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Estado de Minas ENTRE LINHAS

A trag�dia de S�o Sebasti�o e a sagra��o de Lampi�o


23/02/2023 04:00 - atualizado 23/02/2023 09:06

A trag�dia causada pelas chuvas torrenciais em S�o Sebasti�o e adjac�ncias, no litoral norte de S�o Paulo, provocada pela degrada��o ambiental nas encostas da Serra do Mar e as mudan�as clim�ticas decorrentes do aquecimento global, para o qual contribui fortemente o desmatamento da Amaz�nia, foi como uma ducha de �gua fria em pleno carnaval. N�o desanimou os foli�es, principalmente nos grandes centros carnavalescos, mas mexeu com quase todos pelo drama humano que estamos vivendo e a certeza de que o planeta realmente est� passando por eventos clim�ticos desastrosos, que aumentam de escala a cada ano.

O epis�dio serviu para nos mostrar a grande diferen�a entre os governos atual e anterior, negacionista do aquecimento global. Ao contr�rio do comportamento do ex-presidente Jair Bolsonaro durante a trag�dia ocorrida em Santa Catarina, em dezembro passado, na segunda-feira de carnaval, o presidente Luiz In�cio Lula da Silva deixou a base naval de Aratu, na Bahia, onde passava os dias de carnaval, para vistoriar os estragos, confortar a popula��o e coordenar a a��o de seu governo junto ao governo paulista e � prefeitura da cidade. Al�m da empatia com os flagelados, Lula demonstrou disposi��o de trabalhar com um advers�rio pol�tico, o governador Tarc�sio de Freitas (PR), para tratar do que � mais importante: o socorro �s v�timas e a recupera��o da infraestrutura da regi�o, principalmente a Rio-Santos, cujo tr�fego foi interrompido.

Vendo as cenas pela TV, lembrei-me do �ltimo filme de Akira Kurosawa, “Depois da chuva”, conclu�do postumamente. Todo o roteiro, a escala��o do elenco e pr�-produ��o foram realizados com o diretor em vida. Ao falecer, em setembro de 1998, aos 88 anos, seu filho ofereceria dire��o para seu assistente, Takashi Koizumi, que a agarrou com as duas m�os. Ilhei Misawa (Akira Terao) � um ronin em busca de emprego, que vive o dilema de lutar ou n�o lutar por dinheiro. Ao lado de sua mulher Tayo Misawa (Yoshiko Miyazaki), � obrigado a parar em uma pequena hospedaria, porque o rio que deveria atravessar transbordou.

A chuva impede que as pessoas saiam para trabalhar, sobretudo carregadores e artistas errantes.  Demorar� dias at� que o leito do rio volte ao normal e seja poss�vel atravess�-lo novamente, o que gera uma crise social, devido � falta de alimentos e os desentendimentos que surgem quando o ego�smo e o altru�smo ent�o em confronto aberto diante da escassez. O humanismo de Kurosawa transborda na tela, ao final do filme: quando a chuva passa, o ronin vai �s compras e volta com os mantimentos para alimentar os demais abrigados. A comida farta muda da �gua para o vinho o comportamento das pessoas, que celebram a vida.

A analogia surge por causa das not�cias de que, ao lado da grande mobiliza��o dos �rg�os p�blicos e dos volunt�rios da Defesa Civil, h� uma grande demonstra��o de solidariedade entre os moradores e da popula��o paulista, por meio de doa��es de �gua pot�vel, alimentos, roupas, colch�es e cobertores para os desabrigados. Infelizmente, tamb�m foram registrados saques aos caminh�es que transportavam essas doa��es, talvez por necessidade, muito provavelmente por bandidismo mesmo. Vimos um governo federal preocupado com os mais necessitados, trabalhando de forma coordenada. Ontem mesmo, o presidente Lula j� estava em Bras�lia, liderando seus ministros.

O carnaval da Imperatriz


Mas vamos falar de carnaval. A Imperatriz Leopoldinense venceu o desfile das escolas de samba do Rio de Janeiro pela 10ª vez, depois de um jejum de 22 anos, com o enredo “O aperreio do cabra que o excomungado tratou com m�-queren�a e o Sant�ssimo n�o deu guarida”. Fez um desfile praticamente perfeito, que contou a saga de Lampi�o no contexto do Nordeste da d�cada de 1920. A Imperatriz trouxe Matheus Nachtergaele e Regina Cas� como Lampi�o e Maria Bonita, respectivamente, mas o grande destaque foi a filha do casal, Expedita Ferreira da Silva, na �ltima alegoria, que celebrava a heran�a cultural de Lampi�o. Com 90 anos, tamb�m desfilou na Mancha Verde, no domingo, em S�o Paulo.

Com 3 mil componentes divididos em 24 alas, com cinco carros aleg�ricos, a Imperatriz resgatou a vida de Lampi�o e seu bando no imagin�rio popular nordestino, com seus beatos, repentistas, cordelistas, carpideiras e mamulengos. O carnavalesco Leandro Vieira desenvolveu um enredo inspirado nas hist�rias delirantes de cord�is nordestinos, nosso realismo fant�stico, que falam da chegada do cangaceiro Lampi�o ao c�u e ao inferno: “A chegada de Lampi�o no inferno”, “O grande debate que teve Lampi�o com S�o Pedro” e “A chegada de Lampi�o no c�u”.

Lampi�o � um m�tico anti-her�i do nosso canga�o. Na d�cada de 60, o historiador ingl�s Eric Hobsbawn incluiu Lampi�o entre um grupo de criminosos “sociais”, por�m se baseou mais nas lendas do que nos fatos, como ele pr�prio admitiu. Para Alberto Passos Guimar�es, foi um fen�meno do banditismo das “classes perigosas”.  O canga�o serviu de inspira��o para obras como “Grande sert�o: Veredas”, de Guimar�es Rosa; o “Auto da Compadecida”, de Ariano Suassuna; e “O drag�o da maldade contra o santo guerreiro”, de Glauber Rocha. Produto da mis�ria, das injusti�as sociais e da viol�ncia nos sert�es nordestinos, Lampi�o foi glamorizado pela cultura popular, assim como o ronin de Kurosawa.

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