
Nunca � simples ou f�cil receber e manter no tratamento a pessoa que nos solicita uma sess�o. � sempre um desafio, um risco, uma janela do novo que se abre para o analista e o paciente, �nico e singular sujeito que traz consigo sua hist�ria, lembran�as afetivas, marcas, cicatrizes.
A palavra carrega tudo isto e mais. � a trajet�ria de uma subjetividade e suas fixa��es, que s�o pequenas amarra��es e tramas narradas de modo a princ�pio desorganizado, um emaranhado de fios embolados e disformes que v�o tomando forma � medida que s�o escutados.
E quando o sujeito se sente escutado, concernido naquilo que o analista escuta do que ele diz, de fato ele fica e se acalma, sente-se acolhido naquilo que jamais foi ou sequer compreendeu sobre si mesmo e agora pode vislumbrar alguma l�gica.
Assim � quando, em associa��o livre, a palavra desliza sem rumo aparente tomando caminhos novos e insuspeitados e algu�m escuta aquilo que �s vezes nem mesmo sabia que sabia ou diria, e que surpreende, porque h� o esquecido, o negado, soterrados sob outras camadas de viv�ncias, mas s�o verdades, sejam muito loucas ou n�o.
Tudo que sente, imagina e diz est� contaminado e tingido com fantasias inconscientes constru�das, numa fic��o, para dar sentido ao vivido, justificar afetos e o que fizemos deles. Para dar uma consist�ncia � realidade que tantas vezes n�o tem sentido nenhum e traz perplexidade.
Quem n�o se surpreende com os fatos que v�m de diversas dire��es nesse tempo de informa��es sob informa��es, not�cias de um mundo vasto em tempo real? Ao mesmo tempo, acenam para a tentativa de retificar erros, olhar para os semelhantes, a devasta��o, ultrapassar preconceitos e, ao mesmo tempo, os opostos com abusos, maldade, crimes, feminic�dios, pol�ticas nefastas.
Se o real � sem sentido e a realidade nos divide e sucumbe com o que sofremos no pr�prio corpo, ele fala, grita, adoece e se deforma traduzindo o n�o dito, as raz�es que se tem para ser o que se �. Em an�lise se decide sobre deixar o sofrimento imagin�rio, comportamentos que prejudicam, sintomas, repeti��es dos quais s� se lamenta, traduzir em palavras � tentar escapar, se curar.
Mas n�o se trata de falar para as paredes, embora elas tenham ouvidos, � preciso dar um endere�amento correto no caminho das palavras, pois � neste caminho tortuoso e muitas vezes longo e dif�cil que se escuta aquilo que provavelmente trar� reden��o, livramento e passagens para outro modo de enfrentar a dor de existir para cada um.
Ent�o receber algu�m � sempre uma aposta, para os dois, analista e paciente, uma aposta sem garantia como quando se entra num jogo. Esperando ganhar, certamente muita coisa ser� perdida pelo caminho, muitos sofrimentos, repeti��es, fracassos, nega��es, relacionamentos doentios e sintom�ticos, tipo os da dupla sadomasoquista, casados para sempre na dor.
Por�m, h� o que ganhar. Pois s� de ficar livre dessa listinha sinistra j� � um imenso ganho. Sem falar nas novidades e inven��es que vir�o quando ficamos livres para desejar. E nem precisa ser grandes coisas, podem ser as pequenas e delicadas, as que somente o desejo pode nos convidar. E quando o desejo � decidido pode ele nos levar!
E seguir os ares do desejo que fazem flutuar no contentamento de uma vida que combina com o sujeito e � simplesmente como ele se sente melhor consigo. N�o que n�o haja barreiras, pois sempre h�, n�o podemos tudo. E at� saber disso nos coloca no lugar certo, nos acalma e orienta para o poss�vel e para a conting�ncia do desejo.