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Estado de Minas ENTRE LINHAS

Trag�dias se repetem em escala cada vez maior na hist�rica Petr�polis

O contraste entre o centro hist�rico de Petr�polis e as encostas com loteamentos irregulares � gritante


18/02/2022 04:00 - atualizado 18/02/2022 07:15

Tragédia em Petrópolis
Trag�dia em Petr�polis deixou mais de 100 mortes (foto: CARL DE SOUZA/AFP)


Todo rep�rter passa por v�rias editorias bem antes de chegar �quela na qual se encontra profissionalmente, o que � o objetivo de qualquer jornalista. A melhor escola de reportagem de uma reda��o, por�m, � a editoria de Cidade, que cuida do dia a dia dos seus leitores. Em 1975, ap�s passar pelos jornais O Dia, A Not�cia, �ltima Hora, O Fluminense e A Tribuna, de Niter�i, fui trabalhar no Di�rio de Petr�polis, cujo dono, Jos� Antonio Dias Carneiro, delegara a tarefa de dirigir o jornal ao seu filho, Paulo Ant�nio Carneiro, ent�o um jovem idealista, alguns anos apenas mais velho do que eu. Fui contratado para fazer reportagens especiais sobre a cidade imperial e a regi�o serrana do Rio de Janeiro, que estava em pleno processo de fus�o. Os jornais di�rios do interior fluminense lutavam para n�o desaparecer, diante da for�a dos concorrentes da antiga Guanabara.

Nessa �poca, morava em Niter�i e estudava ci�ncias sociais na Universidade Federal Fluminense (UFF), o que me obrigava a pegar o primeiro �nibus do dia que ligava as duas cidades, para chegar bem cedo � reda��o e voltar no final da tarde, a tempo de assistir �s aulas. Certa vez, o �nibus em que viajava foi assaltado por um bandido armado. Acabou cercado na antiga barreira de fiscaliza��o que havia pr�ximo ao Hotel Quitandinha. Depois de longa e tensa negocia��o, o assaltante se rendeu. Naquele dia,  voltei para a reda��o para contar a hist�ria como testemunha ocular e dormi na cidade imperial. Choveu muito naquela noite.

Na manh� seguinte, a not�cia havia chegado � reda��o primeiro do que eu: um leitor telefonou para o jornal e avisou que uma fam�lia havia sido soterrada num deslizamento de encosta. Morreram o casal e quatro crian�as. Ao fazer a cobertura da trag�dia, observei que a casa onde eles moravam fora constru�da em condi��es completamente irregulares, a come�ar pelo loteamento do terreno, um dos primeiros nas encostas �ngremes da cidade. Ap�s o funeral das v�timas, sugeri ao ent�o editor-chefe do jornal a publica��o de uma s�rie de reportagens sobre a especula��o imobili�ria e a ocupa��o irregular das encostas de Petr�polis. O jornalista Di�genes Dagoberto Costa, meu chefe, era um ex-sargento da Aeron�utica, expulso da caserna ap�s o golpe militar de 1964, por suspeitas de liga��es com o antigo PCB. Pautou dez reportagens.

A 68km do Rio de Janeiro, Petr�polis localiza-se no topo da Serra da Estrela, no conjunto montanhoso da Serra dos �rg�os, com ver�es �midos e quentes e invernos secos e relativamente frios, que podem chegar a 2 graus cent�grados. As montanhas concentram a massa de ar quente e �mido, que sobe a 2 mil metros de altitude. O contato com o ar frio dessas altitudes provoca chuvas catastr�ficas. Somente ap�s a descoberta de ouro e diamante na regi�o de Minas Gerais, a cidade passou a ser ocupada pelos portugueses. Em 1922, d. Pedro I se encantou com a regi�o e comprou a Fazenda do C�rrego Seco, com prop�sito de construir um pal�cio.  Em 1843, dom Pedro II decidiu criar um povoado para assentar os primeiros imigrantes alem�es e construir o pal�cio idealizado por seu pai, que ficou pronto quatro anos depois.

Da taipa � alvenaria

Petr�polis nasceu projetada pelo major J�lio Frederico Koeler, com um n�cleo urbano bel�ssimo, com ares europeus, bem de acordo com a vontade de um imperador descendente da casa dos Habsburgo. Dom Pedro II passou quarenta ver�es em Petr�polis, temporadas que, �s vezes, duravam cinco meses. Em 1861, a cidade foi servida pela primeira rodovia macadamizada do Brasil, a Estrada Uni�o e Ind�stria, que ligava o Rio a Juiz de Fora. A Estrada de Ferro Pr�ncipe do Gr�o Par� (Leopoldina) chegou a cidade em 1883, por iniciativa do Bar�o de Mau�. Todos os presidentes, de Floriano a Costa e Silva, frequentaram Petr�polis.

A s�rie de reportagens sobre a ocupa��o das encostas denunciou a especula��o imobili�ria, a grilagem de terras, a explora��o da popula��o mais miser�vel da cidade. Com ampla repercuss�o, aumentou o prest�gio e a circula��o do jornal, mas provocou forte rea��o do mercado imobili�rio e da extrema-direita da cidade, que acusava Paulo Ant�nio e Di�genes de comunista. �quela �poca, oficiais do antigo Batalh�o de Ca�adores do Ex�rcito monitoravam o jornal. O resultado foi o enquadramento dos dois na Lei de Seguran�a Nacional (LSN) e a ado��o de censura pr�via no jornal. O que n�o sab�amos � que a “Casa Morte”, um aparelho do DOI-Codi do Ex�rcito utilizado para torturar e assassinar oposicionistas, estava localizada no munic�pio.

Desde ent�o, as trag�dias se repetem em Petr�polis, aumentando de escala. O contraste entre o not�vel conjunto arquitet�nico do seu centro hist�rico e os loteamentos nas encostas tomadas por constru��es em �reas de risco � gritante. Os “arquitetos” da periferia, ao longo de quase 50 anos, sa�ram da taipa para a alvenaria, n�o t�m uma cultura de constru��o civil tecida ao longo dos s�culos, como os antigos mestres de obras europeus que, com trabalho escravo, constru�ram o centro hist�rico. Al�m disso, as mudan�as clim�ticas provocam eventos mais extremos, com chuvas cada vez mais catastr�ficas para as encostas da cidade. � uma situa��o muito mais grave do que a das favelas do Rio de Janeiro, onde h� muita conten��o de encostas. O saldo de 117 mortos e 116 desaparecidos mostra isso.

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