo para “jogar” na Udinese, por�m, ficou apenas seis meses na equipe italiana (entrou em campo cinco vezes e n�o balan�ou a rede), sendo recebido com festa pela torcida do Gr�mio no in�cio do ano passado. Como n�o encantou muito os gremistas no restante da temporada, n�o teve o v�nculo renovado e, h� poucos dias, foi reemprestado pelos europeus ao russo Akhmat Grozny.
A gente fica muito ligado aos exemplos atuais, mas essa n�o �, contudo, uma pr�tica somente da modernidade. Esse movimento de precoce volta para casa � antigo e j� ocorreu com craques de primeira grandeza, como Roberto Dinamite. Em 1980, ele marcou dois gols em sua estreia pelo Barcelona, mas acabou saindo pela porta dos fundos, depois de 10 partidas e t�o somente aqueles dois golzinhos. Dinamite alegou dificuldade de adapta��o ao clima, j� que chegou � cidade catal� durante o inverno, e falta de oportunidade para atuar, discurso que ainda hoje � muito utilizado pelos brasileiros para justificar o retorno ao Brasil. Anos depois, o �dolo vasca�no admitiu que poderia ter tido mais �xito no futebol espanhol.
Um dos casos mais lend�rios e que n�o pode faltar aqui � o do atacante Viola. Em agosto de 1995, ele deixou o Corinthians em alta, como artilheiro, contratado pelo Valencia. Pouco mais de um m�s depois, em entrevista ao jornal Folha de S.Paulo, j� falava no desejo de ser repatriado. Ao ser perguntado se era verdade que estava passando fome na Espanha, respondeu: “Estou sentindo muito a mudan�a da alimenta��o. A comida espanhola tem um tempero mais forte do que a brasileira. Mas o maior problema � na concentra��o. Servem uma comida balanceada e a quantidade � bem pouca, para evitar que o jogador ganhe peso. A�, levo bolachas e iogurtes para completar”. O rep�rter emendou: “Mas, em casa, voc� n�o se alimenta melhor?”. E ele disse: “Em casa, sim. A Leila (namorada do atacante) � boa cozinheira, faz macarronada e tudo de que eu gosto”. Na terra da paella, Viola gostava mesmo � de saborear uma boa macarronada � brasileira.
